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Nova lei do ISS - Vigência, eficácia e a questão dos princípios constitucionais - José Antônio Patrocínio*

Artigo - Federal - 2017/3597

Ementa: "Ação Direta de Inconstitucionalidade - Lei n. 8.200/91 (arts. 3º e 4º) - Correção monetária das demonstraçãoes financeiras das pessoas juridicas - Reflexo sobre a carga tributaria sofrida pelas empresas em exercicios anteriores - a questão das limitações constitucionais ao poder de tributar (titularidade, alcance, natureza e extensao) - "periculum in mora" não configurado, especialmente em face das medidas de contracautela instituidas pela lei n. 8.437/92 - Suspensão liminar da eficacia das Normas impugnadas indeferida por despacho do relator. Decisão referendada pelo plenário do Supremo Tribunal Ffederal. - O exercício do poder tributário, pelo estado, submete-se, por inteiro, aos modelos juridicos positivados no texto constitucional que, de modo explicito ou implicito, institui em favor dos contribuintes decisivas limitações a competência estatal para impor e exigir, coativamente, as diversas espécies tributarias existentes. Os princípios constitucionais tributários, assim, sobre representarem importante conquista político-jurídica dos contribuintes, constituiem expressao fundamental dos direitos individuais outorgados aos particulares pelo ordenamento estatal. Desde que existem para impor limitações ao poder de tributar do estado, esses postulados tem por destinatario exclusivo o poder estatal, que se submete a imperatividade de suas restrições. - O princípio da irretroatividade da lei tributaria deve ser visto e interpretado, desse modo, como garantia constitucional instituida em favor dos sujeitos passivos da atividade estatal no campo da tributação. Ttrata-se, na realidade, a semelhanca dos demais postulados inscritos no art. 150 da Carta Politica, de princípio que - por traduzir limitação ao poder de tributar - e tão-somente oponivel pelo contribuinte a ação do estado. - Em princípio, nada impede o poder público de reconhecer, em texto formal de lei, a ocorrencia de situações lesivas a esfera jurídica dos contribuintes e de adotar, no plano do direito positivo, as providencias necessarias a cessação dos efeitos onerosos que, derivados, exemplificativamente, da manipulação, da substituição ou da alteração de indices, hajam tornado mais gravosa a exação tributaria imposta pelo estado. A competência tributaria da pessoa estatal investida do poder de instituir espécies de natureza fiscal abrange, na latitude dessa prerrogativa jurídica, a possibilidade de fazer editar normas legais que, beneficiando o contribuinte, disponham sobre a suspensão ou, até mesmo sobre a propria exclusao do crédito tributário. - Controversia jurídica em torno do tema delineada nas informações prestadas pela presidencia da republica. (Medida Cautelar na Ação Direta de Iinconstitucionalidade - ADI 712 MC/DF - 07/10/1992)".

A Lei Complementar nº 157/2016, publicada no final do ano passado, promoveu inúmeras alterações na Lei Complementar nº 116/2003, que, cumprindo misso constitucional, dá toda estrutura ao imposto municipal sobre serviços - ISS. Uma das mudanças mais radicais, que merece destaque, diz respeito à definição da competência tributária municipal para instituição, fiscalização e cobrança do ISS. Para algumas atividades, o imposto que antes era recolhido na "sede administrativa" da empresa, designada na lei como "estabelecimento prestador", agora passará a ser pago ao Município onde estiver estabelecido o tomador dos serviços.

Este deslocamento da competência, pulverizando a arrecadação do ISS, impacta muito o dia a dia dos contribuintes, tanto do ponto de vista estrutural, como do ponto de vista financeiro, já que o novo sujeito ativo da relação jurídico tributária, município do tomador, via de regra, praticará sempre a alíquota máxima do imposto, qual seja, cinco por cento.

Muito bem!

Em vista disto, muitas são as dúvidas e discussões acerca do momento exato, a partir do qual estas relevantes alterações serão, efetivamente, colocadas em prática.

Afinal de contas, a Lei Complementar nº 157/2016 está ou não está vigorando?Será que ela já está produzindo os seus efeitos?

Vamos, por primeiro, distinguir bem estes dois institutos, para aí sim, depois, analisá-los isoladamente.

