Decisoes.com.br - Jurisprudência Administrativa e Judiciária, Decisões de dezenas de Tribunais, STF, STJ, TRF, TIT, Conselhos de Contribuintes, etc.
Usuários
Lembrar usuário
Lembrar senha

Pesquisar em
Doutrina
Boletins
Todas as Áreas
Áreas Específicas
Tribunais e Órgãos abrangidos
Repercussão Geral (STF)
Recursos Repetitivos (STJ)
Súmulas (STF)
Súmulas (STJ)
Matérias Relevantes em Julgamento


Localizar nessa página:   
 

STJ decide acerca da limitação regulamentar da garantia ofertada pelo Fundo Garanti-dor de Crédito (FCG) aos Créditos Bancários (CDB) dos investidores coletivos em ins-tituições financeiras - Marcio Pedrosa Junior

Em decisão publicada no dia 2.2.2017, o Superior Tribunal de Justiça (\"STJ\") negou provimento a uma ação ajuizada por uma associação de previdência complementar, que pleiteava o recebimento, em face do Fundo Garantidor de Crédito (\"FGC\"), de indeniza-ção de investimentos em certificados de depósito bancários (\"CDB\"), realizados por meio de fundo de investimento gerido uma instituição financeira em liquidação extrajudicial.

No caso, a controvérsia devolvida ao conhecimento do STJ consistia em saber se o limite de valor da garantia ofertada pelo FGC, que era de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) por investidor, na forma do artigo 2º, parágrafo 3º, inciso VI, do Regulamento do FGC, aprovado pela Resolução nº 2.211, de 16.11.1995, do Conselho Monetário Nacional (\"CMN\"), deveria ser aplicado em relação à entidade de previdência complementar, no nome da qual os investimentos tinham sido realizados, ou, diferentemente, a todos os participantes do plano de previdência, individualmente considerados.

Ao apreciar o caso, rechaçando a pretensão autoral, o STJ reformou a decisão de piso, que havia condenado o FGC ao pagamento de indenização a cada um dos associa-dos do plano de previdência, até o limite garantido. Confira-se, abaixo, a ementa do acórdão, proferido pela 4ª Turma do STJ, em sede de agravo interno:

\"AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. ENTIDADE DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR. APLICAÇÃO FINANCEIRA. FALÊNCIA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. INEDNIZAÇÃO PELO FUNDO GARANTIDOR DE CRÉDITOS. LIMITE. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
1. A hipótese trata de ação de cobrança ajuizada por entidade de previdência complementar contra o Fundo Garantidor de Créditos para a cobrança do crédito garantido relativamente à contratação de depósitos bancários (CDBs) perante instituição financeira em processo judicial de falência (Banco Santos S/A), alegando que deve ser considerado o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) para cada um de seus associados.
2. O investimento efetuado pela entidade de previdência comple-mentar privada, em nome próprio, como único investidor, tem direito a apenas uma indenização até o limite previsto no artigo 2º, § 3º, IV, do Regulamento do Fundo Garantidor de Créditos, aprovado pelo Conselho Monetário Nacional, nos termos do disposto na Lei 4.494/64. Precedentes.
3. gravo interno a que se nega provimento.\"
(Agravo Interno no Recurso Especial n. 1.562.941/SP, Quarta Turma, Rel. Ministro Raul Araújo, J. 13.12.2016, DJe 2.2.2017);

Como cediço, o FGC é uma associação civil sem fins lucrativos, com personalidade jurídica de direito privado, destinada a administrar mecanismos de proteção a titulares de créditos contra instituições financeiras submetidas a intervenção, liquidação extrajudicial ou falência. A instituição do FGC foi autorizada pelo CMN, por intermédio da Resolução nº 2197, de 31.8.1995, e formalizada em novembro de 1995, conforme estatuto e regimento aprovados na Resolução nº 2.211, do CMN, de 16.11.1995.

O seguro de depósitos prestado pelo FGC é custeado por todas as instituições financeiras e associações de poupança e empréstimo responsáveis pelos créditos garantidos, tendo como objetivo a prevenção das crises bancárias, na tutela da segurança do sistema financeiro. Os seguros ofertados têm os seus valores limitados pela regulamentação oferecida pelo CMN, conforme os parágrafos 2º e 3º, do artigo 2º, do Regulamento do FGC, abaixo transcritos:

\"Parágrafo 2º - O total de créditos de cada pessoa contra a mesma instituição, ou contra todas as instituições do mesmo conglomerado financeiro, será garantido até o valor máximo de R$ 20.000,00 (vinte mil reais).
Parágrafo 3º - Para efeito da determinação do valor garantido dos créditos de cada pessoa, devem ser observados os seguintes crité-rios:
I- titular do crédito é aquele em cujo nome o crédito estiver registrado na escrituração da instituição ou aquele designado em título por ela emitido ou aceito;
II- devem ser somados os créditos de cada credor identificado pelo respectivo CPF/CGC contra todas as instituições do mesmo conglo-merado financeiro;
III- os créditos em nome de mandatário, representante legal ou gestor de negócios devem ser computados como pertencentes ao repre-sentado ou ao dono do negócio, desde que tal condição esteja do-cumentada na instituição;
IV- os cônjuges são considerados pessoas distintas, seja qual for o regime de bens do casamento;
V- créditos em nome de dependentes do beneficiário identificado na forma do inciso II devem ser computados separadamente.\"

Nos termos do dispositivo regulamentar, o total de créditos segurados de cada pessoa contra a mesma instituição financeira, ou contra todas as instituições financeiras do mesmo conglomerado financeiro, é garantido até o valor máximo de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). O limite é individual para a pessoa no nome da qual o crédito estiver registrado na escrituração da instituição ou para aquela designada em título por ela emitido ou aceito.

