ICMS: estoque final no encerramento da atividade não configura fato gerador do imposto Rafael Santiago Araujo*
Artigo - Estadual - 2016/0505
O Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS, é tributo previsto no artigo 155, II, da Constituição Federal de 1988, que através deste comando normativo conferiu aos Estados e ao Distrito Federal a competência para legislar sobre o referido gravame.
Assim, tendo sido estabelecido o arcabouço do ICMS através da legislação federal, aos Estados compete legislar concorrentemente sobre o imposto em questão, nos moldes do artigo 24 da Lei Maior, isto é, em observância aos parâmetros gerais já delineados pela União.
Em linhas gerais, como cediço, o fato gerador do ICMS é a circulação de mercadorias, no momento da sua saída do estabelecimento do contribuinte, consoante à dicção do artigo 2º de sua lei de regência (LC nº 87/96).
Todavia, adentrando especificamente ao tema ora proposto, tem-se observado em algumas legislações estaduais a tentativa subversiva de se equiparar à circulação de mercadorias a mercadoria constante do estoque final no momento do encerramento das atividades do contribuinte.
Ocorre que, em que pese a legislação do ICMS ser de competência estadual, esta, como já frisado, deve observar as normas gerais estabelecidas para o imposto em comento, não podendo, inclusive, inovar quanto à sua regra matriz, isto é, in casu, ao seu critério material.
Isso porque, na esteira do artigo 146, III, "a", da Constituição da República, cabe à lei complementar, no tocante aos impostos discriminados na Constituição, definir os respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes.
Aliás, é consabido que o fato gerador do ICMS fora definido pela Lei Complementar nº 87/96, não podendo ser modificado ou revisto por norma inferior, qual seja, os respectivos decretos estaduais, sob pena de grave afronta o princípio da reserva legal.
Portanto, indubitável que a Lei Estadual não poderia estabelecer ou modificar critério material de incidência para o ICMS diferente daquele já delimitado pela Lei Complementar nº 87/96, o que, por conseguinte, tampouco seria possível à mera disposição regulamentar.
Por fim, cumpre-nos trazer à baila o posicionamento jurisprudencial da referida discussão perante a Suprema Corte.
Felizmente, houve recentemente entendimento do Supremo Tribunal Federal favorável ao contribuinte, estabelecendo assim a segurança jurídica das relações, ao firmar o seu compromisso de guardião da Constituição, pregando o respeito às normas gerais em matéria de direito tributário.
A questão foi levada ao Supremo através de um Agravo Regimental em Recurso Extraordinário nº 763.332, sob a relatoria do Ministro Roberto Barroso, cuja ementa merece transcrição:
"(...) AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ICMS. DECRETO ESTADUAL QUE RELACIONA O FATO IMPONÍVEL AO ESTOQUE FINAL. AFRONTA À RESERVA DE LEI COMPLEMENTAR. O Estado do Ceará estabeleceu, por intermédio de ato infralegal, hipótese de incidência do ICMS diversa daquela prevista na Lei Complementar nº 87/1996. Ao assim proceder, a Administração tributária local violou a reserva de lei complementar para dispor sobre a materialidade do imposto. Agravo regimental a que se nega provimento (...)."
(STF - ARE: 763332 CE, Relator: Min. ROBERTO BARROSO, Data de Julgamento: 19/08/2014, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-170 DIVULG 02-09-2014 PUBLIC 03-09-2014)
Destarte, não restam dúvidas de que as legislações estaduais que estipulam tal critério material para o ICMS aviltam a reserva de lei complementar instituída pelo poder constituinte originário para tratar do tema, devendo os contribuintes que se sentirem lesados, socorrerem-se da medida judicial cabível.
Rafael Santiago Araujo* Advogado Associado no escritório Tubino Veloso, Vitale, Bicalho & Dias Advogados. Bacharel em Direito pela Universidade Cruzeiro do Sul. Master of Laws (LL.M.) em Direito Tributário pelo INSPER - Instituto de Ensino e Pesquisa. Articulista em sites e revistas de direito tributário. E-mail: rafaelsantiago.adv@gmail.com
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