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Receita de venda de imóveis anteriormente utilizados para locação submete-se à aplicação dos percentuais de presunção, e não à tributação aplicável ao ganho de capital - Maria Eugênia Martini Mariz de Oliveira*

Em 11.3.2021, foi publicada no Diário Oficial da União a Solução de Consulta COSIT n. 7, de 4.3.2021, por meio da qual a Receita Federal analisou o tratamento tributário que deve ser conferido às receitas provenientes da alienação de imóveis anteriormente utilizados para locação, por empresa do ramo imobiliário submetida ao lucro presumido.

A Solução de Consulta analisou a situação de empresa que desenvolve atividades de incorporação, locação e venda de imóveis. No curso de suas atividades, a empresa realiza habitualmente a venda de imóveis registrados no ativo não circulante, anteriormente empregados na atividade de locação. Assim, a questão colocada à COSIT referia-se às receitas derivadas dessas vendas - se devem ser submetidas à aplicação dos coeficientes de presunção incidentes sobre a receita bruta auferida ou se, ao contrário, devem ser tributadas como ganho de capital.

Ao analisar o caso, a COSIT entendeu que a receita decorrente da alienação dos referidos imóveis, antes utilizados para locação a terceiros, compõe o resultado operacional e a receita bruta da pessoa jurídica, devendo, portanto, ser submetida aos percentuais de presunção de 8% para o IRPJ e 12% para a CSLL previstos pelos arts. 15 e 20 da Lei n. 9249, de 26.12.1995.

O ponto central do entendimento exposto na Solução de Consulta foi a identificação de que estas receitas decorreriam da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica, de modo que comporiam a receita bruta, tal como definida pelo art. 12 do Decreto-Lei n. 1598, de 26.12.1977 (com a redação dada pela Lei n. 12973, de 13.5.2014).

Desse modo, a COSIT firma entendimento no sentido de que a análise do tratamento tributário a ser conferido às receitas provenientes da alienação de bens do ativo deve passar, necessariamente, pela identificação da relação que estes bens têm com as atividades da pessoa jurídica (e, portanto, se se encaixam no conceito de receita bruta). No caso em tela, considerando-se que a consulente é sociedade que explora o ramo imobiliário, de modo que tanto a venda quanto a locação de imóveis fazem parte de seu objeto social, a Solução de Consulta conclui que as receitas diretamente decorrentes dessas atividades, bem como o lucro, devem ser considerados como receita bruta e lucro operacional.

Quanto a esse ponto, a Solução de Consulta também destaca que a forma de registro dos ativos na contabilidade não tem o condão de determinar, por si só, a incidência tributária, de modo que a simples reclassificação contábil de um ativo do não circulante para o circulante antes da venda, ou ainda a contabilização do bem alugado como propriedade para investimento, não é suficiente para que a receita proveniente desta alienação deixe de ser considerada como operacional. O cerne é verificar se a venda do bem é produto do objeto principal da pessoa jurídica, nos termos do art. 12 do Decreto-lei n. 1598.

Embora a Solução de Consulta ateste a irrelevância da classificação contábil na definição da incidência tributária, ela emprega conceitos contábeis e Pronunciamentos Técnicos do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) para fundamentar sua análise acerca da definição da relação dos ativos classificados nos diferentes subgrupos do ativo não circulante com o objeto da pessoa jurídica.

É nesse sentido que, com base nos Pronunciamentos Técnicos CPC n. 27 e CPC n. 28 e tendo em vista que, no caso em análise, a consulente tinha como atividade principal a venda e o aluguel de imóveis, a Solução de Consulta coloca que aqueles imóveis mantidos para aluguel e posterior venda deveriam ser classificados, dentro do ativo não circulante, no subgrupo de investimentos, sendo posteriormente transferidos para o ativo circulante quando estiverem disponíveis para a venda.

Note-se, portanto, que embora a Solução de Consulta afirme que a classificação contábil não deve influenciar o tratamento tributário a ser conferido, a COSIT se apoia nos próprios conceitos contábeis para esclarecer a classificação dos diferentes tipos de ativo (que terão tratamento tributário distinto no caso de alienação), correlacionando-a às atividades da pessoa jurídica. Mas o fato de a manifestação fazendária fazer remissão aos procedimentos contábeis não exerce qualquer influência decisiva na conclusão.

Em conclusão, no que tange ao tratamento tributário, a alienação de ativos não circulantes classificados como investimentos, imobilizado ou intangível deve se submeter à apuração do ganho de capital. Não obstante, nos casos em que tal alienação represente objeto ou atividade principal da pessoa jurídica optante pelo regime de apuração do lucro presumido, o resultado da venda integrará a receita bruta sujeita aos coeficientes de presunção.

