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Terceira Turma do STJ reconhece o cabimento da técnica do julgamento ampliado para embargos de declaração com efeitos infringentes - Natália Molina*

Em recente julgamento do Recurso Especial (\"RESP\") nº 1.833.497/TO, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (\"STJ\") concluiu, por maioria de votos, pelo cabimento da técnica de julgamento ampliado para julgamento de embargos de declaração com efeitos infringentes, conforme a ementa:

\"RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E ESTÉTICO. AUSÊNCIA DE INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA SEGUNDA INSTÂNCIA. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. NULIDADE NÃO CARACTERIZADA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. TÉCNICA DE JULGAMENTO AMPLIADO. APELAÇÃO PROVIDA POR UNANIMIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS POR MAIORIA. VOTO VENCIDO QUE ALTERA O RESULTADO INICIAL DA APELAÇÃO PARA NEGAR-LHE PROVIMENTO. NECESSIDADE DE FORMAÇÃO DA MAIORIA QUALIFICADA. EFEITO INTEGRATIVO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO. (...)

4. A técnica de julgamento ampliado possui a finalidade de formação de uma maioria qualificada, pressupondo, na apelação, tão somente o julgamento não unânime e a aptidão do voto vencido de alterar a conclusão inicial.

5. O procedimento do art. 942 do CPC/2015 aplica-se nos embargos de declaração opostos ao acórdão de apelação quando o voto vencido nascido apenas nos embargos for suficiente a alterar o resultado primitivo da apelação, independentemente do desfecho não unânime dos declaratórios (se rejeitados ou se acolhidos, com ou sem efeito modificativo), em razão do efeito integrativo deste recurso. 6. Recurso especial parcialmente provido.\" (STJ, RESP n. 1833497/TO, Terceira Turma, DJ 25.08.2020)

No caso específico, o Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins (\"TJTO\") rejeitou embargos de declaração opostos por uma das partes em face do acórdão prolatado pelo colegiado que deu provimento à apelação para reformar a sentença proferida. Na ocasião, um dos julgadores apresentou voto vista divergente, no sentido de acolher os embargos de declaração, com efeitos infringentes, para negar provimento ao aludido recurso.

A parte vencida opôs novos embargos de declaração requerendo o prosseguimento do julgamento com ampliação do colegiado, porém tais embargos foram rejeitados sob entendimento de que essa técnica de julgamento não seria cabível, o que impulsionou a interposição do Recurso Especial que recebeu o nº 1.833.497/TO perante o STJ.

Nas razões do apelo especial, a parte sustentou, dentre outras ofensas à legislação infraconstitucional, a violação aos artigos 941, parágrafo 3º, e 942 do Código de Processo Civil (\"CPC\"), pelo Tribunal de origem, haja vista a necessidade de observância à técnica de julgamento ampliado, em decorrência do julgamento não unânime da apelação. Isso porque, embora o voto vencido tenha sido proferido em sede de embargos de declaração, o seu acolhimento ensejaria a complementação do acórdão anterior, devido ao seu efeito integrativo.

Para introduzir o tema, a Terceira Turma do STJ afirmou, no acórdão prolatado, que uma das principais inovações do Código de Processo Civil (\"CPC\") de 2015 foi a revogação dos embargos infringentes e a sua substituição pela técnica do julgamento ampliado.

Os embargos infringentes eram previstos no artigo 530 do CPC/1973, e cabíveis contra acórdãos que (i) em grau de apelação, reformassem sentenças de mérito por maioria de votos, ou (ii) julgassem procedentes ações rescisórias, conforme abaixo:

\"Art. 530. Cabem embargos infringentes quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, a sentença de mérito, ou houver julgado procedente ação rescisória. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto da divergência.\"

A técnica do julgamento ampliado, por sua vez, encontra-se prevista no artigo 942 do CPC/2015, que prevê que, quando o resultado do julgamento da apelação for não unânime, o mesmo terá prosseguimento em sessão designada com a presença de outros julgadores, que serão convocados em número suficiente - a depender do Tribunal -, para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial. Vide o teor do dispositivo:

\"Art. 942. Quando o resultado da apelação for não unânime, o julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com a presença de outros julgadores, que serão convocados nos termos previamente definidos no regimento interno, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores.\"

A nova técnica foi instituída com o propósito de aperfeiçoar a prestação jurisdicional, com a ampliação das discussões controvertidas que forem decididas de forma não unânime nos tribunais pátrios.

Relevante diferença entre os embargos infringentes e o julgamento ampliado é que a nova técnica demanda unicamente a ocorrência de julgamento não unânime, independentemente de a decisão impugnada ter sido mantida ou reformada.

Além disso, o julgamento ampliado em questão não ostenta uma natureza recursal, isto é, independe da iniciativa ou pedido de qualquer das partes, devendo ser adotada de ofício pelos tribunais, sempre que verificada a divergência em seus julgamentos de apelação.

Sob essa ótica, inclusive, a ampliação do quórum deve ocorrer antes do término do julgamento, ou seja, antes de existir uma decisão recorrível. Isso significa que, após o cômputo dos votos, e, havendo divergência, o julgamento da apelação será retomado com a convocação dos novos julgadores \"em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores\".

