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A abrupta redução do REINTEGRA e a possibilidade de sua discussão em Juízo - Claudia Vit de Carvalho - Maicon Galafassi


Após ter reinstituído em prol dos exportadores, à alíquota de 3 (três por cento), o benefício fiscal do chamado REINTEGRA, com vistas a ressarci-los [1], parcial ou totalmente, do resíduo tributário incidente ao longo da cadeia produtiva anteriormente à venda ao exterior e a viabilizar a competitividade do produto nacional no exterior (tudo mediante a edição da Medida Provisória n. 651, de 7.9.2014 [2], posteriormente convertida na Lei n. 13043, de 13.11.2014, do Decreto n. 8304, de 12.9.2014, e da Portaria MF n. 428, de 30.9.2014), em questão de poucos meses do início da vigência desse regime jurídico, o Governo, valendo-se dos Decretos 8415, de 27.2.2015 [3] e n. 8543, de 22.10.2015 [4] e de pretensa autorização contida no artigo 22 da mencionada Lei n. 13043, repentinamente, reduziu sucessiva e drasticamente o percentual em questão, ainda que de forma temporária, de modo que a partir a partir de dezembro de 2015 até o final de 2016, por exemplo, ele vigerá à alíquota de 0,1% (um décimo por cento) sobre a receita auferida com a exportação de bens ao exterior. 

Ocorre que, em que pese a autorização legal contida no artigo 22, da Lei n. 13043 [5], para que o Poder Executivo altere as alíquotas do benefício fiscal em análise, entre 0,1% (um décimo por cento) e 3 % (três por cento), entendemos haver muito boas razões de direito para questionar a imprevista e substancial redução do REINTEGRA que tanto alijou o planejamento das atividades dos exportadores no Brasil.

Com efeito, ao reinstituir o REINTEGRA mediante a edição da Medida Provisória n. 651, em meados de setembro de 2014, o Governo assim agiu, conforme justificado em vinculante exposição de motivos, com vistas a fomentar a exportação, compensando-se o contribuinte exportador com crédito relativo a parte dos tributos incidentes nas etapas anteriores à exportação, de modo a permitir maior competitividade de preços no mercado externo.

Dessa forma, ao recriar a vigência do REINTEGRA em setembro de 2014, à alíquota de 3% (três por cento), estabelecida no Decreto n. 8304, de 12.9.2014 e na Portaria MF n. 428, de 30.9.2014, alíquota esta reputada adequada à Administração Pública para permitir o cumprimento da finalidade da Lei n. 13043, e das disposições constitucionais que lhe respaldam, no sentido de imunidades voltadas a não exportar tributos, vinculou-se o Governo a manter tal percentual minimamente estável ao menos até que o resíduo tributário em questão seja também alterado, fato inocorrente na espécie, tanto que as exposições de motivos dos próprios Decretos redutores do benefício se encontram fundadas unicamente no deficit de caixa do Tesouro, na crise econômica deflagrada no país.

Não obstante, em manifesta contrariedade à segurança jurídica, à lealdade e à boa-fé da Administração Pública, à própria legalidade e demais princípios constitucionais - inclusive o que impõe que determinado planejamento realizado pela Administração seja a ela cogente e ao setor privado indicativo - o Governo, na condição de agente normativo da economia, reduziu de forma substancial o percentual em foco temporariamente para o patamar de 0,1%, passados menos de cinco meses do estabelecimento do regime jurídico acima mencionado, sem que tenha havido qualquer alteração no cenário econômico ou tributário em que inseridos os exportadores, ou seja, sem qualquer motivação que em linha com a Constituição Federal e a finalidade da Lei instituidora do REINTEGRA justificasse a mudança de caminho no sentido da proteção da exportação e atribuição de eficácia máxima à imunidade do resultado da venda ao exterior.

Na verdade, em atendimento aos princípios que regem as relações entre Administração Pública e administrados, as sucessivas reduções em questão - que abalaram sobremaneira os exportadores, também afetados pela crise econômica, e que confiaram na estabilidade da legislação e do planejamento do Estado em relação a "subvencionar" de certa forma as exportações - só poderiam ter tido uma motivação: a de que o resíduo tributário na exportação tivesse sofrido diminuição em virtude de redução da carga tributária nas etapas anteriores à venda ao exterior.

Realmente, parece não ser legítimo em um Estado Democrático de Direito que a justificativa da praticamente extinção temporária do benefício seja a existência de crise econômico financeira já deflagrada no país à época da recriação do REINTEGRA, em setembro de 2014, eis que não guardará, como de fato não guarda, pertinência lógica com a causa do benefício, tal como estampado nos próprios dispositivos da Lei n. 13043 atinentes a tal regime jurídico e respectiva exposição de motivos. Isso porque é necessário que a redução no benefício se amolde aos parâmetros fixados em lei para o exercício da delegação de competência que não pode ser empregada pelo Poder Executivo ao bel prazer de outras questões econômicas, ainda que relevantes, mas não eleitas pela Lei n. 13043 para tanto.

