Decisoes.com.br - Jurisprudência Administrativa e Judiciária, Decisões de dezenas de Tribunais, STF, STJ, TRF, TIT, Conselhos de Contribuintes, etc.
Usuários
Lembrar usuário
Lembrar senha

Pesquisar em
Doutrina
Boletins
Todas as Áreas
Áreas Específicas
Tribunais e Órgãos abrangidos
Repercussão Geral (STF)
Recursos Repetitivos (STJ)
Súmulas (STF)
Súmulas (STJ)
Matérias Relevantes em Julgamento


Localizar nessa página:   
 

Artigo - Federal - 2013/3364

Obrigação tributária e a regra-matriz de incidência tributária
Paulo Vitor Coelho Dias*

1 - Obrigação tributária

Hugo de Brito Machado aduz que obrigação tributária é a:

(...) relação jurídica em virtude da qual o particular (sujeito passivo) tem o dever de prestar dinheiro ao Estado (sujeito ativo), ou de fazer, não fazer ou tolerar algo no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos, e o Estado tem o direito de constituir contra o particular um crédito (01).

Trata-se de obrigação ex lege (emana de lei), diferentemente de uma obrigação oriunda de convenções particulares - ex voluntate. A obrigação tributária autoriza o sujeito ativo exigir o tributo do sujeito passivo.

A obrigação tributária é classificada em principal e acessória (artigo 113 do Código Tributário Nacional).

Obrigação principal

A obrigação tributária principal, segundo o artigo 113, § 1º, do Código Tributário Nacional, surge com a ocorrência do fato gerador e tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.

É uma obrigação de dar - pagamento do tributo ou da penalidade pecuniária. Em síntese, cuida-se do ônus patrimonial traduzido no dever de pagar o tributo.

Como ressaltado acima, a obrigação tributária principal surge com a ocorrência do fato gerador do tributo, figurando na relação jurídica o sujeito ativo, sujeito passivo, objeto (prestação pecuniária e deveres instrumentais) e causa (vínculo jurídico).

Obrigação acessória

O ônus instrumental traduz-se na obrigação de fazer (prestação positiva) ou obrigação de não fazer (prestação negativa), diversa da obrigação principal, que recai sobre o sujeito passivo da relação jurídico-tributária.

Cite-se como exemplo o preenchimento de guias, escrituração de livros fiscais, entrega de declarações e emissão de notas fiscais.

Na lição de Paulo de Barros Carvalho, a expressão inserta no artigo 113, § 2º, do Código Tributário Nacional, deve ser entendida como deveres instrumentais ou formais, que são exigidos dos contribuintes com o intento de imprimir efeitos práticos à percepção de tributos. Esses deveres possibilitam o controle estatal sobre o cumprimento das obrigações tributárias (02).

O artigo 113, § 3º, do Código Tributário Nacional indica que o descumprimento dos deveres instrumentais (obrigação tributaria acessória) deflagra uma obrigação principal, no que concerne à multa.

Atente-se que o § 2º do artigo 113 nos mostra que a obrigação acessória decorre da "legislação tributária". A referida expressão, consoante o artigo 96 do Código Tributário Nacional, compreende as:

(...) leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares que versem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes.

Noutras palavras, as normas infralegais, como é o caso dos decretos, podem criar uma obrigação tributária acessória.

Não perca de vista que a característica da acessoriedade nem sempre se faz presente, uma vez que pode existir obrigação acessória sem a principal. Com efeito, há deveres instrumentais que não dependem de vínculos obrigacionais, como é o caso das imunidades tributárias, em que a Administração Pública exige o cumprimento dos deveres formais com o fim de fiscalizar as condições necessárias para a fruição da benesse constitucional.

2 - Estudo do fato jurídico tributário ou fato gerador

Para designar os fatos sociais selecionados pelo Poder Legislativo sobre os quais incidirá a cobrança de tributos, foi adotada a expressão "fato gerador", utilizada, inclusive, no artigo 146, inciso III, a, da Carta Republicana, que preconiza caber à lei complementar a definição dos fatos geradores de todos os impostos nela discriminados.

O Código Tributário Nacional definiu o fato gerador da obrigação principal e o fato gerador da obrigação acessória, conforme os artigos 114 e 115:

Art. 114. Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.
Art. 115. Fato gerador da obrigação acessória é qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou a abstenção de ato que não configure obrigação principal.