Apenas um pequeno trecho dos ensinamentos do Professor Carlos Alberto M.S.M. Violante, em sua obra "Lei de Introdução ao Código Civil", é o suficiente para fixarmos bem a diferença entre eles:

"Vigência e eficácia são expressões distintas. Lei vigente é aquela que integra o ordenamento jurídico, por ter atendido regularmente todas as etapas do processo de elaboração da lei; lei eficaz é aquela que efetivamente produz os efeitos nela previstos."

Então, a vigência da lei, é sempre definida no "corpo" dela mesma, já que o legislador é obrigado a estabelecer, na chamada "cláusula de vigência", o momento a partir do qual ela integra o ordenamento jurídico. Uma lei pode entrar em vigor, tanto na data de sua publicação, quanto em qualquer outra data futura, fixada expressamente pelo legislador.

No caso específico da Lei Complementar nº 157/2016, o legislador estabeleceu que ela entra em vigor na data de sua publicação, ou seja, 30 de dezembro de 2016. Do mesmo modo, o texto vetado pelo Presidente da República e reincorporado à lei, por conta da rejeição do veto pelo Congresso Nacional, também entra em vigor na data de sua publicação, qual seja, 01 de junho de 2017.

Aí está, portanto, o momento a partir do qual a Lei Complementar 157/2016 está vigorando.

Mas, será que ela já está produzindo os seus efeitos?

O legislador fez questão de mencionar expressamente que, algumas alterações, trazidas no corpo da lei, só produziriam efeitos após o transcurso de um prazo fixado por ele.

São as regras previstas nos §§ 1º e 2º do artigo 7º da Lei Complementar nº 157/2016. Como consequência disto, os dispositivos legais que tratam da questão da alíquota mínima, das medidas de combate à guerra fiscal, do repasse do ICMS e da improbidade administrativa, só produzirão efeitos após a contagem do prazo neles fixados.

Veja que nestes casos, o próprio legislador estabeleceu o momento a partir do qual as alterações irão produzir os efeitos.

Mas, e com relação às demais alterações previstas na Lei Complementar 157/2016? Quando produzirão os seus efeitos?

Na ausência de disposição expressa, na própria lei, as alterações produzem os seus efeitos, também na data de sua publicação.

Portanto, com as ressalvas destacadas acima, podemos afirmar, categoricamente, que a Lei Complementar nº 157/2016 está em vigor e já produz todos os seus efeitos.

Um destes efeitos merece destaque!

É a paralização da eficácia de todas as leis municipais vigentes, naquilo que elas a contrariarem.

O Professor Geraldo Ataliba tratou disto com maestria! Ele ensina-nos que:

"(...) a superveniência de uma lei complementar, numa matéria que lhe seja própria, paralisa a eficácia das leis estaduais ou municipais que estejam em contrário com suas normas, o que coloca o legislador estadual ou municipal na obrigação de reformular a legislação, fazendo nova lei. Só daí é que se poderá reputar modificada a ordem jurídica estadual ou municipal para ser, depois, exigido aquele tributo de acordo com a modificação"

Não é outro o entendimento do Professor José Souto Maior Borges:

"(...) se a eficácia da lei tributária estadual ou municipal é suspensa ou paralisada com o advento da lei complementar tributária (...) a vigência desta provoca, por si só, o surgimento de um vácuo na legislação estadual ou municipal (...) correspondente ao campo (...) que, enquanto não preenchido (...) ficará inexplorado, porque ineficaz a respectiva legislação. O tributo terá a sua eficácia paralisada e pois não poderá ser exigido".

Portanto, repita-se, com as ressalvas destacadas acima, podemos afirmar, categoricamente, que a Lei Complementar nº 157/2016 está em vigor e já produz todos os seus efeitos, especialmente no que diz respeito à invalidação das leis municipais que a contrariarem.

Mas e os princípios constitucionais? Eles também não interferem na eficácia da nova lei?

É evidente que sim!

Entretanto, é extremamente importante lembrarmos que os princípios do artigo 150, inciso III, alíneas "a", "b" e "c" da Constituição Federal, estão insculpidos no capítulo das limitações constitucionais ao poder de tributar e, assim, funcionam como verdadeiros mecanismos de defesa, do sujeito passivo, contra novas obrigações impostas, de surpresa, pelo fisco e que afrontam a sua segurança jurídica.

