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Reforma do ISS - Obrigatoriedade de lei municipal e observância dos princípios constitucionais
José Antônio Patrocínio*

Artigo - Federal - 2017/3553

Ementa: PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE NONAGESIMAL - Lei que só passou a produzir efeitos a partir de janeiro de 2004 - Observância do princípio - Necessidade: - Tratando-se de lei que só passou a produzir efeitos a partir de janeiro de 2004, é de rigor a observância do princípio da anterioridade nonagesimal instituído pela EC 42/2003. RECURSO NÃO PROVIDO. (Tribunal de Justiça de São Paulo - Apelação nº 0151822- 66.2005.8.26.0000)

No ano em que completou treze anos de vigência, absolutamente incólume, eis que a Lei Complementar nº 116/2003, conhecida popularmente como Lei do ISS, recebe os seus primeiros retoques, objetivando, sobretudo, minimizar os impactos da famigerada "guerra fiscal", além, é claro, de incluir novas atividades da lista de incidência do imposto municipal.

Na verdade, o pano de fundo desta reforma legislativa, é o incremento da arrecadação dos Municípios, decorrente da cobrança de ISS daquelas operações que, até então, não eram tributadas pelas Prefeituras. E o fisco municipal tem pressa nisto!

Mas, a partir de quando começa a cobrança de ISS em relação aos novos serviços incluídos na lista? Cada uma das Prefeituras precisa editar uma nova Lei Municipal, nos moldes da Lei Complementar nº 157/2016? Isto é obrigatório?

É na Constituição Federal que encontraremos a solução adequada para cada um destes quesitos!

Antes disto, vale lembrar que o projeto que culminou com a edição da Lei Complementar nº 157/2016 tramitou por longos 4 anos no Senado Federal e Câmara dos Deputados, até que, no dia 30 de Dezembro de 2016, finalmente virou Lei, com os necessários atos de sanção e veto parcial, promulgação e publicação no Diário Oficial da União.

Neste contexto, com relação aos novos serviços incluídos na lista, a Lei Complementar nº 157/2016 entrou em vigor na data de sua publicação, ou seja, no dia 30 de dezembro de 2016.

Dito isto, vamos então tratar, por primeiro, da questão da obrigatoriedade da Lei Municipal.

Segundo a melhor doutrina e a mais abalizada jurisprudência, cada um dos 5.570 municípios brasileiros, observados os contornos constitucionais e as Leis Complementares de regência, são obrigados a editar leis ordinárias municipais para a efetiva instituição do ISS em seus territórios.

A respeito da necessidade de edição de Lei Municipal vejamos o que nos ensina Bernardo Ribeiro de Moraes:

"A Constituição não cria tributos, mas apenas distribui competências tributárias. A Lei Complementar, encarregada de definir os serviços tributáveis pelo ISS, também não cria tributos, mas apenas cumpre a missão que a Magna Carta lhe reservou. Somente a lei ordinária, baixada pelo poder competente, é que poderá decretar o ISS."
(...).
"A legislação ordinária municipal deve adaptar-se às leis complementares. Os serviços alcançados pelo ISS, são os serviços previstos na lista de serviços baixada pelo legislador ordinário municipal, desde que obediente ou não conflitante com a lei complementar. "

No mesmo sentido, também o Professor Sérgio Pinto Martins:

"Uma vez editada a lei complementar definidora de serviços, o Município poderá criar o respectivo imposto, por intermédio de lei ordinária, devendo respeitar a lista de serviços constante da lei complementar. O ISS será criado pelo Município, no uso de sua competência tributária"

Em outras palavras, podemos dizer que só nasce a obrigação de pagar o ISS, em relação aos novos serviços incluídos na lista, com a efetiva edição da lei ordinária municipal. Enquanto a Lei Municipal não for editada e, por conseguinte, não produzir os seus efeitos, o fisco municipal está impedido de cobrar ISS destas operações.

Importa mencionar também que pouquíssimos municípios conseguiram publicar a nova lei municipal no ano de 2016, em razão do exíguo prazo para isto. Um dos que alcançaram esta proeza foi o Município de Porto Alegre - RS, que, com uma agilidade impressionante, publicou a lei ordinária municipal em uma edição extra de seu diário oficial.

Pois bem, definida assim a questão da obrigatoriedade da lei municipal, resta-nos tratar dos princípios constitucionais que interferem diretamente na eficácia das leis tributárias, tanto da Lei Complementar nº 157/2016, quanto das leis municipais.

Vamos a eles:

Dentre os inúmeros princípios constitucionais do direito tributário vigentes na Carta Cidadã de 1988, destacamos, neste estudo, aqueles que irão determinar o momento a partir do qual as Prefeituras poderão começar a cobrar ISS em relação aos novos serviços incluídos na lista pela Lei Complementar nº 157/2016.

Para que possamos analisá-los, um a um, vamos primeiramente verificar como eles aparecem na mencionada Constituição Federal.

"Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...);
III - cobrar tributos:
a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;
c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b; (alínea incluída pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003).
(...)."

Veja que cada uma das alíneas do inciso III do artigo 150 traz uma regra específica, com "status" de princípio constitucional, que deve ser obrigatoriamente observada pelo intérprete na hora de aplicar a lei ao caso concreto.

