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Sociedade Uniprossional - SUP- ISS Fixo - Mudança nos critérios não autoriza o desenquadramento retroativo - José Antônio Patrocínio*

Artigo - Federal - 2017/3630

Ementa: "AÇÃO ANULATÓRIA - ISSQN - Sociedade uniprofissional (SUP) - Desenquadramento retroativo (artigo 15 da Lei nº 13701/13) - Indeferido pedido de tutela antecipada - Pretendida suspensão da exigibilidade dos autos de infração - Possibilidade parcial - Retroatividade não prevista, pelo art. 149 do CTN, para os casos de erro de direito Efeitos "ex nunc" Direito ao benefício excluído, em princípio, pela condição da agravante, como sociedade limitada Precedentes do E. STJ - Presença apenas parcial, dos requisitos autorizadores da medida Decisão reformada, em parte Agravo parcialmente provido. (...)

Portanto, inviável a continuação da emissão, das suas notas fiscais, como ainda classificada, no regime especial de tributação, o qual, porém, deve ser observado, até o discutido desenquadramento, que só pode ter efeitos "ex nunc", dado que o erro de direito está sem previsão, no art. 149 do CTN. Segue-se que os créditos tributários lançados, a partir daquele ato, em princípio são exigíveis; não assim, os anteriores, pelas razões supra, cuja exigibilidade fica suspensa, uma vez presentes quanto a eles os requisitos da aparência do bom direito e risco de dano, perante eventual necessária repetição de indébito, sempre de difícil e demorada concretização." (TJ/SP Agravo de instrumento nº 2252436-59.2016.8.26.0000).

O grande pesadelo das Sociedades Uniprofissionais, que no linguajar fiscal ficaram conhecidas como "SUP", é sem dúvida nenhuma o desenquadramento do regime de tributação do ISS em valor fixo. Em termos práticos, esta medida acarreta um expressivo aumento da carga tributária destes contribuintes, já que, a partir da ciência da decisão, o imposto passa a incidir sobre o faturamento bruto da sociedade.

Muitos Municípios brasileiros, à exemplo de São Paulo, estão intensificando massivamente as ações de fiscalização nesta área, visando identificar as sociedades que, na visão do fisco, não fazem jus a este regime de tributação.

Neste contexto, a condição mais visada, pela facilidade de sua detecção, diz respeito à escolha do tipo societário. E não dá trabalho nenhum identificar isto!

Basta que a Sociedade tenha a expressão "Ltda" na razão social, para que seja impedida de recolher o ISS em valor fixo. Pela tese do fisco, a sociedade limitada não tem direito ao regime mais favorecido, justamente porque nessa espécie societária, a responsabilidade do sócio é limitada ao capital social.

Não concordamos com esta tese!

O fato de uma sociedade ser constituída como limitada, no aspecto societário, nunca vai interferir na responsabilidade de seus sócios, que será sempre pessoal, nos termos da lei que regula o exercício de cada uma das profissões.

Como exemplo disto, podemos citar o caso do médico, que independentemente da natureza jurídica da sociedade da qual pertença, assumirá sempre a responsabilidade pessoal pelos seus atos. Neste sentido, a legislação de regência da atividade é incisiva ao estabelecer que a responsabilidade médica é sempre pessoal e não pode ser presumida. (Código de Ética Médica - Artigo 1º, parágrafo único da Resolução do Conselho Federal de Medicina nº 1931/2009).

Veja que, uma coisa é a responsabilidade social, tributária e patrimonial que está vinculada a cada um dos sócios. Estas questões são regulamentadas pelo Código Civil e estão relacionadas com a natureza jurídica da sociedade. No caso das sociedades limitadas essa responsabilidade fica limitada ao valor das quotas de cada sócio na hora da integralização do capital social. Já a responsabilidade pessoal exigida pela Lei Tributária não tem nada a ver com isto!

