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Superior Tribunal de Justiça reconhece que a Lei de Propriedade Industrial não exige comprovação de prejuízos sofridos ou dolo do agente para reparação pelos danos
Paulo Coviello Filho

No último dia 10.11.2016, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu que a Lei n. 9279, de 14.5.1996 (Lei de Propriedade Industrial), não requer a comprovação da conduta dolosa do agente, tampouco da existência do dano, para determinar a indenização por parte do agente. Confira-se a ementa da decisão em comento:

"RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE ABSTENÇÃO DE USO DE MARCA, REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. PROPRIEDADE INTELECTUAL. MARCA. INSULFILM. VIOLAÇÃO. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 282/STF. DANO PATRIMONIAL. PRESUNÇÃO. APURAÇÃO DO MONTANTE DEVIDO EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA.
1- Ação distribuída em 10/6/2008. Recurso especial interposto em 22/5/2014 e concluso à Relatora em 10/10/2016.
2- Controvérsia que se cinge em definir se a pretensão de reparação por danos patrimoniais decorrentes de violação a direito de propriedade industrial impõe à vítima que comprove o dolo de quem praticou o ato e os prejuízos sofridos.
3- A ausência de decisão acerca dos dispositivos legais indicados como violados impede o conhecimento do recurso especial.
4- O dano patrimonial causado ao titular de direito de marca configura-se com a violação dos interesses tutelados pela Lei de Propriedade Industrial, sendo despicienda a comprovação da intenção do agente em prejudicar a vítima ou do prejuízo causado, devendo o montante ser apurado em liquidação de sentença.
5- Recurso especial provido."
(REsp 1635556/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/11/2016, DJe 14/11/2016)

No caso, uma empresa fabricante de película plástica escura para vidros de automóveis (autora) ajuizou ação de abstenção de uso de marca, reparação por danos patrimoniais e compensação por danos morais, em face de concessionária de veículos (ré) que se utilizou de marca de propriedade da autora de forma não atualizada em peças publicitárias e anúncios veiculados pela mídia.

Na primeira instância o juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedente a ação ajuizada, determinando a suspensão da utilização indevida da marca, bem como o pagamento de indenização por danos morais. Provocado a se manifestar, o Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a decisão quanto à suspensão da utilização da marca e o pagamento de danos morais, tendo mantido a improcedência relativa à condenação em danos materiais, por entender que existem "inúmeras outras fornecedoras de películas de poliéster".

A autora da ação, fabricante da película, recorreu ao STJ, alegando que a Lei de Propriedade Industrial garante a reparação de danos materiais independentemente da intenção da concessionária em prejudicá-la. Alegou ainda que, segundo a Lei de Propriedade Industrial, em caso de uso indevido de marca, o dano material é presumido.

Diante dessa controvérsia a Terceira Turma, sob Relatoria da Ministra Nancy Andrighi e por unanimidade, deu provimento ao recurso especial da autora para determinar a condenação em danos materiais a ser apurada em fase de liquidação de sentença. Inicialmente, a decisão frisou que o Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu que a ré "se beneficiou da campanha publicitária (...), promovida pela montadora com o concurso das concessionárias", bem como destacou a ampla divulgação dada pela mídia ao evento no qual foi utilizada a marca da autora.

Nesse contexto, a decisão afirmou que ser incontestável que a marca de propriedade da autora foi utilizada de forma indevida, com o único objetivo de majorar as vendas de veículos da ré, sem, contudo, o necessário consentimento da autora, proprietária da marca utilizada indevidamente.

Ademais, destacou que, apesar de os anúncios publicitários fazerem menção expressa à marca de propriedade da autora, a qual é de conhecimento público e notório, restou comprovado nos autos que as películas de plástico aplicadas nos automóveis comercializados pela ré não eram aquelas fabricadas pela autora, fato capaz de confundir o consumidor e que pode resultar, consequentemente, na vulgarização da marca da autora. Especificamente sobre o assunto, destacou entendimento consolidado no julgamento do REsp 1.032.014/RS (DJe 4/6/2009), quando a mesma Terceira Turma do STJ decidiu que "na contrafação o consumidor é enganado e vê subtraída, de forma ardil, sua faculdade de escolha. O consumidor não consegue perceber quem lhe fornece o produto e, como consequência, também o fabricante não pode ser identificado por boa parte do seu público alvo".

