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CSRF reconhece a dedutibilidade de despesas com materiais publicitários e amostras de produtos
Paulo Coviello Filho*
Débora Regina March*

Artigo - Federal - 2018/3657

Foi disponibilizado recentemente o acórdão n. 9101-003.614, de 6.7.2018, por meio do qual a 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) analisou autuações de IRPJ e CSL em que se discutia, dentre outras questões, a dedutibilidade dos dispêndios com materiais publicitários.

Extrai-se do relatório do acórdão que o contribuinte tem como objeto social \"comércio, distribuição, importação e exportação de cosméticos de qualquer forma ou tipo, incluindo perfumarias, produtos de higiene e toucador, que são comercializados exclusivamente por pessoas físicas autônomas, as chamadas revendedoras, que, por sua vez, levam tais produtos aos ditos consumidores finais/usuários\".

A referida decisão analisou a dedutibilidade dos dispêndios aplicados (i) na aquisição de material de campanha de vendas e de propaganda de novos produtos, como folders, panfletos e revistas entregues a revendedoras; e (ii) na aquisição de amostras para comercialização dos produtos.

No julgamento do recurso voluntário, a 1ª Turma Ordinária da 3ª Câmara da 1ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) cancelou a glosa de tais despesas, eis que, em seu entendimento, configuram dispêndios necessários ao desenvolvimento da atividade da pessoa jurídica.

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), por sua vez, interpôs recurso especial, visando à reforma da decisão proferida pela 1ª Turma Ordinária da 3ª Câmara da 1ª Seção do CARF, sob o argumento de que \"de acordo com Parecer Normativo CST nº 15/76 e diante da inexistência de norma especifica à época de sua edição, as despesas com brindes eram dedutíveis se de pequeno valor, e, ainda, se apresentassem índice moderado em relação à receita bruta da empresa. Contudo, posteriormente, foi editada a Lei nº 9.249/1995, que vedou expressamente a dedução de brindes\".

Não obstante, a 1ª Turma da CSRF negou provimento ao apelo especial fazendário, revelando entendimento consoante àquele exarado pela Turma Ordinária, conforme atesta o seguinte excerto extraído do voto condutor:

\"[...] esses recursos foram aplicados na aquisição de material de campanha de vendas e de propaganda de novos produtos, como folders, panfletos e revistas entregues às revendedoras, com informações destinadas, em última instância, ao auferimento de receitas. Ou seja, trata­se de ferramenta de trabalho das revendedoras, já que a recorrida não possui lojas físicas. Logo, não são mercadorias para distribuição ao usuário final.

Quanto às despesas com amostras/motv consumidor, deve-se reconhecer à recorrida a faculdade de imputar tais dispêndios aos resultados tributáveis, deduzindo-os para fins de apuração do IRPJ e a CSLL, pois o peculiar modo de comercialização que adota traz a reboque a necessidade do emprego de amostras, tendo em vista a divulgação dos produtos expostos à venda nos domicílios das pessoas físicas, que os adquirem das vendedoras autônomas.\".

O acórdão em questão restou assim ementado:

\"DESPESAS COM AQUISIÇÃO DE MATERIAL DE CAMPANHA DE VENDAS E PROPAGANDA. São dedutíveis as despesas com a aquisição de material de campanha de vendas e de propaganda de novos produtos, como folders, panfletos e revistas entregues às revendedoras, com informações destinadas, em última instância, ao auferimento de receitas. Tal aspecto ressalta o caráter de necessidade desses dispêndios para a fonte produtora de rendimentos angariar recursos que se incorporam ao próprio patrimônio.

DESPESAS COM AMOSTRAS. EXIGÊNCIA DE CPF NA NOTA FISCAL. DEDUTIBILIDADE. ARTIGO 36, V, RIR/99.
O texto do artigo 366, § 2º, do RIR/99 é incompatível com a interpretação que amplifica o sentido dado pela semântica, de tal forma a permitir que o Fisco imponha ao particular exigência de CPF na nota fiscal, como requisito de dedutibilidade da despesa com amostras.\".

Imprescindível destacar que o posicionamento revelado pela Turma, no sentido afastar a natureza de \"brinde\" dos gastos incorridos pelo contribuinte no caso concreto é notável, merecendo alguns comentários a respeito do tema.

O contribuinte em questão, conforme descrito, atua em ramo de atividades especializado, sendo que sua rede de distribuição consiste exclusivamente em pessoas físicas, as denominadas \"revendedoras\" autônomas. Não há atuação por meio de lojas físicas ou outras pessoas jurídicas.

Conforme comprovado nos autos, os materiais de propaganda e as amostras são essenciais para que as revendedoras autônomas realizem as vendas dos produtos.

Admitir-se o raciocínio construído pela fiscalização implicaria inviabilizar a própria atividade do contribuinte, eis que tais gastos são imprescindíveis à concretização das vendas.

