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Tributação de lucros no exterior: CARF se manifesta sobre a consolidação de resultados e sobre formalidades necessárias para compensação de prejuízos de controladas no exterior.
Bruno Fajersztajn*
Paulo Coviello Filho*

Artigo - Federal - 2017/3564

Foi disponibilizado recentemente o acórdão n. 1302-001.974, de 13.9.2016, no qual a 2ª Turma Ordinária da 3ª Câmara da 1ª Seção do CARF rechaçou a pretensão das autoridades fiscais de tributar diretamente os lucros auferidos por controlada indireta sediada no exterior, bem como considerou necessária a transcrição das demonstrações financeiras da controlada no exterior no Livro Diário da controladora no Brasil para permitir a compensação de prejuízos apurados no exterior pela controlada.

Primeiramente, no que se refere à necessidade de consolidação de resultados, o fisco pretendia exigir, com fulcro no art. 74 da Medida Provisória n. 2158-35, de 24.8.2001, o IRPJ e a CSL decorrentes da ausência de adição dos lucros auferidos por controladas indiretas da empresa sediada no Brasil. Segundo informações contidas no acórdão, a pretensão fiscal estava suportada por uma construção interpretativa do art. 74 da MP n. 2158-35 e do parágrafo 2º do art. 243 da Lei n. 6404 [1], segundo a qual os lucros das controladas indiretas devem ser adicionados ao lucro real e à base de cálculo da CSL diretamente, sem a consolidação prévia prevista no parágrafo 6º do art. 1º da IN SRF n. 213/02, haja vista que o parágrafo 2º do art. 243 da Lei n. 64041 não distinguiria as controladas diretas das indiretas.

Ainda conforme informações do acórdão, após apresentação de impugnação pela empresa autuada, a Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento em São Paulo (DRJ/SP1), por meio do acórdão n. 16-56.535, de 27.3.2014, julgou a impugnação parcialmente procedente para afastar esse item da autuação, reconhecendo inexistir suporte legal que autorize a tributação direta dos resultados das controladas indiretas.

Especificamente quanto a essa matéria, houve recurso de ofício, sendo que a 2ª Turma Ordinária da 3ª Câmara da 1ª Seção do CARF, por unanimidade de votos, manteve a decisão da DRJ, negando provimento ao recurso obrigatório. Confira-se a ementa da decisão:

"TRIBUTAÇÃO. LUCROS AUFERIDOS NO EXTERIOR. PESSOA JURÍDICA DOMICILIADA NO PAÍS. IN SRF n. 213/200, ART. 1º, § 6º.
A tributação dos lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior pelas pessoas jurídicas domiciliadas no País encontrava-se, à época da ocorrência destes fatos, regulamentada pela IN SRF n. 213/2002. Nestes termos, para fins de determinação do valor do lucro auferido por controladas indiretas, domiciliadas no exterior, a ser computado na base de cálculo do IRPJ e da CSLL da pessoa jurídica brasileira, é necessário realizar uma prévia consolidação daqueles resultados no balanço da controlada direta estrangeira. Somente após, o resultado auferido pela controlada direta será adicionado computado ao lucro líquido da controladora brasileira."
Em suma, por unanimidade de votos, a decisão reconheceu que a pretensão fiscal, no sentido de tributar diretamente os resultados de controladas indiretas, contraria o parágrafo 6º do art. 1º da IN SRF n. 213/02. De fato, o referido dispositivo não deixa qualquer dúvida: "Os resultados auferidos por intermédio de outra pessoa jurídica, na qual a filial, sucursal, controlada ou coligada, no exterior, mantenha qualquer tipo de participação societária, ainda que indiretamente, serão consolidados no balanço da filial, sucursal, controlada ou coligada para efeito de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL da beneficiária no Brasil."

