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A não incidência de ICMS em operações Drop Down
Pedro Augusto de Almeida Mosqueira*

Artigo - Estadual - 2016/0503

A operação down é um modelo de reestruturação societária importado dos Estados Unidos da América que não possui previsão na legislação societária brasileira. Tal operação societária consiste na transferência de ativos de uma sociedade para outra seguida de uma reorganização societária. A transferência é feita a título de subscrição do capital social da sociedade receptora dos bens(1). Afasta-se, portanto, a ideia de que tal operação seria aquela que consiste unicamente na transferência de um estabelecimento em contrapartida por ações ou cotas de uma sociedade, como defende Tepedino(2).

A reorganização societária que consiste na transferência de um estabelecimento em troca de ações ou cotas é uma operação societária perfeitamente enquadrável ao artigo 3º, VI, da Lei Complementar nº 87 de 1996.

LEI COMPLEMENTAR Nº 87, DE 13 DE SETEMBRO DE 1996

Art. 3º O imposto não incide sobre: (...)

VI - operações de qualquer natureza de que decorra a transferência de propriedade de estabelecimento industrial, comercial ou de outra espécie;

Neste sentido, não incide o ICMS sobre a transferência de estabelecimento usado para integralizar capital social de uma sociedade, que é o que ocorre no down de ativos, como resultado de aplicação do mencionado dispositivo legal, que expressamente elimina a dúvida acerca da incidência de ICMS sobre tal situação. A conclusão é válida até mesmo para operações não societárias, como seria o caso da compra e venda de estabelecimentos, perfeitamente subsumível ao mesmo dispositivo legal, que trata de operações de qualquer natureza de que decorra a transferência de propriedade de estabelecimento.

Restando claro que não há a incidência do ICMS sobre a alienação de estabelecimentos para a integralização de capital social, resta saber se o imposto deve ser cobrado quando são utilizados outros bens, como mercadorias estocadas, por exemplo, para que seja feita a integralização do capital social.

Esta hipótese de não incidência não está expressamente prevista pela LC nº 87/96, mas decorre da não inclusão de operações societárias na expressão "operações relativas à circulação de mercadorias" contida no artigo 2º, I, da referida lei complementar.

Não sendo essas mercadorias imediatamente objetos de uma operação mercantil, mas sim societária, não deve haver a incidência do tributo, já que o ICMS incide apenas sobre operações mercantis. No caso, o objeto da operação pode até ser uma mercadoria, mas a operação em si não é mercantil, já que não é firmada por um contrato de natureza comercial, mas sim societária.

A doutrina e a jurisprudência apontam que o fato gerador do ICMS só ocorre quando há ato de comércio, ou seja, quando o bem é objeto de ato mercantil.

"Operações são negócios jurídicos; circulação é transferência de titularidade, e não apenas movimentação física; mercadorias são bens objeto de comércio. (...)

Importa considerar, ainda, que mercadorias não são quaisquer produtos ou bens, mas apenas aqueles que constituem objeto de uma atividade econômica habitual e com finalidade lucrativa consistente na venda de produtos, não se confundindo com a alienação eventual de um bem por pessoa física ou mesmo por pessoa jurídica cuja atividade econômica seja de outra natureza. Daí por que "a venda de bens do ativo fixo da empresa não se enquadra na hipótese de incidência... por esse bens não se enquadrarem no conceito de mercadoria e essas operações não serem realizadas com habitualidade, não há circulação de mercadorias". Pela mesma razão, o STF entendeu que não pode incidir ICMS na alienação de bens salvados de sinistro, ou seja, daqueles bens dos quais as seguradoras se desfazem para diminuir seu prejuízo porque provém de sinistros (acidentes, desastres) que implicaram perda total e que geraram pagamento ao segurado. Veja-se o enunciado da Súmula Vinculante nº 32: "O ICMS não incide sobre alienação de salvados de sinistros pelas seguradoras".(3)

Desta maneira, quando mercadorias estocadas são alienadas para integralizar capital social de sociedade estamos diante de uma transferência de titularidade de bem que não é oriunda de um ato mercantil, afastando-se a incidência do ICMS.

A operação down, portanto, seja ela referente à transferência de titularidade de um estabelecimento, seja referente à transferência de titularidade de outros bens, não acarreta na ocorrência do fato gerador do ICMS, até mesmo pelo fato da alienação para fins societários não resultar na total perda de poder do alienante sobre a coisa, já que este recebe cotas ou ações de sociedade em troca do estabelecimento ou bem alienado, o que resulta na manutenção de determinado poder sobre a coisa, já que o alienante se torna sócio da sociedade proprietária da coisa, tratando-se, portanto, da manutenção de poder sobre o objeto conforme se espera de genuína relação societária.

O Superior Tribunal de Justiça tem posicionamento claro quanto a não incidência do ICMS sobre operações societárias típicas(4), entendimento este que deve ser aplicado também para os casos de operação down, já que, da mesma maneira, não são reestruturações que envolvem atos de comércio, um dos requisitos que devem estar presentes em um fato para que seja subsumível à hipótese de incidência "operação de circulação de mercadoria" do ICMS.

Notas

(1)ASSUMPÇÃO, Debora Skibinski; KRONBAUER, Clovis Antonio; ALVES, Diego Saldo. Reorganização Societária Atípica: Impactos Contábeis e Tributários do DROP DOWN no Brasil. Revista de Contabilidade da UFBA, v.8, n.3. 2014. ISSN: 1984-3704. Acesso em <http://www.portalseer.ufba.br/index.php/rcontabilidade/index>.

(2)TEPEDINO, Ricardo. O trespasse para subsidiária (Drop Down). In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro de; ARAGÃO, Leandro Santos de (Coord.). Direito societário e a nova lei de falências e recuperação de empresas. São Paulo: Quartier Latin, 2006.

(3)PAULSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário: Completo. 6ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014. Pg. 273.

(4)REsp 242.721/SC, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, Rel. p/ Acórdão Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/06/2001, DJ 17/09/2001, p. 112

 
Pedro Augusto de Almeida Mosqueira*
Bacharel em Direito pela Universidade Federal Fluminense. Advogado no Rio de Janeiro.

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