Finalmente, concluiu que a Lei de Propriedade Industrial, quando trata especificamente da reparação de danos causados pela violação dos direitos por ela protegidos, não requer, para fins indenizatórios, que seja comprovada a existência de prejuízos pelo prejudicado, ou mesmo que se comprove o dolo do agente. Novamente destacou que a própria Terceira Turma, no julgamento do REsp 1.372.136/SP (DJe 21/11/2013), consignou entendimento no sentido de que "o art. 209 da Lei 9.279/96 autoriza a reparação do dano material decorrente do ato de violação do direito de propriedade industrial, não condicionando essa reparação à efetiva demonstração do prejuízo pelo titular do referido direito, até porque, na grande maioria dos casos em que há violação do direito marcário, essa prova é dificílima de ser feita".

O entendimento do STJ está em linha com a jurisprudência majoritária daquela Corte no sentido de que para comprovação do dano, basta que se comprove a utilização indevida da marca, sendo despicienda a efetiva comprovação do dano monetário ou à imagem, até porque, conforme bem destacado pela decisão, tal comprovação é muito difícil na prática. Nesse sentido, confira-se outra recente decisão no mesmo sentido:

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. USO INDEVIDO DE MARCA. COLIDÊNCIA RECONHECIDA. SETEX E SEDEX. SEMELHANÇA GRÁFICA E FONÉTICA. SERVIÇOS. MESMO SEGMENTO MERCADOLÓGICO.
IMPOSSIBILIDADE DE COEXISTÊNCIA ENTRE AS MARCAS. CONFUSÃO AO CONSUMIDOR. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. COMPROVAÇÃO. APURAÇÃO EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE.
SÚMULA Nº 7/STJ. SÚMULA 83/STJ.
1. Consoante a jurisprudência desta Corte, em se tratando de direito de marcas, o dano material pode ser presumido, pois a violação desse direito é inequivocamente capaz de gerar severas lesões à atividade empresarial do legítimo titular da marca, tais como, por exemplo, o desvio de clientela e a confusão entre as empresas.
2. As conclusões da Corte de origem - no sentido de (i) ser indevida a utilização pela demandada da marca SETEX, (ii) ser impossível a coexistência da referida marca com a marca SEDEX (de titularidade da autora, a ECT) e (iii) ser necessária a apuração do montante indenizatório devido em liquidação de sentença - resultaram do exame do acervo fático-probatório carreado nos autos e, por isso, inviável se torna modificá-las, nesta via especial, dada a inafastável incidência da Súmula nº 7/STJ.
3. Estando o acórdão recorrido em consonância com a jurisprudência pacífica desta Corte, tem incidência a Súmula nº 83/STJ.
4. Agravo regimental não provido." (destaques aqui opostos)
(AgRg no REsp 1536128/CE, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/03/2016, DJe 31/03/2016)

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. MARCA. EXCLUSIVIDADE. USO INDEVIDO. CLÍNICA ODONTOLÓGICA. MESMO SEGMENTO PROFISSIONAL.
CONFUSÃO. INDENIZAÇÃO. DANO MATERIAL PRESUMIDO. POSSIBILIDADE.
1. As instâncias ordinárias, à luz dos elementos fático-probatórios coligidos aos autos, entenderam que houve usurpação do direito da marca pertencente à ora agravada. Impossibilidade de revisão.
Súmula nº 7/STJ.
2. A jurisprudência desta Corte admite a presunção do dano material decorrente de violação do direito de marca. Inteligência do artigo 129 da Lei nº 9.279/1996.
3. Agravo regimental não provido." (destaques aqui opostos)
(AgRg no REsp 1281710/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/10/2014, DJe 21/10/2014)

Portanto, parece estar consolidado o entendimento no âmbito daquela Corte Superior no sentido de que, nas violações a direito de propriedade industrial, o dano material se presume, tendo em vista que situações como essa, que se assemelham à contrafação, geram confusão nos consumidores, que acreditam estar adquirindo produto da marca A, quando, na verdade, estão adquirindo produto da marca B. A importância desse entendimento está na consolidação da proteção à propriedade industrial no país, proteção essa que depende de uma atuação firme e contundente do Poder Judiciário na coibição de condutas ilícitas.

 
Elaborado por:
Paulo Coviello Filho
Advogado, graduado em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e graduando em Ciências Contábeis pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Email: pcf@marizsiqueira.com.br