Em outras palavras, a IN SRF n. 213/02 determina que o resultado da controlada indireta seja consolidado no balanço da controlada direta para fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSL devidos pela controladora. O ato normativo regulamentar determina o que se convencionou denominar consolidação vertical dos resultados auferidos por controladas indiretas, no balanço da filial, sucursal, controlada ou coligada direta da pessoa jurídica brasileira.

Destarte, o método a ser utilizado para efetuar a tributação dos lucros auferidos por pessoas jurídicas nas quais a pessoa jurídica brasileira tenha participação indireta é a consolidação vertical, nos termos do art. 1º, parágrafo 6º, da IN SRF n. 213/02.

A decisão do CARF é correta, visto que não há base legal para que os lucros das controladas indiretas sejam adicionados diretamente (per saltum) ao lucro real e à base de cálculo da CSL da pessoa jurídica brasileira. Vale dizer, a pessoa jurídica brasileira não está obrigada a reconhecer diretamente a sua participação nos lucros da controlada indireta, tampouco autorizada a aplicar o MEP para reconhecer a sua participação sobre as contas do patrimônio líquido das controladas indiretas.

Justamente por isso, é mandatória a norma contida no parágrafo 6º do art. 1º da IN SRF n. 213/02, que estabelece que seja feita a consolidação dos resultados das controladas indiretas na controlada direta (consolidação vertical), para fins de apuração do lucro real e da base de cálculo da CSL.

Vale ressaltar que a decisão em comento não é novidade, eis que há diversos precedentes nesse sentido tanto na 1ª instância administrativa, quanto no CARF. Como exemplo, destacamos os acórdãos n. 16-38907, de 16.5.2012, da 1ª Turma da DRJ/SPO, n. 1302-001.947, de 9.8.2016, do CARF, n. 1101-000.811, de 2.10.2012, do CARF, e n. 1401-000.832, de 8.8.2012, do CARF.

Portanto, não restam dúvidas de que, para fins de tributação dos lucros auferidos pelas controladas indiretas no Brasil, esses resultados devem ser consolidados no balanço da controlada direta, nos exatos moldes do que dispõe o parágrafo 6º do art. 1º da IN SRF n. 213/02.

Somente com a edição do art. 77 da Lei n. 12973, de 13.5.2014, é que a tributação das controladas indiretas passou a ser admitida, sendo que tal tributação, a todo rigor, também pode ser considerada questionável, dada a ausência de disponibilidade jurídica ou econômica de renda em tais situações [2].

Ao pretender tributar as controladas indiretas sem a consolidação prevista na IN SRF n. 213/02, a fiscalização acaba por aplicar retroativamente a Lei n. 12973, o que não parece ter qualquer fundamento. Por fim, é importante destacar que há decisões em sentido diverso, admitindo a tributação direta dos lucros da controlada indireta [3], de modo que esse assunto deverá ser objeto, em breve, de análise pela 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais.

Relativamente à compensação de prejuízos acumulados de controlada no exterior, segundo consta do referido acórdão, determinada pessoa jurídica sediada no exterior possuía prejuízos acumulados, suficientes para consumir integralmente o lucro apurado em período subsequente, o que acarretava a inexistência de qualquer saldo a ser oferecido à tributação pela sua controladora no Brasil. Ainda em primeira instância, o processo foi convertido em diligência, para que fosse confirmado o cumprimento dos requisitos legais que autorizam a pretendida compensação.

Após a realização da diligência, a decisão de 1ª instância indeferiu a aludida compensação, tendo em vista que o contribuinte não teria apresentado as folhas do Livro Diário [4] em que teria transcrito as demonstrações financeiras da controlada no exterior, conforme estabelece o art. 6º, parágrafo 6º, da IN SRF n. 213/02. Segundo a decisão da DRJ/SP1, "A transcrição ou cópia de demonstrações financeiras de controladas ou coligadas domiciliadas no exterior, em moeda e classificação contábil nacional, em livro Diário de pessoa jurídica no Brasil, constitui requisito essencial para que prejuízos contábeis apurados por cada uma daquelas sejam compensados com seus próprios lucros." O acórdão n. 1302-001.974 ratificou o posicionamento da DRJ/SP1, consignando que é mandatória a transcrição das demonstrações financeiras da controlada no exterior no Livro Diário da controladora no Brasil [5].

