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Serviços de hotelaria versus locação de espaço em bens imóveis - Tratamento tributário em relação ao ISS -
José Antônio Patrocínio*

Artigo - Federal - 2018/3644

PROCESSUAL CIVIL - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - ERROR IN PROCEDENDO - JULGAMENTO DE RECURSO ESPECIAL JÁ JULGADO - NOVO JULGAMENTO - ADEQUAÇÃO AOS LINDES DA DEVOLUTIVIDADE - TRIBUTÁRIO - PROCESSO CIVIL - ISSQN - SERVIÇO DE HOTELARIA - TRIBUTAÇÃO DOS SERVIÇOS TERCEIRIZADOS - INCLUSÃO NO PREÇO - INCIDÊNCIA - DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL PREJUDICADO. QUESTÃO CONSTITUCIONAL - PREQUESTIONAMENTO - INCOMPETÊNCIA. 1. (...); 2. (...); 3. Compõe a base de cálculo do ISSQN todas as parcelas que integram o preço do serviço de hotelaria, nele incluídos tinturaria, lavanderia e despesas telefônicas cobradas pelo hotel do hóspede. "Salvo nos casos previstos na Lei, as parcelas dos custos da prestação dos serviço não são excluídas da base de cálculo." (REsp 982.952/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, Rel. p/ Acórdão Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/10/2008, DJe 16/10/2008); 4. Divergência jurisprudencial prejudicada. Precedentes da Corte no sentido do acórdão recorrido. Aplicação da Súmula 83/STJ. 5. Embargos de declaração parcialmente providos para conceder efeito infringente ao acórdão embargado no sentido de negar provimento ao recurso especial do contribuinte. (EDcl no REsp 885.014/RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe de 17.11.2009)

Desde os primórdios, uma das atividades que sempre esteve no campo de incidência do imposto sobre serviços é a de hospedaria ou hospedagem. Entretanto, ao longo do tempo, a descrição desta hipótese, na lei, sofreu grandes modificações.

Para melhor compreensão da matéria, vale conferir esta evolução:

1ª Redação - Locação de espaço em bens imóveis, a título de hospedagem ou para a guarda de bens de qualquer natureza - CTN - 1966;

2ª Redação - Locação de espaço em bens imóveis, a título de hospedagem. - DL 406/1968;

2ª Redação - Hospedagem em hotéis, pensões e congêneres, exceto o fornecimento de alimentação, bebidas a outras mercadorias quando não incluídas no preço da diária ou mensalidade. - DL 406/1968;

3ª Redação - Hospedagem em hotéis, pensões e congêneres (o valor da alimentação, quando incluído no preço da diária ou mensalidade, fica sujeito ao Imposto Sobre Serviços). - DL 834/1969;

4ª Redação - Hospedagem em hotéis, motéis, pensões e congêneres (o valor da alimentação, quando incluído no preço da diária, fica sujeito ao Imposto sobre Serviços). - LC 56/1987;

5ª Redação - 9.01 - Hospedagem de qualquer natureza em hotéis, apart-service condominiais, flat, apart-hotéis, hotéis residência, residence-service, suite service, hotelaria marítima, motéis, pensões e congêneres; ocupação por temporada com fornecimento de serviço (o valor da alimentação e gorjeta, quando incluído no preço da diária, fica sujeito ao Imposto Sobre Serviços). - LC 116/2003.

A simples comparação do texto permite-nos concluir que a intenção do legislador sempre foi a de ampliar, em muito, as hipóteses de incidência do ISS, em relação aos serviços de hospedagem. Do mesmo modo, também é possível notar que, na origem, havia um destaque expresso para a locação do espaço em bens imóveis. A condição para a tributação era a de que ela ocorresse à título de hospedagem. Porém, desde 1968, o legislador retirou da lei esta expressão, enfatizando apenas os serviços de hospedagem de qualquer natureza.

Muito bem!

Em que pese a notória ampliação destas hipóteses de incidência, nos últimos anos, as discussões judiciais acerca do assunto, restringiram-se à definição da composição da base de cálculo do ISS nestas atividades. O julgado em comento, resume bem o entendimento consolidado, segundo o qual, a base de cálculo do ISSQN compreende todas as parcelas que integram o preço do serviço de hotelaria, nele incluídos a tinturaria, a lavanderia e as demais despesas telefônicas cobradas pelo hotel do hóspede.

Em outras palavras, o prestador dos serviços não pode excluir de sua base de cálculo, o valor cobrado pelas comodidades colocadas à disposição do hospede, tais como os serviços de lavanderia. Neste caso, pouco importa o fato deles não estarem incluídos no valor da diária de hospedagem.

Detalhe: Este entendimento não se aplica às despesas com alimentação!

