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Créditos da contribuição ao PIS e da COFINS: Interessante posicionamento do CARF - Bruno Fajersztajn e Paulo Coviello Filho

Recentemente foi disponibilizado o acórdão n. 3401-002.857, de 27.1.2015, o qual analisou o conceito de insumo para fins de creditamento da contribuição ao PIS e da COFINS no regime não cumulativo, tema que tem sido objeto de grande controvérsia e de inúmeras decisões.

Essa controvérsia se deve ao fato de a legislação que rege o regime não cumulativo das contribuições ser verdadeiramente caótica, a ponto de desafiar a premissa da doutrina clássica de hermenêutica do legislador racional. Some-se a isto que as Instruções Normativas SRF n. 247/02 e 404/04, a pretexto de interpretarem o conceito de insumos previsto na confusa legislação, deram a ele contornos bastante restritivos, próprios da legislação do IPI, o que obrigou a fiscalização a glosar toda e qualquer tomada de créditos que extrapolasse o conceito restrito das INs. O resultado é uma verdadeira fábrica de contencioso, envolvendo uma grande quantidade de processos e decisões.

É fato também que, atualmente, existe razoável consenso doutrinário e jurisprudencial no sentido de que, para fins de creditamento das contribuições em comento, o conceito de insumo não é aquele previsto nas referidas INs, pois a não cumulatividade em questão é diferente daquela aplicável ao IPI. Da mesma forma, embora com menor grau de consenso, entende-se que a definição de insumo também não se identifica com o conceito de despesa necessária previsto no art. 299 do RIR/99, que é próprio da legislação do IRPJ e excessivamente abrangente. A jurisprudência majoritária tem entendido que o conceito de insumo é próprio da legislação das contribuições ao PIS e COFINS, devendo consistir em algo intermediário entre o conceito de insumos próprio do IPI e o conceito de despesa necessária da legislação do IRPJ. A dificuldade, contudo, é encontrar este meio termo e, principalmente, aplicá-lo na prática.

Neste contexto, de evidente indefinição sobre a aplicação do mencionado conceito, as decisões administrativas e judiciais perdem sensivelmente seu valor como precedentes, na medida em que a análise fica extremamente casuística, e, portanto, individualizada para cada situação.

Independentemente disso, ainda assim algumas decisões sobre o tema são dignas de destaque, justamente pela forma como aplicam o "meio termo" acima descrito. Esse é o caso do acórdão n. 3401-002.857, de 27.1.2015, ora em comento.

O processo no qual foi proferido o acórdão decorre de autos de infração da contribuição ao PIS e da COFINS em virtude da glosa de créditos aproveitadas pelo contribuinte, os quais, na visão do Fisco, não se enquadrariam como insumos. Segundo consta no acórdão, a atividade do contribuinte era a prestação de serviços de transporte.

Foram glosadas despesas com pedágio, seguro de vida, previdência privada, assistência médica e social dos empregados, transporte de empregados, kit de segurança, EPI, contribuição para associação de classe, contribuição sindical patronal, viagens, estadia, alimentação, cursos e treinamentos, segurança industrial/patrimonial, seguro patrimonial, seguro de veículos, escolta, satélite e seguros de carga, IPVA e licenciamento de veículos.

A decisão da 1ª Turma Ordinária da 4ª Câmara da 3ª Seção do CARF admitiu parte dos créditos e negou parcela deles. As despesas com pedágio, seguro de vida, previdência privada, assistência médica e social dos empregados, transporte de empregados, contribuição para associação de classe, contribuição sindical patronal, viagens, estadia, alimentação, IPVA e licenciamento de veículos não foram reconhecidas como passíveis de crédito.

Relativamente às despesas com seguro de vida, previdência privada, assistência médica e social dos empregados, transporte de empregados, contribuição para associação de classe e contribuição sindical patronal, a decisão afirmou que elas possuem relação apenas indireta com a prestação dos serviços, de forma que não se enquadrariam no conceito de insumo da legislação de regência das contribuições.

Com relação às despesas com pedágio, o acórdão não foi muito claro em sua fundamentação para negativa do creditamento. Pelo que se extrai da decisão, a DRJ negou o direito ao crédito sobre essas despesas em razão de que elas seriam arcadas pelo contratante do serviço de transporte, não integrando o preço do frete e, dessa forma, a receita operacional da prestadora, nos termos do art. 2° da Lei n. 10209/01.

Por sua vez, o acórdão em comento afirmou, laconicamente, que os art. 3°, parágrafo 2°, inciso II, das Leis n. 10637/02 e 10833/03 vedam o creditamento sobre a aquisição de bens e serviços não sujeitos ao pagamento da contribuição ao PIS e da COFINS. Ao que parece, a decisão partiu da premissa de que o pedágio não é sujeito à tributação pelas contribuições em foco por quem o recebe. Entretanto, tal premissa é discutível. A uma porque as concessionárias que administram rodovias tributam normalmente as receitas de pedágio recebidas pelos usuários. Outrossim, nas hipóteses de rodovias administradas pelo Poder Público, as receitas recebidas estão sujeitas ao pagamento de PASEP, o que autorizaria, ao menos em tese, a tomada de crédito sobre este item para fins da contribuição ao PIS, eis que o pedágio inegavelmente se encaixa no conceito de insumo da atividade.