Daí porque as empresas prejudicadas pelos indigitados Decretos têm ingressado em Juízo para, discutindo a legitimidade da alteração do coeficiente de 3% (três por cento), assegurar a sua fruição até dezembro de 2018 ou até que a carga tributária na cadeia produtiva dos exportadores seja de alguma forma reduzida.

Sem prejuízo, amparados no julgamento levado a cabo pelo STF no bojo do RE 564.225, consoante o qual "promovido aumento indireto do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS por meio da revogação de benefício fiscal, surge o dever de observância ao princípio da anterioridade, geral e nonagesimal, constante das alíneas b e c do inciso III do artigo 150, da Carta", algumas empresas igualmente estão pleiteando a observância do princípio da anterioridade no caso, de tal arte que a aplicação das reduções, por implicar aumento indireto da carga tributária, deva, ao menos, observar o princípio da anterioridade ou da anterioridade nonagesimal.

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[1] Esse benefício fiscal pode ser solicitado em espécie ou, ainda, compensado com débitos próprios, vencidos ou vincendos, relativos a tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.

[2] O REINTEGRA foi originalmente criado pela Lei n. 12.546/11, fruto da conversão da Medida Provisória n. 540/11. Era previsto como termo final para fruição deste incentivo fiscal o dia 31.12.2012, posteriormente prorrogado para 31.12.2013 por meio da Lei n. 12844, de 19.7.2013.

[3] "Art. 2º A pessoa jurídica que exporte os bens de que trata o art. 5º poderá apurar crédito, mediante a aplicação do percentual de 3% (três por cento), sobre a receita auferida com a exportação desses bens para o exterior. (...)

Parágrafo 7º O percentual de que trata o caput será de:
I - 1% (um por cento), entre 1º de março de 2015 e 31 de dezembro de 2016;
II - 2% (dois por cento), entre 1º de janeiro de 2017 e 31 de dezembro de 2017; e
III - 3% (três por cento), entre 1º de janeiro de 2018 e 31 de dezembro de 2018.
Parágrafo 8º Ato do Poder Executivo poderá rever as alíquotas de que trata o § 7º, observada a evolução macroeconômica do país."

[4] "Art. 1º O Decreto nº 8.415, de 27 de fevereiro de 2015, passa a vigorar com as seguintes alterações:
"Art. 2º  .........................................................................
§ 7º  ................................................................................
I - 1% (um por cento), entre 1º de março de 2015 e 30 de novembro de 2015;
II - 0,1% (um décimo por cento), entre 1º de dezembro de 2015 e 31 de dezembro de 2016;
III - 2% (dois por cento), entre 1º de janeiro de 2017 e 31 de dezembro de 2017; e
IV - 3% (três por cento), entre 1º de janeiro de 2018 e 31 de dezembro de 2018.
...................................................................................." (NR)

[5] "Art. 22.  No âmbito do Reintegra, a pessoa jurídica que exporte os bens de que trata o art. 23 poderá apurar crédito, mediante a aplicação de percentual estabelecido pelo Poder Executivo, sobre a receita auferida com a exportação desses bens para o exterior.
Parágrafo 1º O percentual referido no caput poderá variar entre 0,1% (um décimo por cento) e 3% (três por cento), admitindo-se diferenciação por bem".
Parágrafo 2º Excepcionalmente, poderá ser acrescido em até 2 (dois) pontos percentuais o percentual a que se refere o parágrafo 1º, em caso de exportação de bens em cuja cadeia de produção se verifique a ocorrência de resíduo tributário que justifique a devolução adicional de que trata este parágrafo, comprovado por estudo ou levantamento realizado conforme critérios e parâmetros definidos em regulamento. (...)"


 
Elaborado por:

Claudia Vit de Carvalho

Advogada. Graduada em Ciências Jurídicas e Sociais pela PUC-SP. Professora do curso de Pós-Graduação em Direito Tributário do Instituto Brasileiro de Direito Tributário - IBDT. Associada ao Instituto Brasileiro de Direito Tributário - IBDT.

E-mail: crv@marizsiqueira.com.br


Maicon Galafassi

 Graduado em Direito pela USP/SP. Especialista em Direito Tributário pelo IBDT. Advogado em São Paulo. Colaborador do Guia IRPJ www.guiadoimpostoderenda.com.br, todo conteúdo do principal guia sobre IRPJ on-line. Baseado na obra original de Ricardo Mariz de Oliveira, esse formato garante maior agilidade nas atualizações e praticidade na pesquisa.

E-mail: mg@marizsiqueira.com.br