Câmara Superior de Recursos Fiscais decide acerca dos critérios para a incidência de contribuições previdenciárias sobre abonos e gratificações - Mariana Fernandez Angelo Alfonso
Câmara Superior de Recursos Fiscais decide acerca dos critérios para a incidência de contribuições previdenciárias sobre abonos e gratificações.
Em 5.8.2019 foi publicado o acórdão n. 9202007.959, proferido pela 2ª Turma de Julgamento da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF), em 18.6.2019, o qual estabeleceu critérios para caracterizar os abonos e gratificações pagos aos empregados como salário-de-contribuição, conforme dispõe o art. 28, inciso I, da Lei n. 8212, de 24.7.1991 . Confira-se sua ementa:
"ASSUNTO: CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PREVIDENCIÁRIAS
Período de apuração: 01/01/2008 a 31/12/2008
PREVIDENCIÁRIO. ABONOS E GRATIFICAÇÃO. INCIDÊNCIA DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA.
A importância paga, devida ou creditada aos segurados empregados a título de abonos não expressamente desvinculados do salário, por força de lei, integra a base de cálculo das contribuições para todos os fins e efeitos, nos termos do artigo 28, I, da Lei nº 8.212/91, com a redação dada pela Lei nº 9.528/97."
A 2ª Turma da CSRF analisou situação na qual o contribuinte não recolheu contribuição previdenciária sobre as verbas pagas a seus empregados a título de "gratificação melhor empresa do ano de 2008".
No curso do processo, a Turma Julgadora de segunda instância, por meio do acórdão n. 2301003.762, de 15.10.2012, deu provimento ao recurso voluntário quanto a este tema, entendendo que a gratificação em comento teria sido paga de forma eventual, razão pela qual não poderia ser caracterizada como verba remuneratória, restando excluída, portanto, do conceito de salário-de-contribuição.
Diante disso, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional apresentou recurso especial à CSRF na tentativa de reverter o cancelamento do crédito tributário.
Em sessão de julgamento, a CSRF afirmou que a configuração de eventualidade no pagamento da gratificação não seria suficiente para afastar a incidência da contribuição previdenciária, discordando, portanto, da decisão de segunda instância.
Segundo a Turma Julgadora, a falta de habitualidade no pagamento não seria elemento suficiente para excluir o montante pago ao empregado do conceito de salário-de-contribuição, uma vez que o art. 28, parágrafo 9º, alínea "e", item 7 da Lei n. 8212 determina que apenas estão excluídas das verbas remuneratórias as gratificações (i) recebidas eventualmente e (ii) expressamente desvinculadas do salário. Veja-se:
"Art. 28. Entende-se por salário-de-contribuição:
(...)
§ 9º Não integram o salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente:
(...)
e) as importâncias:
(...)
7. recebidas a título de ganhos eventuais e os abonos expressamente desvinculados do salário;"
Interpretando o referido dispositivo legal, o acórdão em comento entendeu que apenas poderiam ser consideradas "desvinculadas do salário" as gratificações pagas em decorrência de Convenção Coletiva, quando constar da convenção, de forma expressa, a referida desvinculação, devidamente amparada na legislação.
Para tanto, a CSRF fundamentou-se em "decisões reiteradas" do Superior Tribunal de Justiça, as quais deram ensejo à edição do Parecer PGFN/CRJ n. 2114/2011, o qual recomendou "a não apresentação de contestação, a não interposição de recursos e a desistência dos já interpostos [pela Fazenda Nacional], desde que inexista outro fundamento relevante, nas ações judiciais que visem obter a declaração de que sobre o abono único, previsto em Convenção Coletiva de Trabalho, desvinculado do salário e pago sem habitualidade, não há incidência de contribuição previdenciária.".
Diante disso, nota-se que a CSRF estabeleceu que para que a gratificação (ou abono) paga aos empregados não se enquadre no salário-de-contribuição deve:
i) estar prevista em Convenção Coletiva;
ii) ser eventual; e
iii) estar expressamente desvinculada do salário, com o devido amparo legal.
No caso analisado a gratificação em questão não estava disposta em Convenção Coletiva, mas em Acordo Coletivo. Tal fato seria suficiente, segundo a Turma Julgadora, para caracterizar o pagamento como sendo salário-de-contribuição, na medida em que "há uma diferença substancial entre um e outro, seja quanto aos sindicatos que participam do pacto, seja quanto à vinculação da empresa".
Não fosse isso o bastante, a CSRF entendeu, ainda, que o Acordo Coletivo que fixou o pagamento da referida gratificação não teria amparado a referida desvinculação na legislação.
Assim, por meio de voto de qualidade, a 2ª Turma da CSRF, ao proferir o acórdão n. 9202-007.959, em 18.6.2019, deu provimento ao recurso especial da Fazenda Nacional, reestabelecendo a cobrança de contribuição previdenciária sobre a verbas pagas a título de "gratificação de melhor empresa do ano de 2008".
Mariana Fernandez Angelo Alfonso é advogada. Bacharel em Direito pela PUC-SP. Pós-graduanda em Direito Tributário pela FGV-SP.