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RE 591.340/SP reconhece a constitucionalidade da trava de 30% para a compensação de prejuízos fiscais do IRPJ e da CSLL.
Túlio Venturini de Souza*

Artigo - Federal - 2019/3693

A questão a ser abordada nestes breves comentários é referente ao julgamento da chamada "trava dos 30%". Conforme será adiante exposto, a mencionada trava consiste em uma limitação à possibilidade de compensação dos prejuízos fiscais das pessoas jurídicas com lucros eventualmente auferidos em momentos posteriores.

Em suma, a questão relativa à consolidação da tese orbita em torno da qualificação da natureza jurídica da trava, isto é, se corresponde a um benefício fiscal ou se é, apenas, uma extensão do conceito constitucional de renda. Passa-se, pois, ao relato do caso.

No dia 27.6.2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, no julgamento do RE 591.340/SP, a constitucionalidade dos arts. 42 e 58 da Lei n. 8981/95 e dos arts. 15 e 16 da Lei n. 9065/95 ("trava dos 30%"). Em síntese, a assim chamada "trava dos 30%" corresponde a um mecanismo que limita, em 30% do lucro líquido ajustado, o valor dos prejuízos passíveis de compensação para fins de apuração do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).

O julgamento - em termos estritamente pragmáticos - apenas repisou a orientação anteriormente esposada pelo STF sobre o mesmo assunto: em março de 2009, ao julgar o RE 344.994/PR, o plenário do tribunal firmou o entendimento de que, em verdade, a suposta trava era um benefício fiscal e, como tal, poderia ser concedido sob as limitações que a lei impôs.

Com base na premissa de que as leis em comento estabelecem benefícios fiscais, tornou-se possível a argumentação de que - por não haver qualquer relação entre a trava e o significado do conceito de "renda" - não haveria necessidade, sequer, de se observar um patamar mínimo para a possibilidade de compensações dos lucros auferidos em determinado ano calendário com prejuízos anteriores.

Evidente, no entanto, que tal posicionamento apresenta alguns pontos sensíveis. Apesar de não ser o objetivo deste comentário o completo esgotamento das discussões que orbitam em torno da questão da "trava dos 30%", alguns aspectos merecem - ao menos - ser apontados, tais como os algumas discussões referentes aos princípios da igualdade, da capacidade contributiva e, destacando-se, dentre todas elas, um possível conflito com o conceito de renda.

Com efeito, muito embora a questão não seja pacífica, há manifestações contundentes na doutrina no sentido de que a limitação à compensação dos prejuízos fiscais com os lucros de períodos subsequentes contraria o conceito de renda ; enquanto que - defendendo a constitucionalidade da medida - há manifestações de igual peso .

A tese firmada no bojo do RE 591.340/SP em nada difere do posicionamento que tinha o tribunal até então: "é constitucional a limitação do direito de compensação de prejuízos fiscais de IRPJ e da base de cálculo negativa da CSLL".

A configuração do plenário no momento da votação se deu da seguinte maneira: os ministros Marco Aurélio, Riccardo Lewandowski e Edson Fachin entenderam pela inconstitucionalidade da trava; ao revés, pugnaram pela constitucionalidade das normas que preveem a trava os ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Gilmar Mendes, Luiz Fux e Dias Toffoli. Não chegaram a votar os ministros Celso de Mello e Cármen Lúcia.

Em síntese, os ministros que entenderam pela inconstitucionalidade da trava sustentaram que a limitação à compensação de prejuízos ofende o conceito de renda, na medida em que haveria o descasamento das noções de despesas e lucro para fins da configuração da renda. Além disso, foram expostas eventuais máculas aos princípios da capacidade contributiva e da igualdade que tal trava traria.

Outro argumento utilizado pela inconstitucionalidade da trava foi o de que - uma vez que o contribuinte seria obrigado a recolher montante que, a priori, não se reportaria à noção de renda - o tributo recolhido assumiria feições jurídicas de empréstimo compulsório, o que seria - por uma questão de fontes - estritamente vedado.

Contrapondo-se ao entendimento pela inconstitucionalidade, a maioria da composição do Pleno - capitaneada, sobretudo, pelas fundamentações do relator Alexandre de Moraes - retomaram a noção de que a trava nada mais é do que uma benesse fiscal e, portanto, tanto poderia existir (em qualquer percentual) como também poderia sequer haver possibilidade de compensação.

Em vista disso, ficou mantido o entendimento de que a trava, por ter a natureza de mero benefício fiscal, é constitucional.

Cabe destacar ainda que, embora tenha sido pleiteado pelos amici curiae, o STF não se manifestou sobre a tese, também defendida pelos contribuintes, no sentido de que ao menos na hipótese de extinção da pessoa jurídica a trava deveria ser afastada. De fato, há decisões proferidas no Judiciário reconhecendo que a trava não se aplica na hipótese de extinção, tendo em vista que, nesse caso, a empresa perde o direito à compensação. A Corte entendeu que não houve contraditório a respeito de tal discussão e que não deveria se manifestar sobre o tema.

Conforme exposto, o plenário do STF - ao reavaliar o antigo posicionamento exarado pela corte constitucional - em nada alterou o entendimento inicialmente firmado, repisando a tese da constitucionalidade da trava. Dessa feita, em que pese a possibilidade de reformar a antiga concepção da Corte Suprema sobre o tema, o STF preferiu manter o entendimento já conhecido.

1 Cf. ÁVILA, Humberto. Conceito de renda e compensação de prejuízos fiscais. São Paulo: Malheiros, 2011.

2 Cf. OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do imposto de renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, pp. 859-879.

 
Túlio Venturini de Souza*