Repita-se: mecanismos de defesa do contribuinte, que vinculam a ação do fisco à estrita observância das disposições contidas nas alíneas do inciso III, do art. 150 da Constituição Federal.

Assim, absolutamente inconcebível que a administração tributária queira valer-se deles, com o fito de postergar a revogação tácita de sua legislação pretérita.

Dito de outra maneira, significa que:

Para o fisco, a "nova" lei complementar do ISS - LC 157/2016 -, produz efeitos imediatamente, ou seja, revoga instantaneamente todos os dispositivos da lei complementar "velha" - LC 116/2003. Isto invalida as leis municipais que, tinham nela, o seu fundamento de validade.

Entretanto, sob a ótica do sujeito passivo, a nova lei complementar só produz os efeitos - novas obrigações - após a observância dos princípios constitucionais.

A Corte Suprema já teve oportunidade de manifestar-se sobre este assunto, nos autos da Ação Direto de Inconstitucionalidade - Medida Cautelar - nº 712 MC/DF do ano de 1992, cujo Relator foi o Ministro Celso de Mello.

Confira:

"O exercício do poder tributário, pelo estado, submete-se, por inteiro, aos modelos jurídicos positivados no texto constitucional que, de modo explícito ou implícito, institui em favor dos contribuintes decisivas limitações a competência estatal para impor e exigir, coativamente, as diversas espécies tributarias existentes. Os princípios constitucionais tributários, assim, sobre representarem importante conquista político-jurídica dos contribuintes, constituem expressão fundamental dos direitos individuais outorgados aos particulares pelo ordenamento estatal. Desde que existem para impor limitações ao poder de tributar do estado, esses postulados, tem por destinatário exclusivo o poder estatal, que se submete a imperatividade de suas restrições.

O princípio da irretroatividade da lei tributaria deve ser visto e interpretado, desse modo, como garantia constitucional instituída em favor dos sujeitos passivos da atividade estatal no campo da tributação. Trata-se, na realidade, a semelhança dos demais postulados inscritos no art. 150 da carta política, de princípio que - por traduzir limitação ao poder de tributar - e tão-somente oponível pelo contribuinte a ação do Estado. " (ADI 712 MC / DF - DF Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade -Órgão Julgador: Tribunal Pleno)."

Mais claro impossível!

Os princípios constitucionais existem para impor limitações ao poder de tributar do estado e tem por destinatário exclusivo o poder estatal, que se submete a imperatividade de suas restrições.

O Fisco é destinatário delas e não o seu beneficiário!

Em vista disto, podemos afirmar que:

a) Para a administração tributária, a Lei Complementar nº 157/2016, está em vigor e produz os seus efeitos desde a data de sua publicação, inclusive no que diz respeito à revogação tácita e/ou cassação dos dispositivos que a contrariarem;

b) Para o sujeito passivo, a Lei Complementar nº 157/2016, está em vigor, desde a data de sua publicação, porém os seus efeitos estão suspensos até o decurso do lapso temporal previsto nas alíneas "b" e "c" do inciso III do artigo 150 da Constituição Federal.

Transferindo esta lógica para o plano das leis municipais, os efeitos práticos podem ser resumidos da seguinte maneira:

O fisco não pode mais aplicar a sua atual lei municipal, naquilo que ela contrariar a LC 157/2017 e também não pode, ainda, aplicar a nova lei municipal, já que o sujeito passivo pode invocar as garantias asseguradas pelo art. 150, inciso III, alíneas "a", "b" e "c" da Constituição Federal.

Tal como decidido pelo Supremo Tribunal Federal, o exercício do poder tributário, pelo estado, submete-se, por inteiro, aos modelos jurídicos positivados no texto constitucional que, de modo explícito ou implícito, institui em favor dos contribuintes decisivas limitações ao exercício da competência estatal.

Contudo, o acatamento, pelo fisco, à esta hermenêutica jurídica, com raras exceções, não costuma ser automático e espontâneo, demandando, em cada caso concreto, uma intervenção judicial.

 
José Antônio Patrocínio