Decisoes.com.br - Jurisprudência Administrativa e Judiciária, Decisões de dezenas de Tribunais, STF, STJ, TRF, TIT, Conselhos de Contribuintes, etc.
Usuários
Lembrar usuário
Lembrar senha

Pesquisar em
Doutrina
Boletins
Todas as Áreas
Áreas Específicas
Tribunais e Órgãos abrangidos
Repercussão Geral (STF)
Recursos Repetitivos (STJ)
Súmulas (STF)
Súmulas (STJ)
Matérias Relevantes em Julgamento


Localizar nessa página:   
 

Primeira turma do STJ impõe multa acima do teto previsto pelo CPC em face de embargos protelatórios - Natália Molina

Artigo - Federal - 2018/3654

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça proferiu acórdão em 25.10.2018, rejeitando embargos de declaração opostos por empresa do setor elétrico nos autos do Recurso Especial n. 1.268.706 / MG, com a imposição de multa acima do patamar de dois por cento sobre o valor atualizado da causa previsto no parágrafo 2º, do artigo 1.026, do Código de Processo Civil, por restar configurada sua nítida intenção protelatória.

Os embargos em questão foram opostos em face de decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, que negou provimento a agravo interno também interposto pela empresa. Ambos os recursos versavam sobre a tempestividade do recurso especial, ao argumento central de que deve ser permitida às partes a utilização de sistema de transmissão de dados e imagens tipo fac-símile ou outro similar para a prática de atos processuais, conforme previsão do artigo 1º, da Lei n. 9.800, de 26 de maio de 1999, sendo por isso válida a utilização de correio eletrônico (e-mail) para apresentação de petição escrita ao tribunal (protocolo).

O colegiado acompanhou o voto do relator ministro Gurgel de Faria no sentido de rejeitar o recurso.

Na ocasião, se assentiu que os embargos de declaração da empresa eram manifestamente protelatórios, na medida em que reiteravam os mesmos argumentos suscitados em agravo interno, sem explicitar qualquer obscuridade, contradição, omissão ou erro material contidos no acórdão anterior - vícios esses que ensejariam a oposição do recurso, conforme rol do artigo 1.022 do Código de Processo Civil. Veja-se a ementa da decisão:

"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. INOCORRÊNCIA. RECURSO PROTELATÓRIO. MULTA. CABIMENTO. 1. Os embargos de declaração têm ensejo quando há obscuridade, contradição, omissão ou erro material no julgado, a teor do disposto no art. 1.022 do CPC/2015. 2. O art. 1.026, § 2º, do CPC/2015 permite a aplicação de multa não excedente a dois por cento do valor atualizado da causa quando interpostos embargos de declaração reputados, fundamentadamente, manifestamente protelatórios. 3. Hipótese em que a embargante reiterou o teor dos argumentos deduzidos no agravo interno, sem explicitar nenhum dos vícios previstos no dispositivo supramencionado, razão por que se consideram protelatórios os presentes embargos. 4. Fixado o valor da causa em um mil reais, o percentual a incidir sobre esse quantum não atingirá o escopo pretendido no preceito sancionador, pelo que cabível o arbitramento daquela multa em R$ 2.000,00 (dois mil reais). 5. Embargos de declaração rejeitados, com imposição de multa."

A divergência entre os julgadores se deu apenas em relação ao valor da multa cominada. Por maioria (vencido o ministro Napoleão Nunes Maia Filho), os ministros entenderam que, tendo o valor da causa sido fixado em mil reais, o arbitramento da multa nos parâmetros previstos no parágrafo 2º, do artigo 1.026, do Código de Processo Civil, tornaria "insignificante" a penalidade.

A sanção restou estabelecida no valor de dois mil reais: superior ao teto indicado na legislação processual e correspondente ao dobro do valor atribuído à causa.

A aplicação de multa em casos como esse já era prevista no Código de Processo Civil de 1973, no parágrafo único do artigo 538, mas com um patamar máximo ainda inferior ao atualmente vigente: "Parágrafo único. Quando manifestamente protelatórios os embargos, o juiz ou tribunal, declarando que o são, condenará o embargante a pagar ao embargado multa não excedente de 1% (um por cento) sobre o valor da causa. Na reiteração de embargos protelatórios, a multa é elevada a até 10% (dez por cento), ficando condicionada a interposição de qualquer outro recurso ao depósito respectivo.".

