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Stock Options: novos precedentes favoráveis no âmbito do CARF - Bruno Fajersztajn - Paulo Coviello Filho

Recentemente foram disponibilizados alguns acórdãos do CARF, proferidos pela 1ª Turma Ordinária da 4ª Câmara da 2ª Seção, os quais analisaram a incidência de contribuições previdenciárias sobre planos de stock options firmados por determinadas empresas com seus colaboradores. No total, foram disponibilizados quatro acórdãos, de n. 2401-003.888, 2401-003.889, 2401-003.890 e 2401-003.891, sendo que os três primeiros analisaram uma mesma situação fática (plano de uma mesma empresa), e o último analisou outro plano de stock options, de empresa totalmente desvinculada.

Considerando a importância dos precedentes, abaixo passamos a destacar os principais aspectos das decisões mencionadas.

Acórdãos n. 2401-003.888, 2401-003.889 e 2401-003.890

Da análise do acórdão, percebe-se que o plano de stock options em análise era o "clássico", ou seja, praticado por meio do oferecimento de opções de compra de ações aos colaboradores beneficiados. Não havia preço pela compra da opção, e o preço do exercício, a ser pago pelo beneficiário, era fixado a partir da média dos preços verificados para as ações do concedente nos pregões da Bolsa de Valores de São Paulo, no período de 1 a 3 meses anteriores à data de emissão das opções, facultado ainda um ajuste de 20% para mais ou para menos. Além disso, havia cláusula de indisponibilidade das ações pelos beneficiários, os quais, após exercerem o direito, e adquirirem as ações, eram obrigados a manter 50% das ações adquiridas por 2 anos.

Para fundamentar a acusação fiscal, a fiscalização transcreveu trechos de documentos apresentados pela Companhia no curso da fiscalização, ou ao público em seu sítio eletrônico, tais como notas explicativas de demonstrações financeiras e trechos do formulário apresentado à Securities and Exchange Commission (SEC), que supostamente faziam alusão aos planos de opções de compra de ações ofertados pela empresa como remuneração dos beneficiários (01).

Alegou, ainda, que os planos de opções de compra de ações disponibilizados para empregados não representam riscos aos beneficiários, pois não há desembolso pelo direito de opção, diferentemente do que ocorre nas opções clássicas, negociadas no mercado, de forma que, quando do seu exercício, o beneficiário supostamente já teria conhecimento do preço de mercado da ação, sabendo se o exercício da opção geraria ganho ou perda.

Destacou que a relação principal entre empregador e empregado é o contrato de trabalho, ou seja, a prestação de serviço, da qual decorrem as demais relações existentes, de forma que esse aspecto demonstraria a natureza remuneratória dos planos de stock options. Além disso, frisou que a negociação de suas próprias ações não seria objeto das instituições financeiras (caso da empresa autuada), o que, a seu ver, reforçaria a conclusão de que a outorga de opções de compras de ações não configura operação mercantil.

Quanto ao momento de ocorrência do fato gerador, defendeu que este ocorre quando são implementadas as condições para o exercício, independentemente do efetivo exercício pelos beneficiários. Ou seja, para a fiscalização, o fato gerador seria o final do prazo de carência para o exercício das opções, o qual é comumente chamado de "vesting period". A base de cálculo considerada pela autoridade fiscal foi a diferença do preço de exercício para o preço de mercado no momento em que o direito foi adquirido pelo beneficiário.

Por sua vez, a defesa da empresa alegou, em suma, que o plano tinha natureza mercantil e não salarial, o que restava demonstrado pelos riscos assumidos pelos beneficiários, bem como pela necessidade de dispêndio financeiro para aquisição das ações. Defendeu também que, ainda que tivesse natureza remuneratória, o fato gerador apenas configurar-se-ia quando os trabalhadores desembolsassem os valores para aquisição das ações, não podendo ser mantida a autuação, que considerou o fato gerador quando da aquisição do direito ao exercício, independentemente do efetivo exercício.

O CARF cancelou a autuação em decisão colhida por maioria. O voto condutor destacou que a autorização para elaboração desse tipo de plano estava no art. 168, parágrafo 3º, da Lei n. 6404/76, e que esse contrato é oneroso, porque requer pagamento pelo beneficiário, bem como acarreta risco financeiro ao adquirente, que passa a ficar exposto à variabilidade observada no mercado financeiro.

Quanto à argumentação da fiscalização relativa às manifestações do Banco em suas demonstrações financeiras e relatório na SEC, destacou que o fato de as demonstrações financeiras da empresa utilizarem o termo "remuneração" nos itens que tratam dos planos de opções de compra de ações não torna essa verba tributável, sendo imprescindível analisar as características do plano para que se possa concluir se se trata de operação mercantil ou se houve desvirtuamento do instituto apto a caracterizar o ganho auferido pelo profissional como remuneração tributável.

Afirma que, diante da incontroversa onerosidade do plano (que determinava o pagamento no exercício), a obrigação de manutenção das ações por dois anos após o exercício demonstrava claramente a existência de risco, eis que, ainda que fosse possível saber o preço no momento do exercício, o preço futuro é totalmente desconhecido e imprevisível. Nesse sentido, destaca que "Tal risco foi ratificado a partir da análise realizada pela KPMG, que simulou algumas situações que, embora o trabalhador auferisse ganho no primeiro exercício da opção de compra de ações, passados dois anos, quando poderia exercer o direito em relação à metade das ações adquiridas anteriormente, acabaria realizando prejuízo superior ao ganho inicialmente obtido, considerando a flutuação do valor da ação no mercado no decorrer do período analisado." Sobre o trecho transcrito, cumpre frisar o valor probante do laudo elaborado, inclusive para fins de argumentação, demonstrando, economicamente, os cenários possíveis, que concretizavam o cenário de risco alegado pela empresa.