Já tratamos disto em artigo anterior, publicado no Boletim de janeiro de 2015. Importa-nos neste, avaliar se a imposição deste requisito, quando decorrente de mudança na interpretação da Legislação, pode retroagir os efeitos para atingir fatos geradores anteriores à sua introdução.

Antes disto, importa esclarecer que, se os fatores impeditivos ao regime de tributação fixa, sobrevirem de alteração legislativa, inexiste dúvida de que os seus efeitos serão sempre para o futuro, ou seja, não atingem fatos geradores ocorridos antes de sua edição. Registre-se, por oportuno, que mesmo por lei, a instituição destes empecilhos é bastante questionável. Caberá ao Supremo Tribunal Federal decidir, brevemente, se realmente os Municípios podem legislar sobre esta matéria.

Entretanto, se esta imposição decorrer apenas de uma nova interpretação, de um dispositivo legal preexistente, estaremos diante da chamada "modificação nos critérios jurídicos" adotados, até então, pelo fisco.

Mas será que isto é possível? O fisco pode dar uma nova interpretação a um dispositivo legal, totalmente diferente daquela que vinha praticando nos últimos anos?

A resposta é afirmativa! O fisco tem sim, todo o direito de modificar/alterar a interpretação de dispositivos da legislação tributária. O que é vedado é retroagir os efeitos desta mudança a fatos geradores ocorridos antes de sua introdução.

Neste sentido, o artigo 149 do Código Tributário Nacional é taxativo:

"Art. 146. A modificação introduzida, de ofício ou em conseqüência de decisão administrativa ou judicial, nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua introdução."

Significa dizer que os atos administrativos que modifiquem qualquer aspecto jurídico da obrigação tributária, sobretudo aqueles de caráter interpretativo possuem efeitos apenas "ex nunc", ou seja, efeitos apenas para o futuro.

Neste ponto, relevante transcrever trecho do voto do Conselheiro Alexandre Evaristo Pinto, Relator do Processo Administrativo nº: SEI nº 6017.2017/0036173-1, da 2ª Câmara Julgadora do Conselho Municipal de Tributos - órgão vinculado à Secretaria de Finanças do Município de São Paulo, sobre este assunto:

"59. Nesse sentido, no que tange ao desenquadramento pelo mero fato de adoção da forma de sociedade limitada, houve alteração do critério jurídico por inovação do Parecer Normativo SF Nº 3/16, de modo que um desenquadramento apenas com fundamento em tal fato somente poderia produzir efeitos a partir da data de publicação do referido parecer, isto é, 28 de outubro de 2016, o que implica em trazer segurança jurídica para todos os envolvidos, na medida em que há previsibilidade e calculabilidade das consequências jurídicas para quem constituir uma sociedade simples sob a forma de sociedade limitada a partir de tal data.
(...);

61. Assim, não há que se falar em desenquadramento da condição de sociedade uniprofissional apenas em função da adoção da forma de sociedade limitada pela sociedade simples para os períodos de apuração anteriores a novembro de 2016."

Neste mesmo sentido são as lições do tributarista Eduardo Sabbag:

"O erro de direito viabiliza a adoção de novo critério jurídico na exegese da norma, que se contrapõe a um critério anteriormente utilizado. Assim, em certo momento, muda-se a interpretação, substituindo uma exegese por outra; ou, o que não é incomum, passa-se a adotar uma alternativa anteriormente não escolhida, na interpretação do caso concreto. Quer-se afirmar que o novo critério jurídico, escolhido pelo Fisco, na atividade de lançamento, só poderá ter efeitos ex nunc, com aplicação exclusiva a casos futuros, prestigiando a boa-fé do contribuinte. Posto isso, é incabível o lançamento suplementar motivado por erro de direito". (SABBAG, Eduardo. Sabbag, Manual de direito tributário. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2016).