Além da majoração do valor máximo de um para dois por cento sobre o valor atualizado da causa, o Código de Processo Civil atual prevê a necessidade de fundamentação da decisão que fixar a condenação, como meio de coibir arbitrariedades por parte dos magistrados.

Em outros termos, a lei processual vigente dispõe que o julgador que rejeitar esse recurso e arbitrar multa não só deverá declarar o cunho protelatório da embargante, mas terá de assentar a sua motivação explícita no texto do acórdão, isto é, esclarecer por que a conduta da parte se revela "manifestamente protelatória".

No âmbito do Processo Civil, os embargos de declaração sobressaem como o recurso com maior propensão a estimular o intuito de procrastinação[1], especialmente porque possuem efeito interruptivo do prazo, conforme o caput do artigo 1.026, do Código de Processo Civil.

Quer dizer, como os embargos provocam a interrupção do prazo para interposição de recursos - além do fato de serem cabíveis em face de qualquer decisão proferida por juízes ou colegiados -, as partes podem vislumbrar em sua oposição a oportunidade de obterem mais tempo no processo ou retardarem o deslinde da demanda, por quaisquer motivos que lhes sejam particulares.

No caso em questão (Recurso Especial n. 1.268.706 / MG), o relator justificou a imposição de multa na falta de indicação dos vícios que teriam sido cometidos pela decisão embargada, o que evidenciaria o seu caráter procrastinador.

De fato, trata-se de conduta já reconhecida como "manifestamente protelatória" pelo Superior Tribunal de Justiça em diversas outras ocasiões, como, a título exemplificativo, o julgamento do Recurso Especial n. 859.977-EDcl-EDcl, proferido em 8.9.2009, pela Segunda Turma:

"PROCESSO CIVIL - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - AUSÊNCIA DE OMISSÃO - CONDUTA PROTELATÓRIO VERIFICADA - MULTA PROCESSUAL - ART. 538, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC - CABIMENTO. 1. Os embargos de declaração são instrumento integrativo da decisão judicial. Visam escoimá-la de vícios que prejudiquem a efetivação do comando judicial, tais quais a obscuridade, a contradição e a omissão. 2. É protelatória a conduta processual que i) renova embargos de declaração sem causa jurídica ou fundamentação adequada; ii) não apontam nenhuma omissão ou vício no julgamento anterior; iii) visam modificar os fundamentos da decisão embargada; iv) são reiteração de anteriores embargos de declaração, no qual a matéria foi expressa e fundamentadamente aclarada; v) retarda indevidamente o desfecho do processo; e vi) há recurso cabível para a finalidade colimada. 3. Embargos de declaração rejeitados com aplicação de multa."

A peculiaridade da recente decisão proferida pela Primeira Turma reside na fixação da penalidade em valor superior ao teto previsto pelo Código de Processo Civil, ou seja, acima de dois por cento do valor da causa atualizado, que restou fundamentada no voto condutor do aresto como insuficiente "para atingir o escopo pretendido no preceito sancionador".

Embora seja razoável a ponderação do relator e dos demais ministros que seguiram o voto, que prezam a manutenção da finalidade punitiva da multa prevista no parágrafo 2º, do artigo 1.026, do atual Código de Processo Civil, a decisão preocupa os jurisdicionados.

Isso porque nem sempre será tangível o caráter irrisório do quantum atribuído à causa, a justificar a extrapolação dos limites previstos em lei.

Assim, há que se ressaltar a importância de se analisar a atipicidade e excepcionalidade do caso concreto em relação ao ordenamento para que se transcenda os patamares prescritos pelo Código de Processo Civil, pelos julgadores, na imposição de multas.

De outro modo, também se faz necessário considerar que o próprio Código de Processo Civil prevê um aumento progressivo da multa punitiva em caso de oposição reiterada de embargos de declaração com intuito protelatório (parágrafo 3º do artigo 1.026), elevando-se o patamar a até dez por cento sobre o valor atualizado da causa.

[1] DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 3: Meios de Impugnação às Decisões Judiciais e Processo nos Tribunais. 12ª ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2014. Pág. 199.

 
Natália Molina é Graduada em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2018) e Graduada em Letras pela Universidade de São Paulo - USP (2017);