Em contrariedade ao voto condutor, houve declaração de voto elaborada por uma Conselheira vencida, a qual consignou o entendimento de que esse tipo de contrato tem, conceitualmente, natureza mercantil, mas que cada caso deve ser observado individualmente, para verificar se a natureza mercantil se mantém, ou se os termos do acordo afastam essa característica. No caso em análise, entendeu que não havia risco, pois não há pagamento de "prêmio" no momento da concessão da opção, o que é praxe nesse tipo de contrato (02).

Acórdão n. 2401-003.891

A solução para esse caso é muito interessante, pois se debruçou sobre aspectos formais do lançamento tributário. Em razão do teor da decisão, não serão feitas observações sobre as características do plano. Apenas destaca-se que, da mesma forma do que ocorreu nos processos acima comentados, a fiscalização responsável pela autuação em questão também entendeu que o momento de ocorrência do fato gerador era no implemento das condições para o exercício, independentemente do efetivo exercício pelos beneficiários. Ou seja, aqui também, a fiscalização entendeu que o fato gerador é o final do prazo de carência para o exercício das opções, o qual é comumente chamado de "vesting period".

A decisão favorável ao contribuinte se deu em razão da impossibilidade de se considerar como fato gerador da contribuição o momento em que são implementadas as condições para o exercício, independentemente do efetivo exercício, assim como afirmado pela fiscalização.

O voto condutor da decisão, apesar de reconhecer que as características do plano demonstravam não haver risco aos beneficiários, afastando sua natureza mercantil, declarou ser impossível que o fato gerador ocorra quando há a aquisição do direito, sendo imprescindível que haja o efetivo exercício pelos beneficiários. O voto condutor destacou que admitir o entendimento fiscal seria entender, no limite, que exercendo ou não a opção, o valor da ação seria automaticamente incorporado ao patrimônio do beneficiário, afastando qualquer ato de vontade deste, o que é improcedente.

Cumpre destacar que a Relatora do caso, que proferiu o voto vencedor, foi acompanhada por unanimidade, sendo que quatro conselheiros acompanharam apenas pelas conclusões, relativamente à questão do momento da ocorrência do fato gerador, o que demonstra suposta divergência entre os membros da Turma na questão relativa à natureza mercantil do plano. No mérito, destaque-se, a Relatora entendeu que as características do plano afastavam sua natureza mercantil, o que, repise-se, não será alvo de comentário no presente momento, tendo em vista o foco da decisão.

As decisões em comento são muito importantes no amadurecimento da jurisprudência administrativa sobre o tema, não só quanto à discussão sobre a incidência ou não das contribuições previdenciárias sobre os planos de stock options, mas também quanto a aspectos relacionados com própria formalização do crédito tributário neste tipo de situação (momento da ocorrência do fato gerador, base de cálculo, etc.). Quanto a isso, inclusive, há divergência no próprio âmbito da Receita Federal do Brasil, eis que não há uniformidade das autoridades autuantes quanto à definição do momento do fato gerador e da base de cálculo das contribuições previdenciárias nesse tipo de situação, o que restou evidente no acórdão n. 2401-003.891, acima comentado.

As decisões comentadas evidenciam que a jurisprudência está em franca evolução. Os primeiros acórdãos proferidos, já comentados por nós anteriormente, eram no sentido de que os planos de stock options eram todos remuneratórios. Mas os casos analisados eram, por assim dizer, difíceis, eis que o risco nas operações era de fato muito reduzido. Com a chegada de novos casos ao CARF, a jurisprudência começa a identificar que nem todos os planos são remuneratórios. Em suma, permanece a recomendação de cautela, devendo cada caso ser analisado à luz de suas peculiaridades.

Notas

(01) Sobre o uso deste tipo de informação pelas autoridades fiscais, é importante abrir-se um parênteses, tendo em vista que esse expediente tem sido utilizado frequentemente pelas autoridades fiscais, que se valem de trechos das informações financeiras das empresas para fundamentar suas autuações. Como é sabido, as demonstrações financeiras possuem o intuito de informação ao público, e são elaboradas sob prismas econômico-contábeis, os quais não são aplicáveis ao direito tributário brasileiro. Sendo assim, a utilização deste tipo de informação pelas autoridades fiscais, visando a uma interpretação econômica dos negócios jurídicos, é ilegal, na medida em que o ordenamento jurídico brasileiro em regra não prestigia essa forma de interpretação. A despeito disso, trata-se de expediente cada vez mais comum..

(02) Vale destacar que a questão do pagamento de prêmio no momento da concessão da opção foi profundamente abordada pelo Conselheiro Thiago Taborda Simões, em declaração de voto vencido proferida nos acórdãos n. 2402-004.480 e 2402-004.481, de 20.1.2015, na qual foi feita aproximação do plano de stock options com as opções de ações negociadas normalmente no mercado.

 
Elaborado por:
Bruno Fajersztajn*
Mestrando em Direito Tributário pela USP. Advogado.

Paulo Coviello Filho*
Advogado.