É digno de atenção, sobretudo, o estudo do fato gerador da obrigação principal, conceituado como a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência. A situação é necessária porque ela é imprescindível para o surgimento da obrigação tributária. E a situação também é suficiente porque sua realização, por si só, já basta para o nascimento da obrigação principal.

A expressão "fato gerador" é utilizada pelo Código Tributário Nacional para designar 02 (dois) acontecimentos distintos: a descrição legal do fato e o próprio fato concretamente ocorrido. Por isso, apesar de já incorporada ao ordenamento jurídico pátrio, essa expressão tem merecido críticas de alguns tributaristas, que preferem separar essas 02 (duas) facetas, utilizando denominação distinta para o fato gerador enquanto mera previsão legal, como hipótese de incidência tributária ou pressuposto fático.

Há, portanto, 02 (duas) situações distintas a se considerar: 1) a situação definida in abstrato pela lei, potencialmente capaz de gerar a obrigação tributária. É a hipótese de incidência; e 2) a ocorrência concreta do fato previsto em lei como necessário e suficiente para gerar a obrigação tributária. É a materialização do pressuposto fático. Assim, com a concretização da previsão legal, surge a obrigação tributária.

Com o intento de precisar o momento da ocorrência do fato jurídico tributário, dispõe o artigo 116 do Código Tributário Nacional:

Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:
I - tratando-se de situação de fato, desde o momento em que o se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são próprios;
II - tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável (grifamos).

O fato gerador pode traduzir em situação de fato (saída de mercadoria do estabelecimento comercial - ICMS) ou em situação de direito (compra e venda de imóvel - ITBI), destacando, assim, momentos distintos para seus efeitos.

No que concerne aos negócios jurídicos realizados sob condição, prevê o artigo 117 do Código Tributário Nacional:

Art. 117. Para os efeitos do inciso II do artigo anterior e salvo disposição de lei em contrário, os atos ou negócios jurídicos condicionais reputam-se perfeitos e acabados:
I - sendo suspensiva a condição, desde o momento de seu implemento;
II - sendo resolutória a condição, desde o momento da prática do ato ou da celebração do negócio.

Tal dispositivo legal está vinculado aos negócios jurídicos a que fez menção o artigo 116, inciso II, do Código Tributário Nacional. Como se vê, o artigo 117 retrata o momento do fato jurídico tributário nos negócios realizados sob condição. A condição é o ato que subordina os efeitos do ato a um evento futuro e incerto.

Condição suspensiva é aquela que subordina os efeitos do ato a um acontecimento futuro e incerto. O fato gerador ocorrerá com o acontecimento da condição. Para exemplificar, podemos citar o pai que condiciona a doação de um imóvel ao casamento de sua filha mais velha. Desse modo, enquanto não ocorrido o evento futuro e incerto - o casamento - não há que se falar em fato gerador do imposto sobre a doação.

Condição resolutiva é aquela em que os efeitos do ato jurídico são perfeitos desde o início, sendo passível de desfazimento após a ocorrência do evento futuro e incerto. Valendo-se do exemplo acima, imagine o pai que havia doado um imóvel à filha mais velha, condicionando a retomada do bem à manutenção da vida conjugal. Assim, com a ruptura do casamento, o bem volta ao domínio do doador. A ruptura do casamento vem dissolver os efeitos jurídicos do ato de doação, que era válido e já havia ensejado o imposto. Em conclusão, os negócios jurídicos realizados sob condição resolutiva têm o mesmo tratamento tributário dos negócios realizados sem condição.

3 - Regra-matriz de incidência tributária

A regra-matriz de incidência tributária visa disciplinar a relação jurídico-tributária entre o Fisco e o contribuinte.

O legislador prevê um determinado fato social como hipótese de incidência tributária e, uma vez ocorrido o aludido fato previsto no suposto da norma, desponta a relação jurídica entre sujeito ativo e sujeito passivo.

De forma bastante elucidativa, Paulo de Barros Carvalho sintetiza a regra-matriz de incidência tributária:

Ora, a regra-matriz de incidência tributária é, por excelência, uma norma de conduta, vertida imediatamente para disciplinar a relação do Estado com seus súditos, tendo em vista contribuições pecuniárias. Concretizando-se os fatos descritos na hipótese, deve-ser a conseqüência, e esta, por sua vez, prescreve uma obrigação patrimonial. Nela, encontraremos uma pessoa (sujeito passivo) obrigada a cumprir uma prestação em dinheiro (03).