Nessa ocasião, portanto, os votos dos componentes da sessão poderão ser modificados, pois não terá havido a proclamação do resultado e, de acordo com os artigos 941, parágrafo 1º, e 942, parágrafo 2º, do CPC/2015, \"o voto poderá ser alterado até o momento da proclamação do resultado pelo presidente, salvo aquele já proferido por juiz afastado ou substituído\".

Vale dizer, ainda, que o artigo 942, parágrafo 3º, do Código processual vigente prevê a aplicação da técnica do julgamento ampliado aos julgamentos não unânimes proferidos: (i) em ações rescisórias, quando o resultado for a rescisão da sentença; ou (ii) em agravos de instrumento quando houver reforma de decisão parcial de mérito.

Por outro lado, são afastados dessa técnica, consoante o parágrafo 4º do mesmo dispositivo, os incidentes de assunção de competência e os de resolução de demandas repetitivas, as remessas necessárias e os julgamentos não unânimes proferidos por órgãos plenários ou cortes especiais.

Tais premissas foram todas assentadas no acórdão do RESP nº 1.833.497/TO. Todavia, além de tecer esclarecimentos sobre o instituto, a Terceira Turma do STJ assentou o cabimento da técnica de ampliação do quórum para a hipótese de julgamento de embargos de declaração, não previsto expressamente no artigo 942.

De acordo com os votos proferidos pelos Ministros Marco Aurélio Bellizze e Nancy Andrighi - que, embora divirjam em suas conclusões, são idênticos em suas premissas iniciais -, o princípio da inalterabilidade das decisões judiciais contém duas ressalvas expressas no CPC/2015, conforme o artigo 494: (i) a correção de inexatidões materiais ou erros de cálculo; e (ii) o julgamento de embargos de declaração. Todavia, o efeito modificativo, nesse último caso, é restrito às hipóteses em que a alteração seja decorrente do reconhecimento, pelo julgador, de algum dos vícios que autorizam a sua oposição, quais sejam, obscuridade, contradição, omissão ou erro material).

Nessa linha de raciocínio, o voto proferido pela Ministra Nancy afirmou que \"existe, pois, somente uma hipótese em que, por suas peculiaridades, se pode cogitar da aplicação da técnica do art. 942 no julgamento dos embargos de declaração, que é a de serem os embargos acolhidos, por maioria, com efeitos infringentes\". Quer dizer, além de entender pela necessidade de os embargos de declaração apresentarem efeitos infringentes para haver o julgamento ampliado, a Ministra proclama a necessidade de acolhimento dos embargos de declaração por maioria.

O Ministro Marco Aurélio Bellizze pediu vistas para melhor análise do feito e retornou divergindo da relatora em relação à necessidade de acolhimento dos embargos de declaração por maioria.

No voto condutor do aresto, o Ministro assentou o entendimento de que como o aresto proferido nos embargos de declaração integra o acórdão embargado, é possível concluir pela existência de um julgamento indireto da apelação. Por isso, a técnica prevista no artigo 942 do CPC/2015 deve ser observada \"nos embargos de declaração não unânimes decorrentes de acórdão de apelação, quando a divergência for suficiente à alteração do resultado inicial\".

De acordo com o Ministro, \"o julgamento dos embargos constitui extensão da própria apelação, mostrando-se irrelevante o resultado majoritário dos embargos (se de rejeição ou se de acolhimento, com ou sem efeito modificativo)\".

Neste ponto, o voto elucida que situação distinta se sobressai em embargos de declaração não unânimes contra acórdão de ação rescisória ou de agravo de instrumento, haja vista que \"em tais casos, a aplicação da técnica em debate, por requerer, ainda, que o tribunal tenha, inicialmente, rescindido a sentença ou reformado a decisão interlocutória de mérito, de acordo com o que preconiza o já citado § 3º, pode sim depender do resultado dos embargos, conforme se fizer indispensável ao preenchimento do mencionado requisito legal\".

No caso concreto do RESP nº 1.833.497/TO, o Ministro entendeu que o voto divergente prolatado no julgamento dos embargos de declaração opostos contra acórdão de apelação tinha o condão de alterar o resultado inicial do julgamento colegiado, razão pela qual deve ser aplicada a técnica prevista no artigo 942 do CPC/2015.

O Ministro Marco Aurélio Bellizze foi acompanhado pelos Ministros Paulo de Tarso Sanseverino e Moura Ribeiro, formando maioria na Terceira Turma, no sentido de dar parcial provimento ao recurso especial interposto, para determinar o retorno dos autos à instância originária para dar continuidade ao julgamento dos embargos de declaração com o quórum ampliado. Restaram vencidos o Ministro Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva e a Ministra Ministra Nancy Andrighi.

A aplicação da técnica do colegiado ampliado para o julgamento de embargos de declaração ainda é um tema incipiente na jurisprudência do STJ, que poderá ser enfrentado por outras Turmas da Corte.

*Natália Molina