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STJ firma tese acerca da impossibilidade de incidência de juros remuneratórios às mesmas taxas do contrato, na hipótese de repetição de indébito decorrente de contrato de mútuo feneratício celebrado com instituição financeira* -
Gustavo Satin Christino da Silva*

Artigo - Federal - 2017/3637

No dia 13 de junho de 2018, o Superior Tribunal de Justiça julgou, em sede de recurso repetitivo, o Recurso Especial n. 1.552.434/GO em que se debateu a possibilidade de incidência de juros remuneratórios às mesmas taxas do contrato, na hipótese de repetição de indébito decorrente de contrato de mútuo feneratício celebrado com instituição financeira.

A posição do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, relator do caso, caminhou no sentido de entender descabida a repetição de indébito com os mesmos encargos praticados pela instituição financeira, em razão de ter considerado que tais encargos não correspondem ao dano experimentado pela vítima e nem ao lucro auferido pelo ofensor. A decisão foi seguida, por unanimidade, pelos demais ministros da Segunda Seção do STJ, culminando na fixação da seguinte tese:

Tema 968 - Tese aplicável a todo contrato de mútuo feneratício celebrado com instituição financeira mutuante: "Descabimento da repetição do indébito com os mesmos encargos do contrato".

Vale destacar que o assunto era controvertido no Tribunal, sendo possível enumerar quatro posições distintas acerca do tema.

A primeira posição, conforme se verifica no AgRg no Resp 1.359.397/SP, nega a incidência de juros remuneratórios, admitindo somente a incidência de juros de mora e da correção monetária sobre repetições de indébito referentes a esse tipo de contrato.
A segunda posição, por sua vez, admite a incidência de juros remuneratórios à taxa legal de 1% mês, em consonância com o disposto nos artigos 406 e 591 do Código Civil, cumulada com a incidência de juros de mora a partir da citação. Nesse sentido, podemos destacar os seguintes julgados: (i) REsp 1.559.314/MG; e (ii) REsp 447.431/MG.

A terceira posição, conforme o entendimento do Resp 453.464/MG, defende que a repetição de indébito deverá ser calculada com base nos mesmos encargos praticados pela instituição financeira.

Por fim, a quarta posição, amparada no Resp 401.694/MG, sustenta o entendimento de que o parâmetro ideal para eliminar o enriquecimento ilícito por parte da instituição financeira seria a taxa SELIC.

Como se nota, a tese firmada ao invés de se filiar a alguma das posições acima descritas, optou por trilhar caminho distinto, eliminando expressamente a terceira posição que defendia o cálculo do indébito repetido com base nos mesmos encargos praticados pela instituição financeira.

A adoção de tese menos abrangente sobre o tema foi motivada pela preocupação do Tribunal em não limitar a evolução da jurisprudência, ainda tímida, sobre o lucro da intervenção. Em sua análise, o relator encontrou somente um julgado no âmbito do STJ que tratava do assunto.

Nesta toada, importante ressaltar que o lucro da intervenção pode ser definido como "o lucro obtido por aquele que, sem autorização, interfere nos direitos ou bens jurídicos de outra pessoa e que decorre justamente desta intervenção"[1].

Dessa forma, no presente caso, o lucro da intervenção restaria caracterizado em virtude dos bancos praticarem taxas de juros bastante superiores à taxa legal, auferindo vantagem econômica dessa diferença, mesmo que restituíssem o indébito à taxa legal. Por outros termos, as altas taxas praticadas pelos bancos garantiriam o enriquecimento ilícito por parte da instituição financeira, ainda que pagassem o indébito à taxa legal de 1%.

Nesse sentido, o relator considera que o lucro da intervenção não é uma proposta de solução, mas um problema jurídico, pois, embora seja fácil identificar sua ocorrência, torna-se dificultoso encontrar uma solução, pois a eliminação do enriquecimento ilícito implica a restituição integral do indébito, o que, por sua vez, caracterizar-se-ia como medida excessiva, dado que a eficiência operacional do banco também contribui para o sucesso do mútuo.

Além disso, os juros auferidos pelos bancos não se revertem integralmente em lucro, uma vez que parte deles destina-se na cobertura dos custos operacionais e nos riscos da operação de crédito.

Desse modo, o relator conclui pela impossibilidade da restituição do indébito com base nos mesmos encargos legais praticados, posto que não corresponderia ao dano experimentado pela vítima e tampouco ao lucro auferido pelo ofensor.

Seja como for, seguindo a sistemática dos recursos repetitivos, o entendimento supramencionado deverá ser observado pelos demais órgãos do Poder Judiciário.

[1] SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil e enriquecimento sem causa: o lucro da intervenção. São Paulo: Atlas, 2012. p.7

 
Gustavo Satin Christino da Silva é graduado pela Escola de Direito de São Paulo - FGV. Pós graduando em Direito tributário pelo IBDT.