Através do estudo dos critérios da regra-matriz de incidência tributária, verificaremos a estrutura da relação jurídico-tributária.

Hipótese de incidência tributária

Muitos doutrinadores, ao falarem em hipótese de incidência tributária, confundem o termo com a expressão fato gerador. Segundo Luciano Amaro:

(...) a expressão hipótese de incidência designa com maior propriedade a descrição, contida na lei, da situação necessária e suficiente ao nascimento da obrigação tributária, enquanto a expressão fato gerador diz da ocorrência, no mundo dos fatos, daquilo que está descrito na lei. A hipótese é simples descrição, é simples previsão, enquanto o fato é concretização da hipótese, é o acontecimento do que fora previsto (04).

Para a construção da hipótese, são extraídos pelo legislador fatos sociais com expressão econômica, facilitando a aferição do critério quantitativo fixado na regra-matriz de incidência tributária.

Na hipótese tributária encontraremos 03 (três) critérios identificadores do fato social selecionado pelo legislador: a) critério material; b) critério espacial; e c) critério temporal.

Critérios da hipótese

Critério material

O critério material da regra-matriz de incidência tributária é o comportamento previsto em lei de uma pessoa, física ou jurídica, delimitado por condições de tempo e espaço. É formado por um verbo acompanhado de seu complemento. Peremptoriamente, o professor Paulo de Barros Carvalho ensina que:

O comportamento de uma pessoa, consistência material linguisticamente representada por um verbo e seu complemento, há de estar delimitado por condições espaciais e temporais, para que o perfil típico esteja perfeito e acabado, como descrição normativa de um fato (05).

Citemos os seguintes exemplos: auferir renda, industrializar produtos e exportar mercadorias.

Critério temporal

Compreendemos o critério temporal da hipótese tributária com o exato instante em que ocorre o fato gerador, demarcando um direito subjetivo para o Estado e um dever jurídico para o contribuinte (obrigação tributária).

A título exemplificativo, o critério temporal do imposto sobre serviços de qualquer natureza se dá com a prestação efetiva do serviço tributável.

Critério espacial

O critério espacial é o local onde o fato jurídico tributário deve ocorrer, para que possa produzir efeitos jurídicos. Nem sempre o legislador deixa nítido o local onde o fato jurídico tributário deve ocorrer, entretanto, haverá elementos latentes que permitirão identificar onde se deu o fato tributário.

Critérios do consequente

O consequente da regra-matriz de incidência tributária regula os direitos e as obrigações surgidas com a subsunção do fato à norma jurídica.

Critério pessoal (sujeito ativo e sujeito passivo)

A obrigação tributária nasce com o fato jurídico, assim entendido como a materialização da hipótese de incidência. De fato, com a subsunção tributária, surgem credor e devedor no liame obrigacional tributário (critério pessoal).

Sujeito ativo

O sujeito ativo da obrigação tributária é a pessoa jurídica de direito público titular da competência para exigir o seu cumprimento (artigo 119 do Código do Tributário Nacional).

Colocam-se nessa condição as pessoas jurídicas de direito público interno, chamadas entes tributantes. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios são, dessa forma, sujeitos ativos. Tais pessoas são detentoras do poder de instituir o tributo, isto é, da competência tributária.

Há certas pessoas jurídicas de direito público que, delegatárias das atividades de arrecadação e fiscalização do tributo, podem se colocar na condição de sujeitos ativos, pois elas detêm capacidade tributária ativa.

O contribuinte deve pagar o tributo para um ente credor, e não para mais de um, sob pena de ocorrência do vício da solidariedade ativa. Na verdade, não é incomum a presença de mais de um ente tributante que cobra um ou mais tributos sobre o mesmo fato jurídico (bitributação).

Sujeito passivo

Por sua vez, o sujeito passivo da obrigação tributária é a pessoa, física ou jurídica, privada ou pública, obrigada ao seu cumprimento.

Há 02 (dois) tipos de sujeitos passivos previstos no artigo 121, parágrafo único, do Código Tributário Nacional:

- Contribuinte: é aquele que tem relação pessoal e direta com o fato jurídico tributário (artigo 121, parágrafo único, inciso I, do Código Tributário Nacional); e

- Responsável: que é a terceira pessoa escolhida por lei para pagar o tributo, sem que tenha realizado o fato imponível (artigos 128 a 138 do Código Tributário Nacional), que será estudado em capítulo próprio.

O sujeito passivo deve, necessariamente, estar previsto em lei, uma vez que se trata de um item adstrito à reserva legal (artigo 97, inciso II, parte final, do Código Tributário Nacional).

