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ISS e os contratos de construção civil na modalidade - José Antônio Patrocínio*

Artigo - Federal - 2017/3576

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. ICMS. PRESCRIÇÃO. OPERAÇÕES INTERESTADUAIS. DIFERENCIAL DE ALÍQUOTAS. EMPRESA DE CONSTRUÇÃO CIVIL. NÃO-INCIDÊNCIA. PRECEDENTES. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 167/STJ.

1. Agravo regimental contra decisão que negou provimento a agravo de instrumento.

2. Acórdão a quo segundo o qual, "à luz da exegese do ordenamento jurídico em vigor, o imposto a ser pago pela construtora que executa obras, por administração, empreitada ou sub-empreitada, é o ISSQN, não podendo ser cobrado, também, o ICMS, sob pena de incorrer na vedada bitributação".

3. No caso de recolhimento indevido do ICMS, é de cinco anos o prazo prescricional, a partir da ocorrência da homologação do lançamento para ajuizar a ação repetitória, e, inexistindo homologação expressa, soma-se àquele prazo mais um qüinqüênio, contado da ocorrência do fato gerador.

4. As empresas de construção civil não são contribuintes do ICMS, salvo nas situações que produzam bens e com eles pratiquem atos de mercancia diferentes da sua real atividade, como a pura venda desses bens a terceiros; nunca quando adquirem mercadorias e as utilizam como insumos em suas obras.

5. Há de se qualificar a construção civil como atividade de pertinência exclusiva a serviços, pelo que "as pessoas (naturais ou jurídicas) que promoverem a sua execução sujeitar-se-ão exclusivamente à incidência de ISS, em razão de que quaisquer bens necessários a essa atividade (como máquinas, equipamentos, ativo fixo, materiais, peças, etc.) não devem ser tipificados como mercadorias sujeitas a tributo estadual" (José Eduardo Soares de Melo, in "Construção Civil - ISS ou ICMS?", in RDT 69, pg. 253, Malheiros).

6. Precedentes das egrégias 1ª Seção e 1ª e 2ª Turmas do STJ e do colendo STF.

7. Incidência da Súmula nº 167/STJ: "o fornecimento de concreto, por empreitada, para construção civil, preparado no trajeto até a obra em betoneiras acopladas a caminhões, é prestação de serviço, sujeitando-se apenas à incidência do ISS".

8. Agravo regimental não-provido. (AgRg no Agravo de Instrumento nº 750.255 - MG)

Infelizmente, os longos e longos anos de tributação das atividades de construção civil ainda não foram suficientes para espancar todas as dúvidas e polêmicas em torno da incidência do ISS nestas operações.

Aliás, nem mesmo a questão da dedução das subempreitadas e dos materiais aplicados na obra pode ser considerada inteiramente pacificada. Ainda hoje muitos municípios simplesmente proíbem a dedução das referidas parcelas da base de cálculo do imposto municipal. Já tratamos destes temas, em detalhes, em artigos publicados nos boletins nºs 15, 53, 56, 79 e 98.

Muito bem! Nosso objetivo neste trabalho e abordar alguns aspectos relativos aos contratos de "empreitada global" ou, como alguns preferem, os contratos de "empreitada total", especialmente aqueles na modalidade "turnkey".

A expressão, extraída do direito norte americano, é muito utilizada para designar aqueles contratos, cuja responsabilidade do empreiteiro, vai muito além da simples aplicação da mão de obra e do fornecimento de materiais. Nesta modalidade temos um conjunto muito mais complexo de obrigações contratuais, envolvendo todas as etapas de execução da obra, desde a sua prospecção, até a efetiva entrega das chaves para sua inauguração ou utilização.

Daí então é que se cunhou o uso da expressão "turnkey" para estes contratos, justamente porque o contratante recebe o seu empreendimento com a "chave na mão".

Desmistificando um pouco mais esta operação, o fato é que, nestes contratos, além das obrigações tradicionais, o empreiteiro também adquire todos os equipamentos, máquinas, móveis e utensílios necessários para colocar o empreendimento em plenas condições de inauguração e funcionamento. Repito: O empreiteiro adquire tudo o quanto for necessário para que, ao entregar as suas chaves, ela esteja completamente pronta para uso imediato, nos fins a que se destina.

O processo de aquisição destas "mercadorias", por parte do empreiteiro, pode ser dar de duas maneiras. Caso adquira essas mercadorias em nome do dono da obra, isto não trará nenhuma implicação na legislação do ISSQN. Veja que nesta hipótese, não estaremos diante do chamado contrato "turnkey", que pressupõe a aquisição das mercadorias em nome do empreiteiro e não do dono da obra.

