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Terceira Turma do STJ entende que a intimação do devedor para pagamento de valor reconhecido judicialmente não tem conteúdo decisório e é irrecorrível - Henrique Coutinho de Souza - Letícia Azevedo Andare*

Em sessão realizada em 9 de março de 2021, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça ("STJ"), ao julgar recurso especial ("RESP") interposto nos autos de agravo de instrumento, firmou o entendimento de que o despacho que intima o executado para pagamento de valor reconhecido judicialmente não tem conteúdo decisório e, por isso, é irrecorrível.

O aludido recurso foi interposto em face de despacho proferido pela 4ª Vara Cível da Justiça Estadual de Juiz de Fora - MG nos autos de cumprimento de sentença, que determinou a intimação do executado para restituir os valores reconhecidos em ação de repetição de indébito, no prazo de 15 dias, sob pena de multa e fixação de honorários advocatícios.

Em síntese, o devedor buscou, por meio do recurso especial n. 1.837.211/MG, o reconhecimento da recorribilidade do referido despacho, sob o fundamento de que se trata de decisão interlocutória, sujeita ao disposto no artigo 1.015, parágrafo único1, do Novo Código de Processo Civil ("NCPC").

Em suma, pretendeu-se o reconhecimento de que, no curso do processo executivo, as decisões interlocutórias - como aquelas que determinam o pagamento da dívida - são passíveis de serem atacadas por Agravo de Instrumento, com base inclusive no rol taxativo do artigo 1015 do CPC.

Ao analisar o mérito da questão, a Terceira Turma do STJ destacou, inicialmente, que via de regra as decisões interlocutórias devem ser impugnadas como preliminar de apelação, a teor do artigo 1.009, parágrafo 1º, do CPC, ressalvadas as decisões elencadas no rol taxativo do artigo 1015 do códex processual.

Contudo, como nos processos executivos não são proferidas novas sentenças de mérito, a permitir a discussão em sede de preliminar de recurso de apelação, a Turma julgadora concluir que de fato toda e qualquer decisão interlocutória proferida em sede de cumprimento de sentença é impugnável por agravo de instrumento.

Como reforço argumentativo, foi invocado que, nos termos do entendimento consolidado pela Corte Especial no julgamento do RESP n. 1.696.396/MT, julgado sob a sistemática de recursos repetitivos, segundo "o qual o rol do art. 1.015 do NCPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação".

No entanto, a conclusão exarada pela Turma para negar provimento ao recurso é de que a intimação do devedor para pagamento se afigura como despacho de mero expediente, pois é consectário legal da provocação do credor para a satisfação do seu crédito, motivo pelo qual é irrecorrível. Vale transcrever a ementa do julgado:

"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. INTIMAÇÃO DO EXECUTADO PARA PAGAMENTO, SOB PENA DE MULTA E FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS. DESPACHO DE MERO EXPEDIENTE. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESCABIMENTO. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.
1. Aplicabilidade do novo Código de Processo Civil, devendo ser exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma nele prevista, nos termos do Enunciado Administrativo nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.
2. As decisões proferidas em liquidação ou cumprimento de sentença, execução e inventário, são impugnáveis por agravo de instrumento (art. 1.015, parágrafo único, do NCPC).
3. Com o advento do Novo Código de Processo Civil, o início da fase de cumprimento de sentença para pagamento de quantia certa passou a depender de provocação do credor. Assim, a intimação do devedor para pagamento é consectário legal do requerimento, e, portanto, irrecorrível, por se tratar de mero despacho de expediente, pois o juiz simplesmente cumpre o procedimento determinado pelo Código de Processo Civil (art. 523 do NCPC), impulsionando o processo.
4. Recurso especial a que se nega provimento."
(REsp 1837211/MG, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/03/2021, DJe 11/03/2021, g.n.)

A ratio desse entendimento é que, nos termos dos artigos 513 e 523, do NCPC, o cumprimento de sentença deve ser proposto pelo credor, sendo o devedor apenas intimado para pagamento do valor devido em decorrência da mera disposição da lei. Confira-se o teor desses dispositivos:

"Art. 513. O cumprimento da sentença será feito segundo as regras deste Título, observando-se, no que couber e conforme a natureza da obrigação, o disposto no Livro II da Parte Especial deste Código.

§ 1º O cumprimento da sentença que reconhece o dever de pagar quantia, provisório ou definitivo, far-se-á a requerimento do exequente."

"Art. 523. No caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver.

§ 1º Não ocorrendo pagamento voluntário no prazo do caput, o débito será acrescido de multa de dez por cento e, também, de honorários de advogado de dez por cento."

Nesse sentido, o posicionamento da Terceira Turma do STJ decorre da interpretação da previsão infraconstitucional ora transcrita.

Esse entendimento, todavia, era distinto à luz do Código de Processo Civil de 1973 ("CPC/73"), quando o cumprimento de sentença se dava de ofício pelo Juiz da causa. Assim, à época em que vigente a legislação processual revogada, sem que houvesse a manifestação do credor, o Juiz intimava o devedor para pagamento, sob pena de imposição de multa, nos termos do artigo 475-J2, do CPC/73.

Daí por que, na vigência do CPC/73, o STJ entendia pelo cabimento de agravo de instrumento contra a decisão que intimava o devedor para pagamento, uma vez que essa decisão era proferida de ofício logo após o trânsito em julgado da ação, sem que houvesse qualquer requerimento do credor para execução do valor reconhecido judicialmente. Sendo assim, tal decisão tinha evidente potencialidade para causar prejuízos ao devedor, possuindo, portanto, conteúdo decisório passível de impugnação por meio de agravo de instrumento.

Esse entendimento foi alterado com o advento do Novo Código de Processo Civil, que passou a prever a necessidade de requerimento expresso do credor para o início do cumprimento de sentença.

Sendo assim, segundo o posicionamento manifestado pela Terceira Turma do STJ, a intimação do devedor para pagamento de quantia certa no cenário do Novo Código de Processo Civil decorre da mera disposição legal, não tendo qualquer conteúdo decisório, sendo um ato judicial com natureza de despacho e, portanto, irrecorrível, conforme prevê o artigo 1.0013, do NCPC.

O julgamento se deu de forma unânime, tendo os Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio e Nancy Andrighi acompanhado o voto do Ministro Relator Moura Ribeiro.

 
1Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: (...)
Parágrafo único. Também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário.
2Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.
3Art. 1.001. Dos despachos não cabe recurso.

 
*Henrique Coutinho de Souza - Letícia Azevedo Andare