No que se refere às despesas com IPVA e licenciamento de veículos, o acórdão consignou apenas que "o conceito de insumos abrange apenas bens e serviços, não podendo enquadrar tais despesas." Tal afirmação também é discutível, na medida em que o conceito de bem, previsto no Código Civil de 2002, é bastante abrangente. Além disso, a interpretação do termo "serviços" constante da legislação não pode ser tão literal, sendo sustentável a tomada de créditos sobre gastos conceituados como insumos, ainda que não decorram de contratos de prestação de serviços tal como regulados pelo Direito Civil.

Foram admitidos, por outro lado, os créditos calculados sobre as despesas com kit de segurança, EPI, cursos e treinamentos, segurança industrial/patrimonial, seguro patrimonial, seguro de veículos, escolta, satélite e seguros de carga.

Especialmente quanto às despesas com kit de segurança e EPI, tem-se que a decisão seguiu entendimento majoritário da jurisprudência administrativa, que tem admitido que esse tipo de despesa é passível de crédito pela sua inerente ligação à atividade das empresas, eis que a segurança dos empregados, além de decorrer de normas cogentes relacionadas, é aspecto intrínseco da produção de mercadorias ou prestação de serviços.

Também foi admitido o crédito calculado sobre as despesas com segurança industrial/patrimonial, seguro patrimonial, seguro de veículos, escolta, satélite e seguros de carga, as quais também são inerentes à prestação de serviços de transporte, e, portanto, enquadrar-se-iam no conceito de insumo.
Um aspecto que julgamos importante da decisão foi justamente a admissibilidade do crédito sobre as despesas com cursos e treinamentos incorridas pela empresa para capacitação de seus empregados, notadamente com o intuito de que estes cumprissem exigências constantes em Resoluções do Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN). Sobre o assunto, confiram-se as palavras do acórdão:

"A atividade exercida pela Recorrente é específica e sujeita-se a diversos controles de órgãos reguladores. Estes órgãos estabelecem diversas exigências às empresas que atuam no ramo sob sua fiscalização, o que incluiu cursos e treinamento a funcionários.

A Recorrente cita como exemplos as Resoluções CONTRAN n. 91/99 (revogada pela Resolução n. 168/04) e 227/07.

A Resolução CONTRAN n. 168/04 estabelece Normas e Procedimentos para a formação de condutores de veículos automotores e elétricos, a realização dos exames, a expedição de documentos de habilitação, os cursos de formação, especializados, de reciclagem e dá outras providências e prevê a necessidade de curso específico para condutores de transporte de cargas perigosas, umas das atividades exercidas pela Recorrente.

Tais cursos e treinamentos específicos, exigidos dos condutores que aturam no transporte de cargas, são apenas alguns daqueles necessários para a realização desta atividade. Sem condutores que tenham tal treinamento, bem como que sejam constantemente submetidos a cursos de reciclagem, a Recorrente não pode realizar sua atividade preponderante.

A Resolução CONTRAN n. 227/07 estabelece requisitos referentes aos sistemas de iluminação e sinalização de veículos. Para a adequação dos veículos a tais normas, os funcionários responsáveis pela manutenção dos veículos da empresa, devem estar cientes destas e possuir o conhecimento técnico que somente pode ser adquirido com cursos específicos, sendo necessária a capacitação destes profissionais." (destaques aqui opostos)

Percebe-se, pois, que a decisão reconheceu a vinculação dos cursos de capacitação dos empregados à atividade de prestação de serviços de transporte pela contribuinte, na medida em que, sem a referida capacitação, a prestação de serviços poderia ficar prejudicada.

Neste contexto, entendemos que a decisão aplicou corretamente o conceito de insumo para fins de creditamento das contribuições em foco no regime da não-cumulatividade.

É importante ressaltar a relevância dada pela decisão às obrigações regulamentares da atividade exercida pela empresa, o que pode ser transportado para outras situações análogas, em que haja despesas estritamente vinculadas ao cumprimento de requisitos previstos por órgãos regulamentadores de determinadas atividades, as quais certamente estão enquadradas no conceito de insumo, diante da evidente vinculação com a atividade exercida, de modo que são passíveis de creditamento, nos moldes dos art. 3°, incisos II, da Lei n. 10637/02 e 10833/03, desde que não esbarrem em nenhuma vedação legal.

Em suma, o acórdão n. 3401-002.857 confirma a jurisprudência majoritária no sentido da ilegalidade das Instruções Normativas SRF n. 247/02 e 404/04 e contém elementos interessantes para a caracterização do conceito de insumos, contribuinte para a identificação do meio termo entre o conceito restritivo da legislação do IPI e o conceito abrangente da legislação do IRPJ.

 
Elaborado por:
Bruno Fajersztajn
Mestrando em Direito Tributário pela USP. Advogado. Colaborador do Guia IRPJ, todo conteúdo do principal guia sobre IRPJ on-line. Baseado na obra original de Ricardo Mariz de Oliveira, esse formato garante maior agilidade nas atualizações e praticidade na pesquisa.

 
Elaborado por:
Paulo Coviello Filho
Advogado. Colaborador do Guia IRPJ, todo conteúdo do principal guia sobre IRPJ on-line. Baseado na obra original de Ricardo Mariz de Oliveira, esse formato garante maior agilidade nas atualizações e praticidade na pesquisa.