Daí que a Solução de Consulta coloca que o requisito fundamental para a análise do tratamento tributário aplicável é a determinação da relação do imóvel alienado com as atividades da pessoa jurídica, de modo que eventual venda de imóvel anteriormente utilizado para locação, classificado no ativo imobilizado, por pessoa jurídica que tenha como objeto a locação e alienação de imóveis, deve ser tratada como receita operacional e, portanto, submetida aos percentuais de presunção (como ocorre no caso da consulente).

Nesse sentido, um ponto essencial verificado pela COSIT no caso em análise foi o fato de que a empresa consulente desenvolvia habitualmente as atividades de locação e posterior venda dos imóveis, de modo que estas efetivamente integravam seu objeto social. Por outro lado, importante pontuar que, caso a venda de imóveis fosse esporádica, não habitual, e, portanto, não fizesse parte da atividade principal da empresa, poder-se-ia supor que a conclusão da COSIT teria sido em sentido diverso.

Importante ressaltar que, em que pese o acertado posicionamento da Receita Federal no que tange à inclusão das receitas decorrentes da alienação de imóveis anteriormente utilizados para locação na receita bruta da pessoa jurídica que exerce atividade imobiliária (e consequente aplicação dos percentuais de presunção), o entendimento da Solução de Consulta n. 7/2021 não representa inovação ou mudança de posicionamento por parte da RFB. Pelo contrário, o posicionamento adotado na referida Solução de Consulta representa simplesmente um esclarecimento quanto ao tratamento tributário a ser conferido a situação não abordada anteriormente pela RFB (nesse sentido, tem-se que a Solução de Consulta COSIT n. 251, de 12.12.2018 tratava de situação fática diversa daquela ora em análise [1]), posicionamento este que se encontra em linha com atos fazendários anteriores a respeito da classificação e reclassificação contábil de ativos, bem como com extensa jurisprudência administrativa a respeito do tema (a título de exemplo, os acórdãos do CARF n. 1402-003.859, de 16.4.2020, n. 1402-002.874, de 19.2.2018, e 1302-002.327, de 27.7.2017).

Finalmente, a Solução de Consulta também trata da tributação pelo PIS e pela COFINS das receitas em análise, adotando entendimento no sentido de que a receita decorrente da alienação de imóveis próprios pela pessoa jurídica que atua no ramo imobiliário deve ser incluída na base de cálculo das referidas contribuições. Isso porque, segundo a COSIT, o art. 3º, caput, da Lei n. 9718, de 27.11.1998, determina que o faturamento, base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS, compreende a receita bruta de que trata o art. 12 do Decreto-Lei n. 1598/1977.

Apesar do posicionamento acertado da Solução de Consulta quanto à submissão das referidas receitas aos coeficientes de presunção para fins de apuração do lucro presumido, merece crítica o entendimento adotado quanto à tributação pelo PIS e pela COFINS. Isso porque, em sua análise, a Receita Federal acabou por desconsiderar as disposições do inciso IV, do parágrafo 2º, do supracitado art. 3º, segundo as quais excluem-se da receita bruta, para fins de determinação da base de cálculo das referidas contribuições, as receitas decorrentes da venda de bens do ativo não circulante, classificados como investimento, imobilizado ou intangível.

Interessante notar que a Instrução Normativa RFB n. 1700, de 14.3.2017, ao tratar da base de cálculo do PIS e da COFINS no regime de apuração não cumulativo, em seu art. 279, expressamente determina que as receitas decorrentes da venda de bens do ativo não circulante classificado como investimento, imobilizado ou intangível não integram a base de cálculo das referidas contribuições, mesmo que reclassificados para o ativo circulante com intenção de venda. Ainda que, no caso em análise pela Solução de Consulta, a consulente recolha o PIS e COFINS no regime de apuração cumulativo, não há motivos para não estender a aplicação das disposições da IN RFB n. 1700 a situações dessa natureza; afinal, se tais receitas são isentas na apuração não cumulativa, também o são na apuração cumulativa, já que em ambos os regimes de incidência das contribuições sociais há norma de isenção das receitas oriundas de venda de bens classificados no ativo não circulante.

 
*Maria Eugênia Martini Mariz de Oliveira

 
[1] Pontua-se que, na Solução de Consulta n. 251/2018, a COSIT analisou o tratamento tributário a ser conferido à venda de imóvel que havia ingressado no patrimônio da empresa consulente mediante subscrição do capital social. Assim, naquela ocasião, a COSIT entendeu que eventual alienação deste imóvel estaria fora do escopo da atividade de comercialização imobiliária praticada pela empresa, de modo que as receitas decorrentes desta venda deveriam ser submetidas à tributação aplicável ao ganho de capital.