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CARF afasta a incidência de PIS e COFINS sobre o ágio na subscrição de novas ações -
Gustavo Santin*

Artigo - Federal - 2019/3694

Acórdão n. 3402-006.298

Recentemente, a 2ª Turma Ordinária, da 4ª Câmara, da 3ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais ("CARF"), por unanimidade, posicionou-se no sentido de que o ágio na subscrição de ações, registrado na escrituração contábil como crédito em reserva de capital, não constitui receita e, portanto, não está sujeito à incidência da Contribuição ao PIS e da COFINS.

Naquela ocasião, um dos acionistas do contribuinte havia promovido uma subscrição de ações na qual parte do valor foi destinado à conta de Capital Social e o restante, à conta contábil de Reserva para Aumento de Capital, de modo a ser realizada uma típica operação de ágio na subscrição de ações.

As autoridades fiscais, então, autuaram o contribuinte por entenderem que o valor destinado à conta contábil de Reserva para Aumento de Capital configuraria receita e, portanto, seria passível de tributação pelo PIS e pela COFINS na sistemática não cumulativa.

Em seu voto, o referido órgão iniciou sua argumentação explicando que o ágio na subscrição de ações está preconizado no art. 182 da Lei n. 6404, de 15.12.1976 ("Lei das S.A.") e que se refere ao sobrepreço pago pelo adquirente para a aquisição de ações de determinada companhia, geralmente em virtude do potencial que essa possui de gerar resultados positivos futuros, o chamado goodwill e que é contabilizado em conta de reserva de capital. Note-se:

"Art. 182. A conta do capital social discriminará o montante subscrito e, por dedução, a parcela ainda não realizada.

§ 1º Serão classificadas como reservas de capital as contas que registrarem:

a) a contribuição do subscritor de ações que ultrapassar o valor nominal e a parte do preço de emissão das ações sem valor nominal que ultrapassar a importância destinada à formação do capital social, inclusive nos casos de conversão em ações de debêntures ou partes beneficiárias;

b) o produto da alienação de partes beneficiárias e bônus de subscrição;" (destaques do autor)

Em vista disso, por se tratar de valores registrados na qualidade de reserva de capital esses "apresenta[m] características próprias, previamente 'carimbadas' pela Lei das S.A.". Ou seja, os valores registrados em tal rubrica não podem ser aproveitados livremente, mas antes, estão vinculados a propósitos específicos estabelecidos pela Lei das S.A., os quais, "sempre se referem à transação de capital com acionistas e investidores".

Daí por que, no entender das autoridades julgadoras, os valores destinados à Reserva de Capital, assim como aqueles destinados à conta de Capital Social configuram típicas "transações de capital", visto que possuem, em último grau, a mesma função, a saber, o fomento das atividades da companhia e a consequente geração de benefícios futuros para os próprios acionistas na forma de lucro.

Por conta de tais particularidades, os valores destinados à conta de Reserva de Capital acabariam por não se amoldar ao conceito de receita, visto que, à luz do conceito de receita que consta no apêndice A do Pronunciamento de Comitê de Pronunciamento Contábeis n. 47, essa sempre deve "advir das atividades usuais desenvolvidas pela entidade, sobretudo aquelas constantes no seu objeto social (ou dele decorrente)", o que não ocorreria nesse último caso.

Nesse sentido, as autoridades julgadoras argumentaram, com amparo nas lições de Ricardo Mariz de Oliveira, que a principal diferenciação entre as "reservas de capital" e as "receitas" tange à origem dos ingressos econômicos. Isto é, enquanto os valores destinados à conta de reserva de capital sempre decorrem de aportes dos sócios, as receitas, por sua vez, sempre advem da própria atividade empresarial da empresa. Veja-se:

"Coerentemente com o que já foi exposto, mas para melhor elucidação, podemos acrescentar que as transferências patrimoniais distinguem­se das receitas porque, ao contrário destas, que são produtos do esforço do próprio patrimônio ou do seu titular, aquelas são injetadas de fora para dentro do seu patrimônio, para que este passe a contar com novos recursos necessários à produção de suas receitas e, por conseguinte, para frutificar.

(...)

Ora, as injeções de capital visam propiciar meios de produção de frutos, mas não são nem nunca foram frutos e daí a sua nítida distinção em relação às receitas, à renda e ao lucro. Na verdade, passam a integrar a fonte produtora de receitas e lucros, tal como o fertilizante colabora para manter viva a árvore e incrementar a sua capacidade produtiva."

As reservas de capital, portanto, muito embora sejam ingressos econômicos, não são receitas e, assim, não transitam por contas de resultados e nem compõem a base de cálculo do PIS e da COFINS, ainda que a empresa esteja sujeita à sistemática não cumulativa.

Ademais, as autoridades julgadoras entenderam que, no caso concreto, o fato de os valores registrados como reserva de capital estarem destinados, em caráter irrevogável e irretratável, exclusivamente à "aplicação na construção, modernização, reforma, ampliação ou implantação da Companhia e dos seus empreendimentos" também afastariam a caracterização como receita, visto essa ter como pressuposto a posibilidade de utilização irrestrita.

Diante de tais considerações, as autoridades julgadoras decidiram por afastar a exigência fiscal de PIS e COFINS sobre tais valores, entendendo que o ágio na subscrição de ações realizado pelo novo sócio do contribuinte não se trataria de receita, mas sim, de típica transação de capital, visto não somente estar registrado como reserva de capital, como também por ter sua destinação integralmente vinculada.

Cumpre destacar que o referido julgado desponta como importante precedente no âmbito dos tribunais administrativos, não somente por apresentar entendimento acertado quanto ao tema, como também por reforçar a posição anteriormente inaugurada pelo acórdão n. 3402.003.196, de 21.9.2016, no mesmo sentido.

 
Gustavo Santin* é advogado em São Paulo e especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário - IBDT (2018).*