A razão para a limitação dos valores dos seguros dos depósitos, para além do controle do custo do crédito ofertado, reside na proteção do pequeno investidor, tendo em vista os incentivos comportamentais que seriam deferidos aos grandes investidores e às ins-tituições financeiras caso a garantia dos depósitos fosse ilimitada. Veja-se, nesse sentido, o excerto a seguir, retirado da manifestação apresentada no processo pelo Banco Central do Brasil (\"BACEN\"), na condição de assistente do FGC:

\"Por que prever limites para a garantia prestada pelo Fundo Garantidor de Créditos?
35. A garantia oferecida pelo seguro de depósitos é capaz de provocar mudanças na conduta dos segurados. É o que se denomina risco moral, que deve ser objeto de atenção por parte dos reguladores, sob pena de os regulados alterarem suas atitudes para obter benefícios com a proteção, prejudicando o seu funcionamento e impedindo a realização de suas finalidades.
36. No caso do seguro de depósitos, o risco criado pela garantia ordinária é de duas ordens distintas. Em primeiro lugar, dos depositantes, cientes da garantia, podem deixar de se preocupar com a postura do banco que contrataram. Não lhes importaria se a instituição financeira aplicasse os recursos que intermedeia de modo temerário, pois isso poderia implicar maiores retornos e, caso a tática não obtivesse sucesso, haveria a garantia oferecida pelo seguro de depósitos. Sem ter que se preocupar com a insatisfação de seus clientes em relação ao baixo rigor das condutas incorridas na intermediação financeira, os bancos teriam menos incentivos para adotar boas práticas de gestão.
(...).
38. A segunda ordem de risco moral gerado pelo seguro de depósito toca o comportamento dos grandes investidores. Caso a proteção aos seus depósitos seja integral, ou se aproxime disso, eles tem incentivos para, entre um banco que aplique recursos de modo responsável e que o proporcione ganhos próximos à média do mercado e outro que os invista de modo irresponsável, com grandes possibilidades de quebrar e alguma pequena chance de obter remuneração muito acima da média do mercado, optar pelo segundo. Por outras palavras, a grande margem de diferença entre instituições conservadoras ou irresponsáveis deixaria de importar aos depositantes.
(...).
41. Os reguladores buscam contornar essas questões por meio de institutos diversos. (...). Outros meios de neutralizar o risco moral são o estabelecimento de limites para a atuação do segurador de depósitos, assim aos valores da garantia ordinária como às pessoas e operações cobertas pelo Fundo Garantidor de Créditos, e o estabelecimento de um sistema de alíquotas de contribuição ajustado ao risco de cada instituição.
42. O terceiro motivo para a limitação da proteção oferecida pelo Fundo Garantidor de Créditos está na preocupação com o custo do crédito ofertado pelas instituições financeiras aos seus clientes, produtores e consumidores nacionais. É que a garantia ordinária é custeada por contribuições compulsórias pagas pelas instituições financeiras ao FGC. Como, para que seu negócio seja viável, as instituições financeiras precisam cobrar dos tomadores de crédito taxas maiores do que a soma do custo para captação de recursos com os custos decorrentes de sua operação, pode-se dizer que a contribuição para o FDC é um dos fatores que determina o preço final do crédito ofertado aos tomadores.\"

Dessarte, a garantia de valores de vulto aplicados por investidores qualificados - como é o caso das associações de previdência complementar -, poderia prejudicar a finalidade para a qual o FGC foi constituído, incentivando investimentos arrojados e arriscados, em detrimento das instituições financeiras que efetuam aplicações responsáveis, e dos pequenos investidores, que têm condições limitadas de avaliação de risco e reduzido poder de barganha. Além disso, uma garantia ilimitada importaria em aumento nos custos do crédito, com prejuízo à produtividade da economia e ao poder de compra dos consumidores.

No caso concreto, o investimento fora realizado pela entidade de previdência privada em nome próprio, como único investidor, daí decorrendo, segundo a defesa do FGC, o direito a uma única indenização, até o limite previsto nas normas regulamentadoras, independentemente do número de seus associados.

Por outro lado, segundo o entendimento defendido pela entidade de previdência e acolhido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (\"TJSP\"), a previdência complementar não seria uma entidade singular, mas uma coletividade, administrada em proveito de todos os seus associados. Nesse sentido, e em que pese o investimento ter sido realizado em nome da entidade, os verdadeiros titulares dos créditos perante as instituições financeiras seriam os próprios associados, cada um fazendo jus, autonomamente, ao recebimento da garantia prestada pelo FGC.

Em sede de recurso especial, a 4ª Turma do STJ decidiu por reformar a decisão recorrida, assentando o entendimento de que o investimento efetuado pela entidade de previdência complementar privada, em nome próprio, como único investidor, tem direito a apenas uma indenização. A decisão afiançou-se não apenas na literalidade do artigo 2º, parágrafo 3º, inciso IV, do Regulamento do FGC, mas também na necessidade de tutela da função social do fundo, consistente na proteção do pequeno investidor, \"para estimular e garantir a participação do cidadão comum no mercado financeiro\". A decisão foi confirmada após o julgamento do agravo interno da entidade de previdência, que reclamava o não conhecimento do recurso especial do FGC.

 
Elaborado por:
Marcio Pedrosa Junior. Advogado especialista em Direito Tributário pela Faculdade Milton Campos. Advogado.
E-mail: mpj@marizsiqueira.com.br