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Artigo - Estadual - 2015/0486

Fisco de São Paulo publica Decisão Normativa determinando a inclusão do AFRMM na base de cálculo do ICMS incidente na importação
Luiz Carlos Junqueira Franco Filho*
Silvio José Gazzaneo Junior*

No dia 25.7.2015, a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo publicou a Decisão Normativa CAT 1/2015, com o objetivo de uniformizar o seu entendimento no sentido de que o Adicional ao Frete para a Renovação da Marinha Mercante - AFRMM deve integrar a base de cálculo do ICMS incidente nas importações.

A compreensão da celeuma, contudo, demanda alguns esclarecimentos iniciais.

De acordo com o art. 146 da Constituição Federal, compete à Lei Complementar instituir a base de cálculo dos tributos, inclusive do ICMS. Dentro desse contexto, em sua redação original, a Lei Complementar 87/96, que define as diretrizes nacionais dentro das quais os Estados poderão legislar sobre ICMS, consignava que a base de cálculo do ICMS na importação de mercadorias consistia na soma das seguintes parcelas (art. 13, inc. V):

a) o valor da mercadoria ou bem constante dos documentos de importação;

b) imposto de importação;

c) imposto sobre produtos industrializados;

d) imposto sobre operações de câmbio; e

e) quaisquer despesas aduaneiras.

No passado, discutia-se se o AFRMM teria natureza jurídica de despesa aduaneira, o que faria com que seu custo integrasse a base de cálculo do imposto estadual.

Todavia, o entendimento que se consolidou foi no sentido de que o AFRMM decorre de uma obrigação ex lege, de modo que ele não deveria integrar a base de cálculo do ICMS na qualidade de despesa aduaneira. O AFRMM, a rigor, constitui uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE), nos termos do art. 149 da Constituição Federal e da Súmula 553 do Supremo Tribunal Federal.

Ocorre que em 17.12.2002, foi publicada a Lei Complementar nº 114/2002, que alterou sensivelmente a Lei Complementar 87/96. Segundo essa nova lei, o art. 13, inc. V, alínea "e", da Lei Complementar 87/96 passou a prever que além das despesas aduaneiras, quaisquer outros impostos, taxas, contribuições devem compor a base de cálculo do ICMS na importação de mercadorias.

Sendo assim, por se tratar a CIDE de uma espécie do gênero contribuição, sua inclusão na base de cálculo do ICMS incidente por ocasião do desembaraço de mercadorias importadas tem respaldo jurídico desde a edição da Lei Complementar 114/2002, não na qualidade de despesa aduaneira, mais sim de quaisquer outros impostos, taxas, contribuições.

Deste modo, os dois pilares que fundamentam a Decisão Normativa CAT 1/2015 consistem (i) na qualificação do AFRMM como uma CIDE pelo STF e, principalmente, (ii) na alteração promovida pela Lei Complementar 114/2002, que alargou a base de cálculo do ICMS na importação.

Embora já existisse um recente histórico de autuações pela não inclusão do AFRMM na base de cálculo do ICMS, a edição da Decisão Normativa CAT 1/2015 torna público o entendimento do Fisco de São Paulo a respeito do assunto. Nesse particular, há a indicação de que os contribuintes devem adotar o entendimento nela contido no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de fiscalização ostensiva, que pode resultar autuações e aplicação de severas penalidades.

Portanto, com a edição desse ato normativo, o contribuinte paulista poderá adotar dois caminhos:

a) Adequar-se à exigência do Fisco e apresentar uma denúncia espontânea; ou

b) Insurgir-se contra a inclusão do AFRMM na base de cálculo do ICMS.

Se optar por realizar a denúncia espontânea, o contribuinte deve se atentar às normas regulamentares que disciplinam esse instituto e complementar o imposto que porventura deixou de ser pago pela não inclusão do AFRMM na sua base de cálculo nos últimos 5 (cinco) anos. A adoção dessa medida evita a aplicação da multa de ofício.

Por outro lado, se o contribuinte optar por questionar a exigência fiscal, ele contará com relevantes argumentos jurídicos para tanto.

Sob o ponto de vista normativo, para que a exigência do ICMS seja válida, são necessários três requisitos concomitantes: (a) a outorga de competência tributária pela Constituição Federal, (b) a existência de uma Lei Complementar, na qualidade de norma geral em matéria tributária, em nível nacional, para definição dos elementos essenciais do fato gerador e, finalmente, (c) o exercício da competência pelo estado-membro, por meio da edição de lei ordinária para legitimar a cobrança.

Ocorre que o Estado de São Paulo não se atentou a essa tríade necessária, tendo optado por publicar uma Lei Estadual determinando a inclusão das contribuições (AFRMM entre elas) na base de cálculo do ICMS antes mesmo que a Lei Complementar assim o permitisse.

Isso porque, no Estado de São Paulo, tal majoração foi instituída por meio da Lei Estadual nº 11.001, de 22.12.2001, ou seja, aproximadamente um ano antes da alteração promovida pela Lei Complementar 114/2002.

No entanto, sendo o ICMS um imposto estadual com perfil nacional, a definição dos elementos essenciais à incidência tributária depende, obrigatoriamente, de respaldo em lei complementar, em especial no que tange à caracterização da sua base de cálculo.

Nesse contexto, se a Lei Estadual 11.001/2001 é anterior à Lei Complementar 114/2002, então ela não poderia ter alargado a base de cálculo definida até então, qual seja, aquela instituída pela Lei Complementar 87/96 em sua redação original.

Nem se alegue, por oportuno, que a edição da Lei Complementar 114/2002 teve o condão convalidar o alargamento da base de cálculo promovido pela Lei Estadual 11.001/2001. Em situação análoga, o Supremo Tribunal Federal já se manifestou no sentido de que as leis estaduais não podem ampliar as hipóteses de incidência do ICMS sem que haja o devido e prévio embasamento na respectiva Lei Complementar e, obviamente, na própria Constituição Federal (01).

Portanto, caberia ao legislador paulista promulgar uma nova lei estadual para majorar a base de cálculo do ICMS, nos moldes da LC 114/2002, que seria válida a partir de então. Como isso não foi feito até o presente momento, a exigência de complemento do ICMS nas importações para fins de inclusão do AFRMM não deve prevalecer, pois a nova LC 114/2002 não poderia validar "a posteriori" Lei Estadual que a precedeu e encontrava-se eivada de vício de nulidade, por contrariar as normas gerais vigentes no momento de sua edição.

Notas

(01) Supremo Tribunal Federal, Recurso Extraordinário 439.796, julgado em 6.11.2013.

 
Luiz Carlos Junqueira Franco Filho*
Advogado em São Paulo. Graduado em direito pela USP e Pós graduado em direito tributário pela PUC-SP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário - IBDT. Integrante do escritório de advocacia Mariz de Oliveira e Siqueira Campos.
E-mail: lcj@marizsiqueira.com.br

Silvio José Gazzaneo Junior*
Advogado em São Paulo. Integrante de Mariz de Oliveira e Siqueira Campos Advogados. Coordenador de Direito Tributário da Comissão dos Novos Advogados do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP).
E-mail: sjg@marizsiqueira.com.br

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