Decisoes.com.br - Jurisprudência Administrativa e Judiciária, Decisões de dezenas de Tribunais, STF, STJ, TRF, TIT, Conselhos de Contribuintes, etc.
Usuários
Lembrar usuário
Lembrar senha

Pesquisar em
Doutrina
Boletins
Todas as Áreas
Áreas Específicas
Tribunais e Órgãos abrangidos
Repercussão Geral (STF)
Recursos Repetitivos (STJ)
Súmulas (STF)
Súmulas (STJ)
Matérias Relevantes em Julgamento


Localizar nessa página:   
 

Nova lei mantém CEPOM ativo e transforma tomador dos serviços em "fiscal" da Prefeitura de São Paulo - José Antonio Patrocinio*

Como amplamente divulgado, o Supremo Tribunal Federal declarou que é incompatível com a Constituição Federal a obrigatoriedade de inscrição no Cadastro das Empresas Prestadoras de Outros Municípios, conhecido popularmente pelas siglas "CEPOM" ou "CPOM".

No mesmo julgado, também restou decidido que é inconstitucional impor ao tomador a obrigação de reter o ISSQN na fonte, daquelas empresas não inscritas no referido cadastro.

Como consequência disto, foi fixada a seguinte tese jurídica:

"É incompatível com a Constituição Federal disposição normativa a prever a obrigatoriedade de cadastro, em órgão da Administração municipal, de prestador de serviços não estabelecido no território do Município e imposição ao tomador da retenção do Imposto Sobre Serviços - ISS quando descumprida a obrigação acessória"

A decisão do STF é taxativa e categórica, permitindo-nos extrair dois mandamentos:

a) O Município não pode exigir cadastramento de prestadores de serviços não estabelecidos em seu território;

b) O Município não pode impor ao tomador obrigação de retenção do ISSQN, caso o prestador descumpra a referida obrigação acessória.

Diante desta derradeira e irrecorrível decisão da Suprema Corte, muitos municípios, que haviam "copiado" a ideia, extinguiram imediatamente os seus cadastros, desonerando, assim, prestadores e tomadores do cumprimento destas obrigações.

O Município de Porto Alegre/RS, por exemplo, manifestou-se no seguinte sentido:

"CPOM - 06/05/2021 - Informamos que, em função da decisão do Supremo Tribunal Federal no âmbito do Recurso Extraordinário nº 1167509, com repercussão geral, a Administração Tributária Municipal promoveu o encerramento do Cadastro de Prestadores de Serviços de Outros Municípios - CPOM a partir de 05/05/2021. Dessa forma, a inscrição no CPOM não mais será realizada e a retenção por ausência de inscrição no CPOM não mais deverá ser realizada pelos tomadores de serviços. As alterações na legislação municipal, em especial a revogação do inc. XX do art. 1º da Lei Complementar Municipal nº 306/93, serão providenciadas em breve".

Uma atitude extremamente louvável, pois se as imposições foram declaradas inconstitucionais, mantê-las só acarretaria uma enxurrada de ações judiciais.

Escrevi sobre o assunto em Artigo publicado intitulado "EFEITOS JURÍDICOS E PRÁTICOS DA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO CEPOM", publicado em julho de 2021.

Clique aqui para acessar o artigo.

Muito bem!

Mas será que o Município de São Paulo, mentor intelectual destas obrigações declaradas inconstitucionais, também extinguiu o CEPOM!

A resposta é não!

Não extinguiu e, revelando mais uma vez a sua sanha arrecadatória, engendrou um novo estratagema para burlar a decisão da Suprema Corte.

A inscrição no CEPOM agora passa a ser facultativa e, como consequência disto, o tomador dos serviços terá que atuar como um verdadeiro "fiscal" da Prefeitura!

Ah! E sem remuneração!

As novidades constam da Lei nº 17.719/2021, promulgada em 26 de novembro de 2021, originária do projeto de lei do executivo nº 685/2021 que, pelo volume de alterações na legislação, pode ser considerado um verdadeiro "x-tudo" tributário.

No que importa ao objeto deste nosso estudo, em resumo, as alterações legislativas foram as seguintes:

Em relação ao CEPOM, a inscrição para as empresas de fora de São Paulo, que até então era obrigatória, agora passou a ser opcional. Com isto, em termos práticos, como não houve a extinção, o Cadastro continua plenamente ativo.

Por outro lado, no que tange à regra que impunha ao tomador dos serviços a obrigação de reter o ISSQN na fonte, das empresas não inscritas no CEPOM, houve a revogação do dispositivo legal.

Mas, não pensem que tais atos são benevolentes ou samaritanos!

Longe disto!

Na verdade, após uma análise mais percuciente da lei, notamos que há nela um "jabuti"!

No jargão legislativo e político, "jabuti" é a inserção de um texto na lei, de forma aleatória e circunspecta, com o único propósito de alterar ou distorcer o seu objetivo original.

É foi exatamente isto que a Prefeitura de São Paulo fez!

De forma bastante discreta e sutil, foi inserido na lei, deliberadamente, um dispositivo que institui uma pesadíssima multa para o tomador dos serviços, caso seja comprovado pela autoridade fiscal que ele (tomador) tinha conhecimento de que o prestador simulava estabelecimento fora do Município de São Paulo.

Pasmem! A multa está fixada em 100% (cem por cento) do valor do imposto incidente sobre o serviço prestado, devido ou não ao Município, observada a imposição mínima de R$ 1.870,57 (mil oitocentos e setenta reais e cinquenta e sete centavos), por documento.

Um absurdo!

Com isto, a estratégia do fisco está desvendada!

Manter o CEPOM ativo, para que o tomador saiba se o prestador está ou não inscrito nele. Assim, no caso dos não inscritos - livres da retenção do ISSQN na fonte -, sempre haverá o iminente risco do tomador sofrer uma autuação.

Neste contexto, será que algum tomador terá coragem de parar de reter o ISSQN na fonte?

A cominação legal é tão intimidatória que, para não ser fiador de dívida alheia, certamente muitos tomadores continuarão retendo e recolhendo o ISSQN aos cofres municipais paulistanos.

Trocando em miúdos, mudou a lei, mas o fisco continua obtendo o mesmo resultado prático de antes, ou seja, continua arrecadando.

É o famoso "trocou seis por meia dúzia".

Por fim, é preciso consignar ainda que, do ponto de vista jurídico, essa manobra perpetrada pela Prefeitura Municipal de São Paulo, tal qual o CEPOM, também é inconstitucional, pois configura medida coercitiva e indireta para cobrança de tributo, o que é totalmente vedado em nosso ordenamento jurídico.

José Antônio Patrocínio é Advogado, Consultor Tributário da Thomson Reuters, Professor de ISSQN em Cursos de Pós-graduação e Autor do Livro: "ISS - Teoria, Prática e Jurisprudência - 5ª Edição".