A par disto, o eventual desenquadramento do regime de tributação em valor fixo, com base na mudança dos critérios jurídicos, só pode surtir efeitos futuros.

Nunca retroagir!

Coaduna com o este entendimento a jurisprudência do Colendo Superior

Tribunal de Justiça sobre o assunto, abaixo colacionada:

EMENTA: TRIBUTÁRIO. MERCADORIA IMPORTADA. ICMS. MOMENTO DO FATO GERADOR. ARTIGO 155, § 2º, IX, "A", DA CF/88. ARTIGO 34, § 3º, DO ADCT. CONVÊNIO 66/88. ACÓRDÃO RECORRIDO FUNDADO EM MATÉRIA EXCLUSIVAMENTE INFRACONSTITUCIONAL. ENTENDIMENTO DO STF CONSOLIDADO NA SÚMULA Nº 661. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 577/STF LIMITADA AOS FATOS GERADORES ANTERIORES À CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988.

1. O recolhimento prévio do ICMS como condição para desembaraço aduaneiro de mercadoria importada passou a ser exigido após a promulgação Constituição Federal de 1988, nos termos na Súmula nº 661, do STF ("Na entrada de mercadoria importada do exterior, é legítima a cobrança do ICMS por ocasião do desembaraço aduaneiro"), não mais se justificando, a partir de então, a incidência da Súmula nº 577/STF ("Na importação de mercadoria do exterior, o fato gerador do imposto de circulação de mercadorias ocorre no momento de sua entrada no estabelecimento do importador")

2. "A modificação introduzida, de ofício ou em conseqüência de decisão administrativa ou judicial, nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua introdução" (art. 146, do CTN)

3. "O artigo 146 do CTN positiva, em nível infraconstitucional, a necessidade de proteção da confiança do contribuinte na Administração Tributária, abarcando, de um lado, a impossibilidade de retratação de atos administrativos concretos que implique prejuízo relativamente à situação consolidada à luz de critérios anteriormente adotados e, de outro, a irretroatividade de atos administrativos normativos quando o contribuinte confiou nas normas anteriores". (Leandro Paulsen, in Direito Tributário - Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência, 8ª ed., Ed. Livraria do Advogado, Porto Alegre, 2006, pág. 1.086)

6. Recurso especial da Fazenda Nacional provido. (Resp nº 810565/SP, Rel. Min. Luix Fux, DJe de 03-03-2008)

Vale conferir mais algumas decisões:

"É vedado ao Fisco conferir eficácia retroativa à superveniente alteração de critério jurídico para a cobrança de ISS em detrimento do contribuinte.

Art. 146 do Código Tributário Nacional. Hipótese em que o Fisco exige diferenças de ISS recolhido a menor amparado em parecer exarado pela autoridade competente em violação ao princípio da boa-fé objetiva, porquanto constitui venire contra factum proprium. Violação da legítima expectativa do contribuinte quanto à correção do pagamento realizado. 2. Em se tratando de causa em que restou vencida a Fazenda Pública, os honorários advocatícios são fixados de acordo com a apreciação eqüitativa do juiz. Hipótese em que os honorários fixados devem ser majorados. Recurso do Réu desprovido. Recurso do Autor provido". (TJRS- 22ª Câm. Cível, nº 70027516210, Rel. Des. Maria Isabel de Azevedo Souza, J. 18/12/2008). (grifo nosso)

"APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. LANÇAMENTO. REVISÃO. MUDANÇA DE CRITÉRIO JURÍDICO. IMPOSSIBILIDADE. É ser rejeitada a preliminar de não-conhecimento do recurso, suscitada pela parte apelada, não tendo a sentença decidido a quaestio com base em questão sumulada pelas Cortes Superiores. Inaplicabilidade, na espécie, da lei nº 11.276/06. Preliminar rejeitada. A autoridade fazendária tem o dever funcional da correta aplicação da lei, sendo-lhe vedado revisar o lançamento tributário para simplesmente alterar critério jurídico, majorando a multa aplicada ao contribuinte, sob pena de violação ao princípio da imutabilidade do lançamento, inserto no art. 146, do CTN. Portanto, não se enquadrando a espécie em nenhuma das hipóteses elencadas no art. 149, do CTN, a procedência dos embargos se impunha, pois nulo o lançamento. Não fosse isso, caso a intenção do Município fosse a de revisar o lançamento tributário, na forma do art. 149, do CTN, conforme lhe é lícito fazer, impunha-se comprovar que o sujeito passivo teria agido com dolo, fraude ou simulação, jamais aplicar, de plano, a multa, antevendo ou até mesmo pressagiando a ocorrência de sonegação, não podendo ser desconsiderado, para solução dos embargos, que a questão acerca da competência territorial para recolhimento do tributo não é pacífica na jurisprudência, máxime de acordo com as interpretações que vinham sendo dadas ao art. 12, do DL nº 406/68. APELAÇÃO PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70016552598, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Henrique Osvaldo Poeta Roenick, Julgado em 18/10/2006)."

"TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. RETROATIVIDADE DOS EFEITOS DA EXCLUSÃO DO SIMPLES. EXIGÊNCIA DO PAGAMENTO DE DIFERENÇAS DE TRIBUTOS. INADMISSIBILIDADE. ARTS. 15, II E 16 DA LEI 9.317/1996. 1. [...] 4. A alteração de critério jurídico por parte da administração não tem o condão de ensejar a revisão do lançamento e, por conseguinte, atribuir efeitos retroativos ao ato de exclusão, respaldando a exigência do pagamento de diferenças de tributos. 5. Recurso especial conhecido e não-provido. (RESP 200702427888, JOSÉ DELGADO, STJ - PRIMEIRA TURMA, 21/05/2008)"

Esse também era o entendimento pacificado no extinto Tribunal Federal de Recursos (TRF), consagrado por meio da Súmula 227:

"Súmula 227. Mudança de Critério Jurídico Adotado pelo Fisco - Revisão de Lançamento - Imposto de Importação - Serviços Aduaneiros. A mudança de critério jurídico adotado pelo fisco não autoriza a revisão de lançamento."

O Superior Tribunal de Justiça, como não poderia ser diferente, manteve este posicionamento:

"TRIBUTÁRIO. MODIFICAÇÃO DE CRITÉRIO JURÍDICO. LANÇAMENTOS ANTERIORES. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. CAUÇÃO. CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITO DE NEGATIVA. VIABILIDADE. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. BENEFÍCIO DE ORDEM. 1. O reenquadramento de contribuinte pelo Fisco de autarquia para empresa pública, em decorrência de decisão do Supremo, que examinou a natureza jurídica da entidade, não autoriza a cobrança das diferenças tributárias porventura existentes antes dessa alteração. Incidência do art. 146 do CTN. 2. "A mudança de critério jurídico adotado pelo Fisco não autoriza a revisão de lançamento" (Súmula 227 do extinto Tribunal Federal de Recursos). [...] (RESP 200601339600, CASTRO MEIRA, STJ - SEGUNDA TURMA, 02/03/2007) (grifei)"

Por tudo isto, podemos concluir que a mudança nos critérios jurídicos, promovida pelo fisco municipal, NÃO AUTORIZA a retroação deste novo entendimento a fatos geradores ocorridos antes de sua introdução. Como visto, esta prática é totalmente vedada pelo artigo 146 do Código Tributário Nacional.

Todos que foram afetados por esta medida inconstitucional, tem o direito de recorrer ao Poder Judiciário.

 
José Antônio Patrocínio#
Advogado, Contabilista, Consultor Tributário da Thomson Reuters FISCOSoft e Professor de ISSQN no MBA Gestão Tributária na FIPECAFI/USP.
Email: patrocinio2007@terra.com.br
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