Capacidade Tributária e Capacidade Civil

A capacidade tributária não guarda nenhuma relação com a capacidade civil das pessoas físicas e jurídicas.

Tal assertiva pode ser facilmente extraída da interpretação do artigo 126 do Código Tributário Nacional:

Art. 126. A capacidade tributária passiva independe:
I - da capacidade civil das pessoas naturais;
II - de achar-se a pessoa natural sujeita a medidas que importem privação ou limitação do exercício de atividades civis, comerciais ou profissionais, ou da administração direta de seus bens ou negócios;
III - de estar a pessoa jurídica regularmente constituída, bastando que configure uma unidade econômica ou profissional.

Dessa forma, a sociedade de fato e o absolutamente incapaz proprietários de um imóvel serão tributados com normalidade.

Critério quantitativo (base de cálculo e alíquota)

Vamos, agora, analisar o critério quantitativo da regra-matriz de incidência tributária - alíquota e base de cálculo.

A base de cálculo é a perspectiva dimensível (valor de medida) do fato jurídico e, conjugando-a com a alíquota, será definida a quantia a ser paga pelo sujeito passivo a título de tributo.

Escreveu o renomado jurista Paulo de Barros Carvalho:

Temos para nós que a base de cálculo é a grandeza instituída na conseqüência da regra-matriz tributária, e que se destina, primordialmente, a dimensionar a intensidade do comportamento inserto no núcleo do fato jurídico, para que, combinando-se à alíquota, seja determinado o valor da prestação pecuniária (06).

Atente-se que a base de cálculo tem 03 (três) funções, quais sejam: função mensuradora - mede as proporções reais do fato; função objetiva - compõe a específica determinação da dívida (atribui certeza ao crédito); e função comparativa - confirma, infirma ou afirma o critério material da hipótese de incidência.

Ex vi do disposto no artigo 97, inciso IV, do Código Tributário Nacional, à alíquota também deve ser aplicada a reserva legal. Calculada sobre a base de cálculo, dar-se-á o valor do crédito tributário

Através do critério quantitativo da regra-matriz de incidência tributária, será possível identificar o quantum debeatur, bastando aplicar a alíquota sobre a base de cálculo.

4 - Domicílio tributário

O artigo 127 do Código tributário Nacional autoriza o contribuinte ou responsável a indicar o lugar onde deverá ser pago o tributo, ou seja, o domicílio tributário. Trata-se do domicílio de eleição.

Será considerado como domicílio do contribuinte ou responsável:

I - quanto às pessoas naturais, a sua residência habitual, ou, sendo esta incerta ou desconhecida, o centro habitual de sua atividade;
II - quanto às pessoas jurídicas de direito privado ou às firmas individuais, o lugar da sua sede, ou, em relação aos atos ou fatos que derem origem à obrigação, o de cada estabelecimento;
III - quanto às pessoas jurídicas de direito público, qualquer de suas repartições no território da entidade tributante.

Nas hipóteses de inaplicabilidade das regras elencadas nos incisos do artigo 127 e de recusa pela autoridade administrativa quando for impossibilitada ou dificultada a fiscalização ou arrecadação do tributo, considerar-se-á como domicílio tributário o local da situação dos bens ou da ocorrência dos atos ou fatos que deram origem à obrigação (§§ 1º e 2º do artigo 127).

Referências bibliográficas

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

ATALIBA, Geraldo, Hipótese de Incidência Tributária, 6. ed. São Paulo: Malheiros.

BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2001.

CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1991.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 28. ed. São Paulo: Malheiros.

Notas

(01) MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 28. ed. São Paulo: Malheiros.

(02) CARVALHO, op.cit. p. 322/325.

(03) CARVALHO, op. cit., p. 378.

(04) AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 512.

(05) CARVALHO, op. cit., p. 290.

(06) CARVALHO, op. cit., p.363.

 
Paulo Vitor Coelho Dias*
Advogado em Piracicaba (SP). Especialista em Direito Tributário pela Escola Paulista de Direito - EPD. Membro da Comissão de Advocacia Tributária da 8ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil de Piracicaba (SP). Assistente da 15ª Turma do Tribunal de Ética e Disciplina de Piracicaba (SP). Membro do Conselho do Jovem Empresário da Associação Industrial e Comercial de Piracicaba (SP) - ACIPI.
E-mail: pvc_dias@hotmail.com