O valor das bebidas e dos alimentos, quando não incluídos no valor da diária, ficarão sujeitos ao ICMS, conforme prevê a lei de regência.

Em resumo, este é o entendimento consolidado no Superior Tribunal de Justiça - STJ.

Ocorre que, recentemente, a Associação Brasileira da Indústria de Hotéis - ABIH NACIONAL -, propôs uma Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADIN - justamente em face do subitem 9.01 da Lista de serviços anexa à Lei Complementar nº 116/2003, que, como visto, descreve atualmente as hipóteses de incidência do ISS nos serviços de hospedagem.
Na tese da Associação, o ISS não pode incidir sobre a totalidade do valor da diária de hospedagem, pois nele está compreendida também a parcela relativa à locação do espaço no bem imóvel.

Um pequeno trecho, extraído da petição inicial, permite-nos conhecer um pouco mais destes argumentos:

"No que diz respeito especificamente à instituição de ISS aos serviços de hospedagem, que compreendem a locação de bens imóveis, aplica-se o mesmo raciocínio, porquanto grande parte das receitas auferidas pelas redes hoteleiras não se refere a prestações de serviços, mas sim a locações de quartos que estão compreendidos na diária cobrada do hóspede. E, analogamente à não incidência do ISS sobre locação de bens móveis, a incidência do imposto sobre locação de bens imóveis, cujo valor está inserido no preço da diária dos hotéis, também está eivada de inconstitucionalidade, que deve ser reconhecida com intuito de preservar a integridade e coerência dos preceitos constitucionais, além de coibir a ilegalidade de sua cobrança praticada pelos entes municipais.

Assim, mostra-se inconstitucional o subitem 9.01 da lista anexa à Lei Complementar nº116/2003, vez que não pode incidir o ISS sobre a totalidade da hospedagem (vocábulo que inclui em seu sentido tanto a oferta de alojamento - obrigação de dar - quanto a prestação de serviços)."

A associação conclui sua exposição requerendo a procedência da ação, "a fim de declarar a inconstitucionalidade do item 9.01 da lista anexa à Lei Complementar nº 116/2003, de maneira parcial, no que tange a incidência do imposto ISS sobre a fração referente à locação de bem imóvel, uma obrigação de dar, presente na "hospedagem", vez que esta atividade inclui, além de prestações de serviços de hospedagens intrínsecos e necessários para o hóspede, uma parcela significativa referente à locação da unidade habitacional propriamente dita, parcela esta a ser devidamente apurada consonante às normas fiscais e/ou contábeis aplicáveis à matéria."

Em seu despacho, o Ministro Marco Aurélio, Relator do Processo, não suspendeu a eficácia do dispositivo, como queria a Associação, determinando que, após a instrução do processo, seja ele submetido ao plenário do Tribunal, que terá a faculdade de julgar definitivamente a ação.

Em relação ao tema, agora digo eu, as chances de êxito são remotas, pois, com a evolução legislativa, a hipótese de incidência passou a ser a hospedagem e não mais a locação do espaço em um bem imóvel.

O festejado Professor Bernardo Ribeiro de Moraes, em sua clássica obra, "Doutrina e Prática do ISS", já alertava para este detalhe.

Confira:

A atividade onerada pelo ISS não é a locação de bem imóvel em si, mas de espaço em bem imóvel com a finalidade única de dar hospedagem. O que o tributo alcança é a atividade de hospedagem, o esercizio di alberghi como é definido em alguns países. Não se onera, portanto, a locação de espaço, mas a hospedagem, contraio misto complexo e inominado no direito brasileiro. Muitos municípios utilizaram, na respectiva legislação, como hipótese de incidência fiscal, a expressão da lei maior. Outros adotam expressão mais simples, como "hospedagem em geral" ou apenas "hospedagem".

Importa consignar que, no caso da hospedagem, operação que está no campo de incidência do ISS, o tomador dos serviços não almeja pura e simplesmente locar um imóvel. Há, por parte dele, interesse explicito no conforto e nas comodidades oferecidas pelo prestador dos serviços de hotelaria.

Por outro lado, também é importante registrar que a eventual locação de uma unidade situada em um "apart-hotel", por exemplo, em que inexista serviços de hotelaria, não configura fato tributável pelo imposto municipal. Há vasta jurisprudência neste sentido!

Resta-nos assim, aguardar o desfecho da ação direta de inconstitucionalidade - ADIN 5764, para sabermos qual a posição do Supremo Tribunal Federal em torno deste assunto.

 
José Antônio Patrocínio é advogado, Contabilista, Consultor Tributário da Thomson Reuters FISCOSoft e Professor de ISSQN no MBA Gestão Tributária na FIPECAFI/USP.