A despeito do acerto da decisão no que se refere à questão da consolidação comentada acima, é discutível o entendimento que prevaleceu com relação à compensação de prejuízos da controlada no exterior.

A exigência de transcrição das demonstrações financeiras no Livro Diário como condição para autorizar a compensação de prejuízos da controlada, a despeito de estar prevista em atos regulamentares emitidos pelo fisco, representa apego excessivo ao formalismo, o qual poderia ter sido flexibilizado, em prestígio à verdade material. Não se nega a necessidade de que os prejuízos estejam lastreados em documentação hábil e idônea, a fim de que os valores utilizados possam ser validados pelas autoridades fiscais. Mas a simples falta de transcrição dos balanços no Livro Diário não pode por si só ser suficiente para a glosa da dedução dos prejuízos no exterior. Vale destacar que a jurisprudência já se manifestou inúmeras vezes no sentido de que a falta de transcrição de balanços de suspensão e redução no mesmo Livro Diário, para efeito de pagamento de antecipações mensais do imposto de renda, é irregularidade formal que não justifica a exigência de multa isolada pela falta de recolhimento das antecipações [6]. Embora no caso das controladas os balanços sejam levantados no exterior, essa peculiaridade não justifica que a transcrição no Diário seja considerada determinante para fins de reconhecimento do direito à compensação. Nesse tipo de situação, devem ser admitidos outros elementos de prova, ainda que não tenha sido cumprida a formalidade relativa à transcrição no Livro Diário, inclusive para prestigiar o princípio da verdade material, que rege o processo administrativo tributário.

A despeito de questionável o entendimento do CARF em relação à questão dos prejuízos, a decisão sugere cautela, revelando que o referido tribunal tem sido mais rígido em relação ao cumprimento de formalidades.

Notas

[1] "Art. 243. O relatório anual da administração deve relacionar os investimentos da companhia em sociedades coligadas e controladas e mencionar as modificações ocorridas durante o exercício.
(...)
§ 2º Considera-se controlada a sociedade na qual a controladora, diretamente ou através de outras controladas, é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores."

[2] Sobre o assunto, confira-se: OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. FAJERSZTAJN, Bruno. SILVA, Fabiana Carsoni Fernandes da. SANTOS, Ramon Tomazela. In: Aspectos Polêmicos do Imposto de Renda e Proventos de Qualquer Natureza. MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Porto Alegre: Editora Magister, 2014, p. 175 e seguintes.

[3] Destaque-se, por exemplo, os acórdãos n. 1402-002.338, de 5.10.2016, e 101-97.070, de 17.12.2008.

[4] Pelo que consta da decisão, o contribuinte teria juntado apenas cópias do Livro Razão, com as informações solicitadas.

[5] No mesmo sentido, destaque-se o também recente acórdão n. 1301-002.115, de 10.8.2016, no qual restou consignado que "a prova dos prejuízos deve ser feita segundo a disciplina do art. 6º da IN 213/2002, anteriormente transcrito. Isso implica, em síntese, a existência e apresentação de demonstrações financeiras do ano de 2007 para cada sucursal, sua versão para o idioma e moeda nacionais e, finalmente, a transcrição destas últimas no livro Diário da pessoa jurídica no Brasil".

[6] Súmula CARF n. 93: A falta de transcrição dos balanços ou balancetes de suspensão ou redução no Livro Diário não justifica a cobrança da multa isolada prevista no art. 44 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, quando o sujeito passivo apresenta escrituração contábil e fiscal suficiente para comprovar a suspensão ou redução da estimativa.