Nesse contexto, a decisão reconheceu que as despesas em questão atendiam os requisitos previstos no art. 299, do Decreto n. 3000, de 26.3.1999, que aprovou o Regulamento do Imposto de Renda de 1999 (RIR/1999). Veja-se a redação do aludido art. 299:

\"Art. 299. São operacionais as despesas não computadas nos custos, necessárias à atividade da empresa e à manutenção da respectiva fonte produtora (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47).

§ 1º São necessárias as despesas pagas ou incorridas para a realização das transações ou operações exigidas pela atividade da empresa (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47, § 1º).

§ 2º As despesas operacionais admitidas são as usuais ou normais no tipo de transações, operações ou atividades da empresa (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47, § 2º).

§ 3º O disposto neste artigo aplica-se também às gratificações pagas aos empregados, seja qual for a designação que tiverem.\". (destaques nossos)

Como se pode verificar, na dicção do art. 299 do RIR/1999, a dedução da despesa para efeito de determinação do lucro real é condicionada à observância dos seguintes requisitos: necessidade, usualidade e normalidade.

Assim, conforme determina o parágrafo 1º do referido dispositivo legal, são despesas necessárias aquelas \"despesas pagas ou incorridas para a realização das transações ou operações exigidas pela atividade da empresa\".

Para ser considerada despesa necessária esta deve estar ligada, de alguma forma, à atividade da sociedade, à manutenção e ao desenvolvimento da fonte produtora, ainda que não seja diretamente relacionada ao objeto social da pessoa jurídica, mas simplesmente se apresente em função da existência da sociedade e, inclusive, do papel social que ela desempenha, jungida que está ao cumprimento de sua função social.

A princípio, toda despesa é passível de dedução, porque atrelada ou vinculada, de um modo geral, à (tentativa ou ao intuito de) obtenção de lucro. No entanto, para que a pessoa jurídica possa efetivamente deduzir a despesa, não pode existir nenhuma vedação ou restrição expressa, na lei, ligada a tal dedutibilidade.

Sobre essa ideia de lucro, pode-se dizer que a regra geral constante do art. 47 da Lei n. 4506, de 30.11.1964, reflete um dado implícito ao conceito de lucro, que é a inversão de recursos (tanto quanto se dá com os custos) do patrimônio da pessoa jurídica na medida necessária à produção do resultado do período-base, a ser tributado.

Em outras palavras, lucro é a diferença entre todos os fatores positivos e negativos que durante o período-base afetaram o patrimônio, terminando em saldo positivo. Deste modo, todos os fatores negativos, e entre eles todas as despesas (inclusive as que possam ser entendidas como perdas), participam da equação que corresponde ao fato gerador e à base de cálculo dos tributos que incidem sobre o acréscimo patrimonial.

Daí ser possível dizer que são necessárias as despesas que contribuem para a obtenção do lucro, isto é, que se relacionem com a atividade empresarial da pessoa jurídica, ou que dela sejam decorrentes, ou que sejam derivadas de riscos inerentes a essa atividade, além daquelas que sejam decorrentes do papel social da empresa ou da sua simples existência.

Por outro lado, será desnecessária a despesa quando envolver ato de liberalidade, no seu sentido objetivo legal, isto é, de ato de favor, estranho ao objeto social, ao papel social ou contrário do previsto no estatuto ou contrato social da sociedade.

Importante registrar que os comentários feitos sobre a interpretação do art. 299 do RIR/1999 são inteiramente aplicáveis ao art. 311 do Decreto n. 9580, de 22.11.2018, que revogou o Decreto n. 3000/1999 e aprovou o Regulamento do Imposto de Renda de 2018 (RIR/2018).

No caso concreto, os folders, panfletos e revistas, que compõem o material de campanha de vendas e de propaganda dos produtos desenvolvidos pelo contribuinte, são entregues às revendedoras, as quais utilizam tais materiais para alcançar o objetivo final, a venda dos produtos.

Sem esses bens, seria inviável a consecução da atividade de venda pelas revendedoras e, por decorrência lógica, o contribuinte não auferiria renda, eis que, conforme esclarecido, a sua rede de distribuição consiste unicamente em pessoas físicas.

Nesse seguir, compreendeu a 1ª Turma que as despesas com amostras também devem ser deduzidas, uma vez que o modo de comercialização empreendido pelo contribuinte implica a divulgação dos produtos expostos à venda, pelas revendedoras, nos domicílios das pessoas físicas.

A decisão proferida pela CSRF é irrepreensível no que tange à necessidade desses dispêndios para a manutenção da fonte produtora, tendo em vista as particularidades intrínsecas à atividade desenvolvida pela contribuinte interessada no processo.

 
Paulo Coviello Filho*
Débora Regina March