Porém, ao adquirir a mercadoria em seu nome, para aplicação na obra com posterior cobrança do contratante, estaremos diante de operação que acarretará inúmeras repercussões no campo da tributação municipal.

O primeiro ponto a ser esclarecido diz respeito à aquisição da mercadoria pelo prestador dos serviços (empreiteiro ou construtora). Nesta hipótese o prestador (construtora) atua como consumidor final da mercadoria e assim, nesta última etapa da circulação, incidirá o ICMS.

Pois bem, de posse desta mercadoria, a construtora fará uso dela na prestação dos seus serviços, qual seja, a materialização de um projeto de engenharia. Em outras palavras, o prestador dos serviços irá utilizar esta mercadoria na obra de construção civil. E é justamente neste momento que ocorre a figura da chamada "transmutação", processo pelo qual a "mercadoria" adquirida pela construtora transforma-se em "material" que será aplicado na obra.

Então, resumindo, se o empreiteiro (construtora) adquire em seu nome, máquinas, equipamentos, móveis, peças, utensílios, etc, dentro do contrato "turnkey", ou seja, contrato de empreitada global, estaremos diante da execução de uma obra de construção civil, uma obrigação de fazer, sobre a qual incide única e exclusivamente o Imposto Municipal sobre Serviços - ISS.

A construtora não vende estes materiais ao dono da obra! Inexiste pois, o fato gerador da incidência do ICMS.

No julgado em comento, o Superior Tribunal de Justiça teve a oportunidade de manifestar-se sobre o tema.

Um trecho merece destaque:

"Há de se qualificar a construção civil como atividade de pertinência exclusiva a serviços, pelo que "as pessoas (naturais ou jurídicas) que promoverem a sua execução sujeitar-se-ão exclusivamente à incidência de ISS, em razão de que quaisquer bens necessários a essa atividade (como máquinas, equipamentos, ativo fixo, materiais, peças, etc.) não devem ser tipificados como mercadorias sujeitas a tributo estadual" (José Eduardo Soares de Melo, in "Construção Civil - ISS ou ICMS?", in RDT 69, pg. 253, Malheiros). (Destaquei)

Veja que, dentro do contrato de empreitada global, também conhecido popularmente como contrato "turnkey", todas as "mercadorias" adquiridas pela construtora, para aplicação na obra, transmutam-se em material aplicado e, como consequência disto, sujeitam-se à incidência exclusiva do ISS.

Mais uma vez, repito, isto afasta a incidência do ICMS destas operações.

Para que não paire nenhuma dúvida acerca disto, é importante verificarmos como a legislação de regência trata do assunto. Primeiro a Lei do ISS e depois a do ICMS.

Confira:

"Lei Complementar nº 116/2003:

Art. 1º - O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador.

(...).

§ 2º Ressalvadas as exceções expressas na lista anexa, os serviços nela mencionados não ficam sujeitos ao Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias." (Destaquei).

A Lei do ISS é clara no sentido de que, nos serviços, incluindo portanto construção civil, não incide ICMS, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias. Este é o ponto.

Veja agora como a Lei do ICMS, conhecida como Lei Kandir, trata do mesmo assunto.

"Lei Complementar nº 87/1996

Art. 3º O imposto não incide sobre:

(...);

V - operações relativas a mercadorias que tenham sido ou que se destinem a ser utilizadas na prestação, pelo próprio autor da saída, de serviço de qualquer natureza definido em lei complementar como sujeito ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, ressalvadas as hipóteses previstas na mesma lei complementar;
(...)." (Destaquei).

Em absoluta sintonia, a Lei estabelece que não incide o ICMS sobre operações relativas a mercadorias que se destinem a ser utilizadas na prestação de serviços.

Perfeito!

Vimos que, tanto a jurisprudência do STJ, quanto a legislação de regência, estão em harmonia com o entendimento de que nos contratos "turnkey", ou "contratos chave na mão", todas as mercadorias adquiridas pela construtora, para aplicação exclusiva na obra, sujeitam-se à incidência do ISS.

Como exemplo, podemos citar os equipamentos, as ferramentas, os móveis, os utensílios, as máquinas, etc. Nesta modalidade, tudo isto compõe o objeto contratual cuja pertinência é exclusiva de "serviços de construção civil".

Deste modo, só podem ser tributados pelo imposto municipal sobre serviços.

É o objeto contratual, firmado entre as partes, que personificará toda a operação como uma obrigação de fazer.

 
José Antônio Patrocínio*