Antes porém de tratarmos de cada um deles, é preciso repetir a informação de que a Lei Complementar nº 157/2016 está em vigor desde a data de sua publicação, ou seja, desde 30 de Dezembro de 2016. Em relação a isto, o não há absolutamente nenhuma dúvida. O que analisaremos a seguir é o momento a partir do qual a lei produzirá os seus efeitos. Estamos falando então de dois institutos bem distintos:

Vigência e eficácia.
Apenas um pequeno trecho dos ensinamentos do Professor Carlos Alberto M.S.M. Violante, em sua obra "Lei de Introdução ao Código Civil", é o suficiente para fixarmos bem a distinção entre eles:
"Vigência e eficácia são expressões distintas. Lei vigente é aquela que integra o ordenamento jurídico, por ter atendido regularmente todas as etapas do processo de elaboração da lei; lei eficaz é aquela que efetivamente produz os efeitos nela previstos."

Por conta disto, podemos afirmar com toda segurança que a Lei Complementar nº 156/2016 está em vigor, mas não está produzindo ainda os seus efeitos no mundo jurídico.

E quando isto irá acontecer? É o que trataremos a seguir.

Como dissemos anteriormente, a eficácia da lei tributária está adstrita aos princípios insculpidos no artigo 150, Inciso III, alíneas "a", "b" e "c" da Constituição Federal. Vamos ver então como cada um deles deve ser aplicado.

I - Princípio da irretroatividade da lei

Este princípio constitucional impede que o fisco municipal aplique as disposições da nova lei à fatos geradores ocorridos antes do início de sua vigência. Vale reprisar o dispositivo constitucional:

"Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...);
III - cobrar tributos:
a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;
(...).

Na prática, isto significa que as Prefeituras não podem cobrar ISS dos novos serviços incluídos na lista pela Lei Complementar nº 157/2016, em relação aos fatos geradores ocorridos antes do dia 30 de Dezembro de 2016.

É este princípio constitucional que impede a retroatividade dos efeitos da nova Lei.

Vamos ao próximo!

II - Princípio da anterioridade do exercício

Este princípio é um "velho" conhecido nosso!

Uma nova lei tributária precisa ser publicada em um ano, para surtir os seus efeitos no ano seguinte. Vamos conferir:

'"Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...);
III - cobrar tributos:
(...);
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;
(...)."

Veja que a base para a aplicação do princípio é a data da publicação da nova Lei.

Então, no nosso caso, como a Lei Complementar nº 157/2016 foi publicada no dia 30 de Dezembro de 2016, ela passaria, em tese, a surtir os seus efeitos a partir do dia 1º de janeiro de 2017. Entretanto, o próximo e último princípio constitucional, ao ser aplicado, irá postergar esta eficácia para um momento posterior.

Vamos conferir:

III - Princípio da antecedência mínima (noventena)

Este princípio não constava do texto original da Constituição Federal outorgada em 1988. Ele foi inserido por meio da Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003.

Eis o dispositivo:

"Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...);
III - cobrar tributos:
(....);
c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b;
(...)."

O legislador fez questão de mencionar que na aplicação deste princípio constitucional, deve ser observado o disposto na alínea "b", ou seja, a aplicação deste "princípio da antecedência mínima" deve ocorrer conjuntamente com o "princípio da anterioridade".

Esclarecemos, por oportuno, que o princípio da antecedência mínima (noventena), também é conhecido no mundo jurídico como princípio da anterioridade nonagesimal.

Muito bem, vamos aplica-lo então ao caso concreto.

A Lei Complementar nº 157/2016 foi publicado no dia 30 de Dezembro de 2016, uma sexta-feira. Em vista disto, a contagem dos noventa dias iniciar-se-á no dia 02 de Janeiro de 2017, uma segunda-feira. Por conseguinte, observando-se os noventa dias fixados pela Constituição, a referida Lei Complementar surtirá os seus efeitos a partir do dia 03 de Abril de 2017, uma segunda-feira.

Em resumo temos:

Lei Complementar nº 157/2016 vigorando desde o dia 30 de dezembro de 2016, mas com eficácia postergada para o dia 03 de abril de 2017.

Este é o resultado final da aplicação dos princípios constitucionais.

Mas, e a Lei Municipal, como fica? Não dissemos que a obrigação de pagar ISS só nasce com a publicação da Lei Municipal?

Isto é verdade! Realmente a obrigação de recolher ISS, em relação aos novos serviços, só nasce com a publicação da Lei Municipal, por cada um dos 5.570 municípios brasileiros.

Ocorre que uma vez publicada a Lei Municipal, ela também fica sujeita aos três princípios constitucionais que vimos. A aplicação dos princípios em relação a data da publicação da lei municipal é exatamente a mesma que fizemos em relação à Lei Complementar.

Isto nos leva a concluir, portanto, que se o Município não publicou a sua lei municipal até o dia 31 de dezembro de 2016, terá que fazê-lo neste ano de 2017. Com isto, só poderá começar a cobrar o ISS, em relação aos novos serviços, a partir de 1º de janeiro de 2018.

Por fim, vale esclarecer que o julgado destacado, do Tribunal de Justiça de São Paulo, é um bom exemplo da aplicação prática de um dos princípios constitucionais que analisamos, qual seja, o princípio da anterioridade nonagesimal.

Naquele caso, como o fisco municipal paulistano negou-se a aplicá-lo e respeitá-lo, o contribuinte recorreu ao poder judiciário que, acertadamente, impôs a sua observância.

 
José Antônio Patrocínio*
Advogado, Contabilista, Consultor Tributário da Thomson Reuters FISCOSoft e Professor de ISSQN no MBA Gestão Tributária na FIPECAFI/USP.
Email: patrocinio2007@terra.com.br